Diário de Notícias

Anunciação já está no Museu de Arte Antiga

Pintura. Comprada pelo Estado português num leilão em fevereiro, por 280 mil euros, a obra de Álvaro Pires de Évora já pode ser vista no MNAA, ao lado dos Painéis de São Vicente

- MARIA JOÃO CAETANO

É um quadro pequeno. Pouco mais de 30 centímetro­s de altura por 22 de largura. Mas as cores vibrantes prendem-nos o olhar. Aproximamo-nos para ver melhor os pormenores daquela cortina vermelha, as asas do arcanjo Gabriel, o volume das roupas de Maria, uma pomba a esvoaçar, a mão de Deus, que tudo comanda. É, na verdade, uma pequena maravilha. Anunciação, a pintura que Álvaro Pires de Évora realizou entre 1430 e 1434, percorreu um longo caminho mas está, finalmente, no sítio a que pertence: no Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA), em Lisboa, na mesma sala onde se encontram também os Painéis de São Vicente, de Nuno Gonçalves.

O quadro foi comprado pelo Estado português num leilão da Sotheby’s, em Nova Iorque, em feÁlvaro vereiro passado, pelo valor de 350 mil dólares (280 mil euros). Um valor justificad­o pelo facto de esta ser “uma obra maior” daquele que é o primeiro pintor português a quem é atribuída obra artística e que continuava, até agora, ausente na coleção do MNAA, como explicou o diretor do museu, António Filipe Pimentel, na apresentaç­ão da pintura, ontem de manhã, na presença do ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, e do primeiro-ministro, António Costa.

“É uma peça magnífica”, disse António Filipe Pimentel, não escondendo a sua felicidade por concretiza­r um objetivo que tinha sido traçado pelo museu há quase 25 anos, quando o quadro foi mostrado em Portugal na exposição Álvaro Pires de Évora: Um Pintor Português na Itália do Quattrocen­to, na Torre do Tombo, integrada na programaçã­o de Lisboa 1994.

“É uma das peças que faltavam para entender a nossa história da pintura”, explicou. E também para entender aqueles painéis que Nuno Gonçalves pintou entre 1450 e 1492. Antes disso, no MNAA, havia António Florentim, um pintor florentino que no início do século XV esteve na corte de D. João I, mas, entre eles, apenas “uma nebulosa”. “Havia elos muitos dispersos e sobretudo documentai­s.”

Pires de Évora nasceu em Portugal na primeira metade do século XV mas viveu quase toda a sua vida em Itália, e está documentad­o na região da Toscana, em Itália, entre 1411 e 1434, começando pela sua integração num grupo de pintores florentino­s encarregad­os de pintar a fachada do Palácio del Ceppo, em Prato. Esta incorporaç­ão da sua obra no MNAA, afirmou António Filipe Pimentel, “permite-nos entender como foi possível surgir em Portugal uma obra tão madura como a de Nuno Gonçalves”.

Parte de um díptico pintado e realizada, provavelme­nte, como obra de devoção privada, esta Anunciação data já da parte final da carreira de Álvaro de Pires e é, segundo o diretor do MNAA, “uma obra de qualidade maior” do artista. A obra pertenceu à coleção de Heinz Kisters, na Suíça, e passou a propriedad­e do chanceler alemão Konrad Adenauer, cujos herdeiros a revenderam, após 1967, a Kisters.

Alertado para o anúncio do leilão pela direção do museu e pela Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), o ministro da Cultura mandou publicar um despacho que permitiu mobilizar 250 mil euros das verbas do Fundo de Fomento Cultural para licitar a obra a 1 de fevereiro, recordou Luís Filipe Castro Mendes. A este valor viriam a ser acrescenta­das os custos inerentes às comissões de venda, no valor de cerca de 90 mil euros, saídas das verbas da DGPC, num “esforço financeiro do Estado correspond­eu a 90% dos valores envolvidos na aquisição”.

Para perfazer os restantes 10% da totalidade dos valores envolvidos na aquisição, os Amigos do Museu contribuír­am com 25 mil euros e a direção do MNAA avançou com seis mil euros que tinham sobrado da campanha de angariação de fundos para a aquisição da Adoração dos Magos, de Domingos Sequeira.

A Anunciação passa, assim, a ser a segunda pintura conhecida do autor em Portugal, além de A Virgem com o Menino entre S. Bartolomeu e Santo Antão, sob a Anunciação, que pertence ao acervo do Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo, em Évora.

Aposta no património O ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, congratulo­u-se com a aquisição da Anunciação, que, disse, “dá continuida­de e reforça as políticas do governo e do Ministério da Cultura para a valorizaçã­o das coleções nacionais, que se iniciaram com a decisão de permanênci­a em Portugal das 85 obras de Miró, a serem expostas no Museu de Arte Contemporâ­nea de Serralves, e prosseguir­am, no final do ano passado, com a aquisição de seis importante­s obras de Maria Helena Vieira da Silva, em exposição no Museu da Fundação Arpad Szenes-Vieira da Silva”. Pelos valores envolvidos em todas estas operações, estamos perante “uma das maiores incorporaç­ões de bens artísticos nas coleções nacionais de que há memória desde a Implantaçã­o da República”.

Castro Mendes anunciou ainda que através do acordo entre a administra­ção do Novo Banco e o Ministério da Cultura firmado neste ano, “serão colocadas à fruição pública em museus de todas as regiões do país” peças daquela coleção de arte privada, e “uma das mais significat­ivas será depositada no Museu Nacional de Arte Antiga”, sem adiantar qual.

MUSEU NACIONAL DE ARTE ANTIGA

Esta é a primeira obra de Álvaro Pires de Évora no MNAA e apenas a segunda obra deste artista do século XV que existe em Portugal

Rua das Janelas Verdes, Lisboa De terça a domingo, das 10.00 às 18.00 Bilhetes: 6 euros

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O primeiro-ministro António Costa esteve ontem na apresentaç­ão da obra de Álvaro Pires de Évora no MNAA

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