Batalhão da polícia que Marielle criticou é o que mais mata no Rio
“Batalhão da Morte”, como lhe chamou a vereadora executada, foi responsável por 561 homicídios desde 2011. Lote das balas do crime fora usado em chacina policial em São Paulo
No Rio de Janeiro, muitos saíram às ruas para protestar contra a intervenção militar no Rio, após a morte de Marielle Franco
JOÃO ALMEIDA MOREIRA, São Paulo O 41.º Batalhão da Polícia Militar do Rio de Janeiro foi notícia no Brasil nas últimas horas por ter sido chamado por Marielle Franco, a vereadora carioca assassinada na quinta-feira, de “Batalhão da Morte” dias antes do crime. Mas já havia sido manchete de jornais brasileiros nos seguintes termos: “Agentes presos após morte de cinco jovens no subúrbio do Rio”; “Polícia confunde macaco hidráulico com arma e mata dois jovens”; “Agentes atiram contra carro e matam estudante”; “Justiça torna réus dois polícias pela morte de uma menina”. Segundo o Instituto de Segurança Pública do Rio, nenhum batalhão dispara e mata mais do que o 41.º.
Criado em 2010 para controlar os 544 mil habitantes das favelas da Pedreira e do Chapadão, desde então o 41.º Batalhão foi responsável por 567 homicídios, noticia o jornal Folha de S. Paulo através da compilação de dados oficiais. Sozinho, responde por 12% das mortes em con- sequência de intervenção policial dos 41 batalhões da cidade. Em Janeiro, 41% das mortes violentas na região sob tutela do batalhão resultaram de ações dos seus agentes. Os casos mais mediáticos foram a chacina em 2016 de cinco jovens, entre os 16 e os 25 anos, dentro de um carro atingido por 111 tiros disparados pelos polícias e o da morte de Maria Eduarda, de 13 anos, alvejada no ano passado no pátio da escola.
Como Marielle, entre outras atividades ligadas aos direitos humanos, tinha a tarefa de divulgar as denúncias da população das favelas de abuso policial, o 41.º Batalhão está na mira da imprensa e, especula-se, dos investigadores da polícia civil que cuidam do caso. Estes investigadores concluíram que para a execução de Marielle e do motorista Anderson Gomes foram disparados 13 tiros de uma pistola 9 milímetros de um lote de munições vendido à polícia federal de Brasília em 2006, utilizado numa chacina policial em 2015 nos arredores de São Paulo, em que morreram 23 pessoas. E que um segundo carro, com matrícula de Nova Iguaçu, nos arredores do Rio, esperou Marielle sair do encontro com jovens negras para a seguir. Nele estava um homem que passou horas ao telefone.
A polícia já ouviu duas testemunhas: uma mulher que passava junto ao local e Fernanda Chaves, a assessora de Marielle, que no banco de trás do carro relia um texto enviado minutos antes ao Jornal do Brasil ao lado da vereadora. De acordo com informações no blogue da jornalista Mónica Bergamo, do Folha
Marielle Franco foi morta a tiro no banco de trás do carro
onde seguia. Tinha 38 anos de S. Paulo, Fernanda disse em depoimento que, assustada, depois de ouvir estrondos e disparos e ter sido atingida por estilhaços, ainda conseguiu tirar a perna do motorista do acelerador e desligar o carro.
No artigo do Jornal do Brasil publicado ontem a título póstumo, Marielle perguntava porque foi o Rio o alvo de intervenção militar se há nove estados com índices de violência superior. “O interventor federal General Braga Netto disse que o Rio é um laboratório para todo o Brasil. E o que vemos é que neste laboratório as cobaias são os negros e as negras, os periféricos, favelados, trabalhadores.”
À Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro, e ao Cemitério de São Francisco Xavier, na zona portuária, afluíram milhares de populares, artistas e políticos para homenagear a vereadora. Chico Buarque, na Cinelândia, disse que tinha votado nela. Caetano Veloso dedicou-lhe um concerto. Houve homenagens noutras cidades, como São Paulo, aonde acorreram milhares de manifestantes à Avenida Paulista.