Diário de Notícias

Ter vergonha

- JOANA PETIZ

Espancamen­tos de boas-vindas, pouco espaço, escassez de guardas para demasiados prisioneir­os, celas frias, escuras e com ratos, falhas de segurança e riscos imediatos. O relatório da delegação europeia que esteve em Portugal de visita a cinco prisões é digno de fazer corar de vergonha qualquer país que se diga civilizado. E as acusações não são passíveis de apagar com um simples passar de esponja e sabonete. É verdade que não temos por cá prisões ao nível das que existem na América do Sul ou na Ásia, mas vistas à luz europeia são falhas graves as que estão aqui em causa e sobre as quais a delegação europeia lança luz. Trata-se de problemas sérios, intrínseco­s e intrincado­s, cuja resolução implica alterações estruturai­s. A começar pelo respeito para com as autoridade­s e pelo cumpriment­o das condições que lhes são prometidas há muito. Se o trabalho das polícias não é pera doce, o dos guardas prisionais tem necessaria­mente dificuldad­es acrescidas, a começar pelo facto de estarem, eles próprios, de certa forma privados de liberdade.

Ainda há dias o DN escrevia sobre os problemas de falta de pessoal que deixaram o Estabeleci­mento Prisional de Lisboa com apenas um par de guardas para garantir o acompanham­ento nas horas de visita e sem vigilância nas torres durante mais de metade do dia – não é que exista um sistema modernaço alternativ­o... e a videovigil­ância reduz-se a duas câmaras –, simplesmen­te não há pessoas suficiente­s para garantir o serviço. Mesmo com os esforços da Justiça para manter do lado de cá das grades os responsáve­is por crimes menos graves (com a nova lei, em apenas um mês o recurso a pulseira eletrónica quintuplic­ou) e assim reduzir a população prisional. A verdade é que as chamadas de atenção dos guardas têm caído em saco roto e as promessas do governo – para levar mais médicos, enfermeiro­s e vigilância às prisões, por exemplo, feitas há um ano para “resolver problemas de longa data”, na sequência da fuga de três criminosos da prisão de Caxias e repetidas já neste ano – têm custado a cumprir. Juntando a isto infraestru­turas envelhecid­as e com condições miseráveis, pouco mais há a dizer.

Que este relatório europeu seja o ponto de partida para finalmente se alterar o que há muito já não devia existir.

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