Diário de Notícias

INOVAÇÃO

EMPRESAS FILHAS DE PARCERIAS COM O MIT E OUTRAS INSTITUIÇÕ­ES INTERNACIO­NAIS JÁ VALEM CENTENAS DE MILHÕES

- PEDRO SOUSA TAVARES

A Veniam – uma empresa de software fundada em Portugal que desenvolve tecnologia­s para a comunicaçã­o em rede entre veículos – já está a trabalhar com grandes construtor­es para que os novos automóveis, completame­nte autónomos, “saiam de fábrica” com o seu software. A informação foi confirmada ao DN por João Barros, professor universitá­rio e CEO desta empresa, avaliada em cerca de 118 milhões de euros e um dos vários exemplos de sucesso de uma década de parcerias entre universida­des portuguesa­s e grandes instituiçõ­es estrangeir­as.

A Veniam nem é a mais valiosa das largas dezenas das empresas nacionais nascidas destas parcerias, que envolvem gigantes da área das tecnologia­s, como o Massachuse­tts Institute of Technology (MIT), a Universida­de de Carnegie Melon (CMU), a Universida­de do Texas Austin e a Associação Fraunhofer, da Alemanha, que se juntou mais tarde a este lote. Esse título pertence à Feedzai, considerad­a a primeira startup gerada pelo programa CMU. A empresa que também atua na área da internet das coisas (IoT) desenvolve­u, recorrendo à inteligênc­ia artificial, recursos que permitem às instituiçõ­es financeira­s combater fraudes nos pagamentos. E já está avaliada num valor que a coloca acima de quatro cotadas do PSI 20 e em igualdade com os CTT: cerca de 508,5 milhões de euros.

Calcular o valor conjunto das centenas de startups nascidas destas parcerias – só a iniciativa Building Global Innovators, com o MIT, envolveu mais de 120 –, além do capital acrescenta­do a diversas empresas portuguesa­s já existentes que aderiram aos protocolos, é um exercício que nenhum dos envolvidos nestas parcerias quis arriscar fazer. No entanto, há dados que demonstram que têm sido consideráv­eis os ganhos para a economia desta iniciativa, cuja segunda fase, até 2030, foi lançada há dias pelo governo.

O ministro do Ensino Superior está, aliás, nos Estados Unidos desde o fim de semana, para uma visita destinada a promover o alargament­o da parceria internacio­nal entre o governo português e o Massachuse­tts Institute of Technology, no arranque da nova fase do Programa MIT-Portugal . O novo ciclo de parcerias internacio­nais, que se irá prolongar até 2030 – o GoPortugal-Global Science and technology Partnershi­ps Portugal –, envolve 64 milhões de euros de investimen­to.

João Barros, um dos fundadores da Veniam, não quis adiantar o nome das marcas que irão equipar os seus veículos com a tecnologia da sua empresa, explicando que existem “acordos de confidenci­alidade” que impedem a divulgação dessas informaçõe­s. No entanto, garantiu que “ao longo do ano segurament­e irá haver notícias sobre isso”, acrescenta­ndo que a entrada no mercado destes automóveis “ainda deverá demorar alguns anos”, porque a tecnologia “tem de ser integrada na arquitetur­a” dos novos veículos.

“A grande oportunida­de da Veniam é tornar-se a arquitetur­a de referência dos veículos autónomos, que vão ter de comunicar entre eles para trocar dados, comunicar mapas, detetar-se uns aos outros, à medida que vão trocando passageiro­s de uma parte para a outra”, disse João Barros, para quem conduzir automóveis, pelo menos “por obrigação”, será em breve uma coisa do passado (ver entrevista ao lado).

Integrada na área emergente da chamada internet das coisas, a Veniam foi fundada por dois professore­s universitá­rios portuguese­s – João Barros (Universida­de do Porto) e Susana Sargento (Universida­de de Aveiro) – e pelo casal Robin Chase e Roy Russell, que ajudou a criar a multinacio­nal de partilha de automóveis Zipcar, hoje detida pela Avis.

Com mais de cem patentes registadas, a empresa portuguesa, nascida da colaboraçã­o entre a CMU e a Fundação para a Ciência e a Tecnologia, no âmbito das parcerias internacio­nais lançadas em 2007 pelo então ministro Mariano Gago, foi considerad­a no ano passado a 34.ª empresa mais inovadora do mundo, à frente de marcas como a Spotify e a Dropbox. Cada euro investido rendeu 40 De acordo com um relatório de 2016 da UTEN Portugal (University Technology Enterprise Network), uma entidade criada juntamente com a Universida­de de Austin para promover a comerciali­zação da ciência e da tecnologia geradas no país, cada euro investido pela FCT nestas parcerias e noutros projetos ligados à aposta nas novas tecnologia­s teve um retorno de 40 euros.

Nos primeiros cinco anos das parcerias, as universida­des registaram um aumento de 20% nas patentes concedidas, de 137% nas receitas por licenciame­ntos e de 132% nos novos spinoffs académicos (empresas criadas a partir de projetos académicos). Já as empresas tecnológic­as registaram um cresciment­o anual de 127% nas receitas e de 38% nas contrataçõ­es.

A isto somam-se os mais de mil professore­s, investigad­ores e empresário­s envolvidos nos programas, além dos 1500 estudantes que

A empresa Feedzai está avaliada num valor que a coloca acima de quatro cotadas do PSI 20 e em igualdade com os CTT Com mais de cem patentes registadas, a Veniam foi considerad­a a 34.ª empresa mais inovadora do mundo no ano passado

fizeram os seus mestrados e doutoramen­tos através das parcerias entre 2007 e 2017.

Para Nuno Nunes, um dos diretores do programa CMU Portugal, o país tem hoje “uma nova geração de pessoas que criam empresas não por necessidad­e mas por oportunida­de. Notam uma lacuna e criam empresas que competem desde a sua fundação no mercado global”, defende. “É uma grande diferença em relação ao que era o statu quo.”

Em que área nascerá a próxima grande empresa, explica o também presidente do Instituto de Tecnologia­s Interativa­s da Madeira, “não é possível dizer. Ninguém era capaz de o prever há dez anos e ninguém o fará agora”, assegura. No entanto, acrescenta, também já ninguém duvida de que os casos de sucesso vão continuar a multiplica­r-se: “O que sabemos é que se juntarmos talento as probabilid­ades são fortes.”

Liliana Ferreira, diretora da Fraunhofer Portugal AICOS, também vê no melhor aproveitam­ento do talento nacional e da qualidade das nossas instituiçõ­es de ensino uma fórmula de sucesso para o futuro: “Temos acesso a recursos qualificad­os que nem sempre estão disponívei­s noutros países europeus”, diz. “Na área da inteligênc­ia artificial, na computação informátic­a, temos recursos e alunos a sair das universida­des que conseguimo­s atrair para os nossos projetos”, conta. “Num país como a Alemanha, por exemplo, têm dificuldad­e em fazê-lo porque a mão-de-obra é escassa nestas áreas.”

O centro de pesquisa aberto há dez anos, no Porto, no âmbito da parceria entre a FCT e a Associação Fraunhofer – na altura foi a primeira unidade fora da Alemanha – segue a linha orientador­a da casa-mãe, com uma forte ligação da pesquisa às necessidad­es das empresas e das populações. E Liliana Ferreira nota também uma “clara diferença” na relação com as empresas. Se no passado era necessário “ir ter com a indústria para lhe apresentar os nossos serviços”, hoje acontece o contrário. No lançamento da segunda fase do programa em Portugal, que incluirá a abertura de um novo centro dedicado à agricultur­a e parcerias com as universida­des de Évora e de Trás-os-Montes e Alto Douro, “tivemos as instalaçõe­s completame­nte cheias, muito interesse nesta área, muitas ideias e muitas oportunida­des”.

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O ministro do Ensino Superior está nos Estados Unidos para promover o alargament­o da parceria internacio­nal entre o governo e o Massachuse­tts Institute of Technology

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