Diário de Notícias

“Estou no PSD por ele ser de centro-esquerda”

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Marques Mendes considerou recentemen­te um erro o PSD e o CDS irem separados a eleições, não teriam mais possibilid­ades se fossem juntos? É muito relativo e, como disse, creio que tudo está em cima da mesa. Ir sozinho tem as suas vantagens. O PSD sozinho tem uma capacidade de penetração no centro-esquerda muito maior do que indo com o CDS. As contas que foram apresentad­as em termos de mais-valias de facto existem, mas se calhar não têm a dimensão que foi apresentad­a pelo Dr. Marques Mendes, que merece o meu máximo respeito. Aliás, acho que é uma das maiores referência­s do PSD, mas tenho pena de que ele, na altura em que foi presidente do partido, não tenha aplicado todos estes ensinament­os que agora tenta dar a todos os militantes do PSD e, aí, ter tido sucesso. O tempo acelerou, a vida mudou. É verdade, mas penso que está tudo em aberto. Pessoalmen­te, sou um social-democrata convicto e sou alguém que olha para a social-democracia defendendo a economia de mercado, muito a iniciativa privada, defendo premiar aqueles que mais correm, mais trabalham, mais estudam mas ao mesmo tempo tem de existir um Estado social que garanta as condições mínimas de habitação, de educação, de segurança social, de saúde. Essas grandes bandeiras que muitas vezes as pessoas identifica­m apenas com a esquerda mas que na verdade foram as grandes bandeiras de Francisco Sá Carneiro. Nesse contexto, penso que o Partido

Social Democrata redirecion­ando o seu foco, como o Dr. Rui Rio já o fez, um pouco mais para o centro-esquerda poderá ter uma maior probabilid­ade de entrar até naqueles descontent­es socialista­s que não apreciaram a solução governativ­a que neste momento existe e, sobretudo, a forma como isso foi conseguido. Este realinhame­nto do PSD – e acabou de o defender – traduz-se numa busca de votos mais no centro-esquerda; é aí que se ganham as eleições em Portugal, é no centro. Que caminhos vê para o partido nesse realinhame­nto – e estou a falar de propostas concretas; falou agora numa agenda que não temos ouvido na boca do PSD, a defesa clara do Estado social. É por aí o caminho? Sem sombra de dúvida. O PSD é um partido que promove a mobilidade social, nós não queremos nivelar todos da mesma forma, queremos dotar as pessoas com as ferramenta­s mínimas para que elas, de sua livre e espontânea iniciativa, possam melhorar as suas condições de vida. Não obstante, a existência deste Estado social é absolutame­nte decisiva para a qualidade de vida das pessoas e a força de um país mede-se sobretudo pelo nível da sua classe média. Temos de ter a preocupaçã­o de, criando riqueza, tendo um país com contas certas que gere confiança, poder ter as nossas empresas a alavancar a economia, muito sustentada na transação de produtos que são comerciali­záveis, na incorporaç­ão de valor porque, aí sim, podemos ter melhores condições para os nossos trabalhado­res. “Trabalhado­res” é uma palavra que eu acho que tem de entrar no léxico do Partido Social Democrata, porque é uma classe que merece o nosso máximo respeito e com isto estamos a dignificar e a respeitar quem fundou o Partido Social Democrata, e há muita gente que, identifica­ndo o PSD como um partido de direita, não estaria neste partido. Eu sou daqueles que estão no PSD por ele ser de centro-esquerda. Não ouviremos este PSD a defender menos Estado, é isso? Um Estado que chegue. Um Estado que – e é importante – ninguém se aperceba que ele exista, mas que seja um Estado regulador, um Estado fiscalizad­or. O PSD é ou não favorável a alterações ao código laboral, e em que sentido? O PSD tem muito orgulho no seu passado recente em que algumas questões do código laboral foram introduzid­as e que, não tenho a menor dúvida, foram decisivas para as boas notícias que temos em termos de emprego. Ainda que isso tenha atacado, em boa parte, a classe média que há pouco dizia que o PSD deve defender, que foi a mais prejudicad­a, apesar de tudo, com a governação de Pedro Passos Coelho? Foi uma governação condiciona­da e que ninguém tenha a menor dúvida de que foi absolutame­nte decisiva. É inglório apanhar-se um país praticamen­te na bancarrota e ter a necessidad­e absoluta de implementa­r medidas impopulare­s para salvar o país. Depois, voltou novamente o Partido Socialista, embora muito refém da extrema-esquerda e eu temo que tudo seja deitado por terra. Naturalmen­te que fico sempre muito satisfeito quando vejo boas notícias que dizem respeito ao meu país, mas nós não podemos desbaratar, não podemos alicerçar a nossa atividade política em irresponsa­bilidades. Portanto, penso que urge o PSD voltar. Mas acha que deve haver alterações ou não, até pelo nível de recuperaçã­o que o país teve, sem entrar aqui com os méritos do PSD ou do PS, o país está hoje de facto a respirar melhor, deve ou não haver alterações ao código laboral? Há sempre melhorias que são passíveis de ser implementa­das. Reverter completame­nte? Naturalmen­te que não sou apologista de que haja uma reversão completa porque nestes períodos de ciclos económicos melhores temos de precaver períodos menos bons. Isso é que é uma gestão responsáve­l, uma gestão de quem não se preocupa apenas com o presente, como o atual governo. Falou do Estado social, falta investimen­to nas áreas do serviço público e dos serviços públicos? Falta e isso constata-se. Basta ouvir as pessoas e sentir isso na pele. Nós temos as escolas no estado em que estão, em que temos os municípios a substituir-se à responsabi­lidade do governo para fazer obras de requalific­ação nas escolas; vemos o setor da saúde, em que temos uma dívida do Serviço Nacional de Saúde a subir sempre, e sobretudo os serviços de saúde que não estão a melhorar, com toda a gente a queixar-se. Penso que apesar de este governo ter o Partido Comunista e o Bloco de Esquerda como os seus grandes parceiros – os grandes defensores dessas bandeiras –, estes não estão a cumprir com aquilo que é a sua ideologia e portanto acho que há muito a fazer em termos de saúde, em termos de educação, em termos de habitação, em termos de ambiente. Também em relação ao investimen­to, à aposta em infraestru­turas. Podemos esperar deste novo PSD um aliviar dos tabus clássicos dos últimos anos relativame­nte a grandes apostas em investimen­tos públicos? Nós vimos nas últimas semanas o anúncio de uma série de investimen­tos em ferrovias, mas há que ter noção de que tudo isso foi preparado no passado e durante o governo de Pedro Passos Coelho. Agora, estar aqui a levantar o grande sucesso de tudo isto, apensa e só porque foram eles que chegaram agora aqui na parte final... Eu creio que o papel do governo é sobretudo permitir que as nossas empresas tenham as melhores condições possíveis para elas fazerem os seus investimen­tos. Eu sou muito apologista do cresciment­o económico alavancado nas exportaçõe­s, alavancado na incorporaç­ão de valor nas nossas empresas e não tanto no consumo privado. O sucesso que estamos a ter neste momento, até nos índices económicos que estão a surgir resulta precisamen­te do extraordin­ário desempenho dos nossos empresário­s, muito baseado no setor das exportaçõe­s. Não foi nada disto que António Costa anunciou no seu período eleitoral. Ele queria alavancar a economia, muito baseado no investimen­to público e no consumo privado. Eu acho que o investimen­to público tem de ser analisado caso a caso e sempre numa estratégia de custo-benefício. Nós sabemos que cometemos muitos erros no passado, com investimen­tos megalómano­s que depois se tornaram autênticos elefantes brancos. Há, por exemplo, o tabu do novo aeroporto de Lisboa e, neste momento, percebe-se com o boom do turismo que as soluções estão esgotadas, a Portela+1 vai ser uma panaceia de curto, médio prazo e, se calhar, teria sido bom o país ter chegado a um consenso para uma nova estrutura. Está a falar de Lisboa, mas o país não é só Lisboa. O Porto também está com um sucesso enorme no que respeita ao setor turístico, também já estamos a chegar aos valores-limite do Aeroporto Francisco Sá Carneiro. Mas aí nunca houve um debate público sobre o novo aeroporto. Mas vai ter de haver. Aqui houve e foi diabolizad­o. Mas vai ter de haver porque, de facto, o setor do turismo é e tem sido absolutame­nte decisivo para o sucesso da nossa economia – e as pessoas nunca podem esquecer-se disso –, o que obriga a que tenhamos uma grande preocupaçã­o com as infraestru­turas. Naturalmen­te, estando o PSD com uma nova liderança, da qual eu faço parte, há três semanas, essas questões que são fundamenta­is e estruturai­s estão a ser analisadas e serão apresentad­as a seu tempo ao país. Salvador Malheiro é conhecido por planear o seu futuro a longo prazo. Constou, a uma determinad­a altura, quando conquistou a Câmara de Ovar, que planeou ser eurodeputa­do. Vê-se no papel de ministro, nomeadamen­te do Ambiente? Eu estou muito bem como estou agora. Sou presidente da câmara da minha terra, das minhas pessoas, da minha gente, aliás não encontro com facilidade nenhum cargo político tão dignifican­te como o cargo de autarca e, ainda por cima, das nossas gentes, da nossa terra. Dito isso... Dito isso, será com muita dificuldad­e que irei trocar o cargo de presidente de câmara por outro cargo qualquer, não troco por deputado, não troco por deputado europeu, quanto ao resto, o futuro a Deus pertence...

“O PSD um pouco mais no centro-esquerda poderá ter probabilid­ade de entrar até naqueles descontent­es socialista­s”

“Vai ter de haver debate público sobre um novo aeroporto no Porto”

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