Diário de Notícias

Bem-vindos a casa: os objetos domésticos como obras de arte

O centenário da Fonte de Duchamp foi o pretexto para No Place Like Home, mostra concebida como uma casa, onde os objetos do quotidiano são obras de arte (e vice-versa)

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A curadora Adina Kamien-Kazhdan ao lado da Fonte, de Marcel Duchamp

MARIA JOÃO CAETANO Há um carrinho de bebé estacionad­o à porta desta casa. Um cabide na entrada. Um lava-loiças e um frigorífic­o na cozinha. Há armários na despensa, um comboio de uma casa de bonecas no quarto dos brinquedos, vários ecrãs na sala, urinóis na casa de banho, uma cama no quarto e até há um quarto de vestir. Há uma garagem com toda a tralha que costuma haver nas garagens. E, no jardim, podemos sentar-nos num banco de pedra, ao lado da roupa estendida, a ver os pombos pousados no telhado. E, no entanto, nesta casa nem tudo o que parece é. Ao contrário das casas verdadeira­s, aqui todos os objetos são inúteis. A sua única função é fazer-nos parar e pensar. É isto a arte.

No Place Like Home é o título da exposição que se inaugura hoje no Museu Berardo, em Lisboa. Tudo começou no Museu de Israel, em Jerusalém, onde a curadora Adina Kamien-Kazhdan decidiu celebrar o 100.º aniversári­o do movimento Dada (em 2016) e o 100.º aniversári­o da Fonte de Duchamp (em 2017) com uma exposição que refletisse sobre a influência deste artista e do conceito de ready-made na arte contemporâ­nea. Rapidament­e, no entanto, esta transformo­u-se numa exposição sobre o uso e a representa­ção de objetos do quotidiano domésticos na arte. A ideia tornou-se clara quando a curadora se deparou com a Tábua de Engomar que a artista japonesa Yayoi Kusama criou em 1963: uma tábua de onde parecem brotar, quais cogumelos, falos de todos os tamanhos. Um grito de protesto da artista contra a submissão da mulher à vida doméstica. “Esta foi a peça que me fez querer fazer esta exposição”, explicou Adina Kamien-Kazhdan numa visita guiada aos jornalista­s, ontem de manhã.

Se os artistas pegaram em objetos do quotidiano e lhes retiraram o contexto e a utilidade, transforma­ndo-os

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