Monica Lewinsky revê relação com Bill Clinton à luz do movimento #MeToo
Passadas duas décadas, a ex-estagiária da Casa Branca admite os seus erros mas diz ser necessário rever a noção de consentimento
Quando recebeu uma mensagem de uma das líderes do movimento #MeToo na qual esta lhe dizia “lamento que tenha estado tão sozinha”, Monica Lewinsky confessa que se foi abaixo e “vieram-me lágrimas aos olhos”. Num ensaio publicado na revista Vanity Fair, a mulher que em 1998 o mundo inteiro conheceu como a ex-estagiária da Casa Branca que teve uma relação com o presidente Bill Clinton que valeu a este um processo de destituição por ter mentido em tribunal reconhece que cometeu erros. Mas garante que se tudo tivesse acontecido hoje talvez não se tivesse sentido tão só perante o escrutínio do mundo. Uma aproximação ao #Me Too que lhe valeu muitas mensagens de apoio nas redes sociais.
“Um dos aspetos mais inspiradores deste movimento é o número de mulheres que vieram a público falar em apoio umas das outras”, escreve Lewinsky, ela própria ativista antibullying. O #MeToo surgiu nas redes sociais como movimento lançado por mulheres e homens vítimas de abuso e violência sexual. Em outubro de 2017, ganhou dimensão após várias atrizes terem acusado o produtor de Hollywood HarveyWeinstein de abusos.
Aos 44 anos, a ex-estagiária da Casa Branca explica como passou as últimas duas décadas em terapia, tendo-lhe sido diagnosticado stress pós-traumático devido à pressão a que foi submetida, tanto judicial como mediática, após vir a público a sua relação com Bill Clinton. Só agora, explica, começa a perceber que, apesar de a relação ter sido consensual – e ela sublinha várias vezes que o foi –, se considerarmos que se tratava do presidente dos EUA, o homem mais poderoso do mundo, e 27 anos mais velho do que ela, “em tais circunstâncias a ideia de consentimento pode tornar-se discutível”. E sublinha: “Os desequilíbrios de poder –e a capacidade para abusar deles – existem mesmo quando o sexo é consensual.”
Num ensaio em que começa com o episódio caricato do seu encontro – o primeiro de sempre – em finais de 2017 num restaurante de Manhattan com Ken Starr, o procurador que liderou a investigação a Clinton – e, logo, a ela – há 20 anos, Lewinsky admite que a questão do consentimento “é complicada. Muito, muito complicada”. E, dirigindo-se diretamente aos críticos, sejam democratas ou republicanos, garante que nenhum dos argumentos que apresenta – da sua idade, tinha 22 anos, ao facto de a outra pessoa envolvida ser o patrão dela e o presidentes dos EUA – lhe tiram a sua parte de responsabilidade no que aconteceu. “Todos os dias me confronto com o arrependimento.”
Definindo o ano de 1998 como um ponto de viragem na sociedade americana, Lewinsky garante que para ela esse momento só agora está a chegar. E termina garantindo: “Eu – nós – temos uma grande dívida de gratidão para com as heroínas do #MeToo” e do Time’s Up. Elas estão a falar contra as conspirações de silêncio que durante muito tempo protegeram os homens poderosos quando se falava de abuso sexual, assédio e abuso de poder.” “Já não estou sozinha”, garante.
Estas palavras valeram-lhe inúmeras mensagens de apoio nas redes sociais e nos media. “Achei Monica Lewinsky impressionante e admirável na forma como encontrou a sua voz pública e recuperou a identidade e dignidade”, escreveu no Twitter Glenn Greenwald, o jornalista que no The Guardian revelou o programa de vigilância dos EUA denunciado por Edward Snowden. Na CNN, o editor Chris Cilizza sublinhou a necessidade de esta revisão da história não deixar de fora Bill Clinton. “Devemos isso a Monica Lewinsky”, escreveu.