Assunção Cristas ignora Rio. Ela é “a única alternativa” a Costa
Líder do CDS assume nova ambição eleitoral para o partido: “É possível disputar a primeira liga.” O CDS, disse, fala “para todos” mas assume-se democrata-cristão. E joga sempre na “antecipação” da jogada política
Rui Rio e o PSD foram ontem os elefantes na sala do centro multiusos de Lamego, no primeiro dos dois dias do 27.º congresso nacional do CDS-PP. Quase nem foram referidos – mas foi obviamente contra o PSD e o seu novo líder que Assunção Cristas deu o passo em frente na afirmação de uma nova ambição eleitoral para o CDS-PP nas próximas eleições legislativas.
No discurso com que ontem fez o balanço da liderança partidária que conquistou em 2016, e em que apresentou a sua estratégia para os próximos dois anos, a líder centrista dificilmente poderia ter sido mais clara – suscitando aliás aplausos de pé dos congressistas: “O CDS não só é a alternativa como é a única alternativa! Vamos para a rua, vamos trabalhar!”
Antes, já tinha salientado que o partido superou todos os desafios eleitorais que enfrentou desde 2016 (eleições autárquicas e regionais dos Açores). E na sequência disso clarificou: “Sim, é possível chegar a outro patamar! Sim, é possível disputar a primeira liga.”
Afirmando insistentemente que o CDS tem de ter a ambição de falar para “todos”, reforçou: “Somos o partido alternativo ao socialismo que nos governou anos demais, nos endividou anos demais, nos empurrou para a ajuda externa vezes demais.” Isto é, o partido quer “ser o primeiro partido no espaço do centro e da direita, sem hesitações, sem complexos, com 40 anos de história atrás de nós a inspirar os muitos anos que temos pela frente”.
Cristas ignorou referências explícitas ao PSD mas não as poupou quanto ao governo de António Costa e à geringonça em geral. Foi contra “as esquerdas encostadas” – e não contra o PSD – que afirmou o CDS como “a única alternativa” ao PS. O PS e a maioria de esquerda – disse – “não têm uma visão de futuro para o país”, são “imobilistas”, “escondem a austeridade” que se vê “na degradação dos serviços públicos essenciais” e são incapazes de “baixar a carga fiscal”.
Contra isto, afirmou o CDS-PP como “o partido que prepara o futuro”, advogando o único caminho que conhece: “Jogar por antecipação.” “Quando os outros estão a pensar, nós já lá estivemos, quando os outros lançam um tema nós já o tratámos ou rapidamente o colocamos em cima da mesa das nossas ideias.”
E assim, fiel a este princípio do “jogar por antecipação”, anunciou que o CDS vai levar a votos no Parlamento – onde disse que o seu partido tem “a melhor bancada” – o Programa de Estabilidade que o governo terá de apresentar em breve, e que “enformará” a preparação do próximo Orçamento do Estado. Isto para que “fique absolutamente claro que as esquerdas estão bem unidas” – e tendo o partido novamente o cuidado de avançar contra “propostas alternativas”. Foi também nesta linha de “antecipação” de jogada política que o CDS foi o primeiro partido a anunciar, ontem no congresso, o seu cabeça-de-lista para as eleições europeias que se realizam em 2019. Nuno Melo, eurodeputado desde 2009, é a escolha “natural” da direção centrista.
Ao mesmo tempo, falando para dentro, procurou dissuadir discussões sobre supostos afastamentos ou não do partido em relação à sua matriz democrata-cristã. Garantindo que essa matriz é o “eixo” em redor do qual roda a ideologia do partido, a líder do CDS salientou no entanto que “a doutrina não se proclama mas põe-se em ação”. “Não esqueço nem o nosso programa
“Somos o partido alternativo ao socialismo (...) [O CDS] quer ser o primeiro partido no espaço do centro e da direita, sem hesitações, sem complexos, com 40 anos de história atrás de nós” ASSUNÇÃO CRISTAS LÍDER DO CDS
“Fui questionado à entrada sobre se o CDS estava a esquecer a matriz democrata-cristã. Não está. Não é possível mudar o paradigma” ADRIANO MOREIRA ANTIGO LÍDER DO CDS
nem a nossa história mas não me peçam, por um segundo que seja, que me perca em discussões e esqueça quem precisa de ajuda, de orientação, de apoio, para subir na vida e para dar melhor futuro aos nossos filhos.”
Antes, no início dos trabalhos, já o histórico líder do CDS Adriano Moreira tinha, comovido com a homenagem que o congresso lhe fez, e falando do alto dos seus 95 anos, “abençoado” a liderança de Cristas (“a nossa presidente”) dizendo que ela “assumiu” o “legado” da democracia-cristã que procurou deixar no partido.
Para o velho “senador” centrista, Cristas representa “a sabedoria, a família, a liberdade de pensamento” e ainda “a severidade carinhosa com que as mulheres nos ajudam a corrigir as coisas”, chegando a fazer comparações com o pontificado do Papa Francisco. “Fui questionado à entrada sobre se o CDS estava a esquecer a matriz democrata-cristã. Não está. Não é possível mudar o paradigma. Olhem para o Papa Francisco. Ele não tem outro Evangelho. Mas tem de fazer uma adaptação aos novos tempos. É isso que está a fazer.” Traduzindo: é isso que o CDS está a fazer, adaptando a sua matriz original “aos novos tempos”.