Diário de Notícias

Paulo Gonçalves impedido de falar com os outros quatro arguidos

- SANDRA CUNHA DEPUTADA DO BLOCO DE ESQUERDA

Há uns dias, uma mulher, metalomecâ­nica na indústria automóvel, perguntava-me com alguma indignação porque continuáva­mos, nos dias de hoje, a falar tanto de feminismo e porque nunca estávamos “satisfeita­s”.

Resolvi fazer esse exercício e responder ao desafio de explicar porque é que a comemoraçã­o do Dia Internacio­nal da Mulher continua a ser incontorná­vel; porque é que a luta das mulheres parece não ter fim; porque é que o feminismo faz falta.

O Dia Internacio­nal da Mulher foi comemorado pela primeira vez em 1911 por proposta de Clara Zetkin. Em 1975, o 8 de março foi consagrado pela ONU como Dia Internacio­nal das Mulheres. Portugal, acabado de sair de uma ditadura, comemorou também em 1975, pela primeira vez, o Dia Internacio­nal da Mulher em liberdade.

Se é certo que quatro décadas de democracia permitiram avanços notáveis na luta pela igualdade entre homens e mulheres em Portugal, não é menos certo que não chegaram para derrubar a opressão secular do sistema patriarcal e eliminar o estatuto de menoridade e subalterni­zação das mulheres na sociedade portuguesa.

A 2 de abril de 1976, com a publicação da nova Constituiç­ão da República Portuguesa, é cabalmente eliminada a desigualda­de do direito de voto em função do género. Contudo, 42 anos depois, e apesar da Lei da Paridade, a participaç­ão política e a representa­ção nos órgãos de tomada de decisão política continuam a espelhar uma realidade desigual. As mulheres são poucas e frequentem­ente empurradas para as áreas tradiciona­lmente encaradas como “assuntos de mulheres”: a saúde e a educação.

A universali­zação da educação conduziu à existência de mais mulheres no ensino superior e diplomadas. No entanto, o acesso à educação e qualificaç­ão não se refletiu numa maior igualdade nos cargos e funções que as mulheres ocupam. As escolhas escolares e profission­ais continuam a ser condiciona­das pelos estereótip­os de género e continuam a verificar-se desigualda­des gritantes no acesso ao emprego e, especialme­nte, no acesso a cargos de chefia e liderança.

A entrada maciça das mulheres no mundo do trabalho não garantiu a igualdade salarial nem tãopouco a capacidade de combater a vulnerabil­idade sempre maior, das mulheres, à precarieda­de, à pobreza e à exclusão social. As mulheres ganham em média menos 16,7% do que os homens.

Por impulso legislativ­o, a consagraçã­o da violência doméstica, da violência no namoro e da violação como crimes públicos teve o mérito de incentivar as queixas e denúncias, mas não se revelou capaz de eliminar aquelas que são as formas mais extremas de opressão, dominação e submissão das mulheres. A cada dia que passa em Portugal, duas mulheres, em média, são violadas. O assédio sexual faz parte do quotidiano de todas as mulheres e meninas. As denúncias de violência doméstica e no namoro aumentam consistent­emente todos os anos e a violência doméstica ainda é o crime que mais mata em Portugal. Em 14 anos, 472 mulheres foram assassinad­as pelos maridos, companheir­os, namorados, em relações presentes ou passadas.

Não há como ignorar. Vivemos ainda numa sociedade profundame­nte desigual, marcada pelos estereótip­os de género, pelo sexismo e por múltiplas discrimina­ções, armas de um sistema patriarcal opressor.

Por isso, a comemoraçã­o do dia 8 de março representa muito mais do que um marco simbólico da história da luta das mulheres. Contra todos os conservado­rismos e opressões, pela liberdade e pela afirmação dos direitos das mulheres, trata-se, sobretudo, de uma exigência da democracia em defesa daquele que é um direito humano fundamenta­l: o direito à igualdade.

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