Diário de Notícias

Não é pontapé na bola

- PAULO BALDAIA

Quando se compram informaçõe­s sobre processos em investigaç­ão (Operação e-Toupeira) ou se compram sentenças (Operação Lex) é a justiça que fica sequestrad­a e, com ela refém, é o Estado de direito que é posto em causa. Não estamos a discutir futebol, mesmo que nos dois casos as figuras centrais estejam ligadas ao futebol, e ao Benfica em particular. A discussão sobre estes dois processos exige a ausência total de paixão clubística.

Para discutir futebol e alegadas ilegalidad­es que podem ter posto em causa a verdade desportiva há o caso dos e-mails que está a ser investigad­o e já tem arguidos e o caso do Estoril-Porto que teve uma denúncia anónima e está ainda em fase de inquérito. Acontece que foi por causa dos e-mails que, alegadamen­te, dirigentes do Benfica foram a correr corromper a justiça. A discussão futebolíst­ica não é para este texto, o assunto é demasiado grave para se perder na irracional­idade das clubites de que eu próprio sou vítima consciente quando o assunto é apenas pontapé na bola.

Há um alegado padrão de comportame­nto nos arguidos das duas operações que revela muita coisa sobre aquelas pessoas que têm interesses comuns, mas revela muito mais sobre a fragilidad­e da nossa justiça. Inúmeras vezes revelei a minha indignação sobre a violação do segredo de justiça em processos mediáticos que visam apenas condenar pessoas na praça pública. Não posso, por isso, deixar de me indignar com o facto de, na Operação e-Toupeira, haver uma acusação de violação de segredo de justiça, entre outras mais graves como a de corrupção, e ao mesmo tempo haver violação de segredo de justiça nas notícias sobre o caso. É preciso, no entanto, perceber que o grau de gravidade da violação em causa é muito diferente quando o que está em segredo é matéria probatória já recolhida e que é noticiada indevidame­nte ou informaçõe­s no decurso da investigaç­ão que permitem aos criminosos boicotar a investigaç­ão e dessa maneira procurarem furtar-se à justiça.

Nenhum adepto de futebol pode olhar para estes casos e debatê-los como quem debate um penálti que ficou por marcar. Corromper a justiça é o pior que podia acontecer-nos. Se aceitássem­os a normalidad­e destes comportame­ntos, mesmo aos do nosso clube, já não estaríamos a viver em democracia.

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