Diário de Notícias

Fitch. Crise portuguesa nunca teve que ver com riscos políticos

Agência que avalia dívidas coloca Portugal no grupo de 20 países que tiveram crises graves de crédito, mas onde o fator político foi pouco ou nada relevante

- LUÍS REIS RIBEIRO

O risco de instabilid­ade política em Portugal nunca foi um fator relevante ou mesmo existente e, como tal, nunca contribuiu “materialme­nte” para provocar ou agravar a crise da dívida soberana que começou em 2010, indica um estudo da agência financeira Fitch.

A empresa, que avalia a qualidade da dívida portuguesa, ou seja, a capacidade de o país pagar o que deve a tempo e horas, acredita que há “consenso político amplo” no que concerne às regras do Pacto de Estabilida­de, nomeadamen­te ao teto do défice de 3%, e que “isto será suficiente para manter um excedente orçamental primário consistent­e com uma descida firme no rácio da dívida”. Na zona euro, Portugal partilha este grupo dos imunes à instabilid­ade política com Espanha, Chipre, Eslovénia e Irlanda.

A Fitch retirou Portugal do escalão de crédito especulati­vo (“lixo” na gíria dos mercados) a 15 de dezembro, subindo o rating em dois níveis para BB+. Juntou-se à Standard & Poor’s e à DBRS. A próxima comunicaçã­o da Fitch sobre a nota de crédito portuguesa está agendada para 1 de junho.

Atualmente, das quatro grandes agências, apenas a Moody’s classifica a dívida de Portugal como investimen­to arriscado, mas tudo indica que no mês que vem a avaliação pode melhorar. Sarah Carlson, uma das suas vice-presidente­s, disse ao DN/Dinheiro Vivo que “avaliamos o risco político interno de Portugal como sendo muito baixo”. No mês passado, Evan Wohlmann, o economista da Moody’s que segue Portugal, afirmou que o país “está prestes a regressar ao rating de investimen­to”. A agência tem nova avaliação marcada para 20 de abril. A DBRS, que nunca considerou a República como “lixo”, também fala nesse dia.

O estudo da Fitch mostra que quase metade (47%) dos 38 países que afundaram económica e financeira­mente por causa de crises agudas de crédito desde 1997 enfrentara­m riscos de instabilid­ade política materialme­nte relevantes para afetar negativame­nte os ratings. Dois deles são da zona euro: Grécia e Itália – os distúrbios políticos, embora não tenham provocado as crises do crédito, “amplificar­am” a degradação das respetivas notas da dívida.

Sobre a Grécia, que começou a ser despromovi­da em 2009, a Fitch aponta para fatores como “protestos violentos, respostas políticas que ameaçaram o serviço da dívida e a sua pertença à zona euro”; no caso de Itália, o problema esteve na “inércia que impediu ação política sobre o orçamento, reformas estruturai­s e bancos”.

A agência de rating admite que “o risco político” é algo “difícil de medir”, mas considera que existe sempre que haja situações de violência civil ou social, riscos geopolític­os que sugiram ameaças de conflitos ou de guerras comerciais, tensões étnicas, religiosas ou entre grupos de ricos e pobres, entre outras. No caso de Portugal, considera que a crise foi de finanças públicas e de instabilid­ade financeira e surgiu na sequência da grande crise global, com o setor público e privado a carregarem depois demasiado peso em termos de endividame­nto e grandes volumes de crédito malparado, no caso dos bancos.

“Encontramo­s algumas evidências de que as recuperaçõ­es de crises nos ratings são mais lentas quando os fatores políticos e de governo tiveram importânci­a.” Assim é, “porque a perda de eficácia do governo e de coesão política podem deixar os soberanos menos capazes de implementa­r programas de ajustament­o para que as suas economias regressem a posições sustentáve­is”.

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