Diário de Notícias

TRUMP FELIZ COM VENDA DE ARMAS,MAS PRÍNCIPE QUER A ARÁBIA A APRENDER COM A AMÉRICA COMO SE FAZ UM PAÍS MODERNO

Diplomacia. Mohammad bin Salman via estar cerca de três semanas nos EUA e visitará Wall Street e Silicon Valley, entre outros lugares. No encontro com Trump na Casa Branca, prometeu fortes investimen­tos na economia americana

- ABEL COELHO DE MORAIS

O presidente Donald Trump pode ter elogiado a amizade entre os Estados Unidos e a Arábia Saudita, garantido que a relação bilateral “só vai melhorar”, ter mostrado cartazes com números – impression­antes – das compras de armamento de Riade a empresas americanas e o modo como isto gera criação de emprego nos EUA. Pode ter discutido a concretiza­ção de um acordo para o fornecimen­to de tecnologia nuclear aos sauditas e analisado os pontos de tensão internacio­nais, da guerra na Síria ao conflito no Iémen, e a transferên­cia da representa­ção diplomátic­a americana de Telavive para Jerusalém; se tudo isto é importante, não esgota a dimensão da agenda que o príncipe herdeiro Mohammad bin Salman trouxe aos EUA.

Se a dimensão das compras de armamento foi de 200 mil milhões de dólares (163 mil milhões de euros) em contratos assinados em 2017, com a geração respetiva de 40 mil postos de trabalho nos EUA, segundo Trump, a duração da viagem do dirigente saudita, cerca de três semanas, e a sua extensão mostram tudo o resto que está em questão. Bin Salman vai atravessar os EUA de Leste a Oeste e, além de Washington, vai estar em Silicon Valley, Seattle, Houston, Boston e Nova Iorque, onde se deslocará aWall Street.

O destino destas deslocaçõe­s ilustra estar em jogo muito mais do que a tradiciona­l dimensão de coincidênc­ia geoestraté­gica entre Washington e Riade, com exceção do período em que Barack Obama esteve na Casa Branca. E o que está em jogo é o processo de reformas profundas que Bin Salman, de 32 anos e também conhecido pelas iniciais do nome (MbS), iniciou desde que foi designado príncipe herdeiro em junho de 2017 por seu pai, o rei Salman. É, aliás, esta a primeira deslocação de MbS aos EUA na qualidade de príncipe herdeiro.

O processo de reformas está enquadrado no documento Visão 2030 e que contempla mudanças estratégic­as na economia e na sociedade sauditas. No plano económico, um desígnio central é libertar o país da dependênci­a da renda petrolífer­a, enquanto no plano social se procura pôr fim a anacronism­os como a interdição de conduzir para as mulheres, preparando a Arábia Saudita para o futuro.

Os encontros previstos mostram-no. Além de Silicon Valley, MbS estará em Boston para conversaçõ­es sobre cooperação a nível de universida­des e terá contactos com responsáve­is da Apple e da Amazon. O objetivo é tornar o reino uma sociedade baseada na tecnologia, com alguns observador­es a referirem a ambição de a Arábia Saudita puder ser a “Silicon Valley do Médio Oriente”, além de principal centro financeiro na região.

Outra ambição de MbS é criar condições para o aumento de investimen­tos bilaterais dos EUA na Arábia Saudita e deste país em território americano. Para mostrar a importânci­a do tema, MbS referiu-se a ela falando em inglês e apontou o valor de 400 mil milhões de dólares a serem investidos pelos sauditas nos EUA num período de dez anos.

Acordo nuclear Um dos mais importante­s resultados da viagem e do encontro com o presidente Trump será a concretiza­ção de um acordo para a construção de duas centrais nucleares, a iniciar no final deste ano, e que representa­rá contratos na ordem dos milhares de milhões de dólares para empresas americanas.

Com este projeto, a Arábia Saudita entra no clube dos poderes nucleares e, se a finalidade é o uso pacífico, fica também aberto caminho para o domínio do vetor militar. Numa recente entrevista, MbS disse explicitam­ente: “Se o Irão se dotar da arma nuclear, a Arábia Saudita fará o mesmo.”

Se a hipótese de a Arábia Saudita construir reatores nucleares não é nova, ganhou nova dinâmica após a assinatura do acordo sobre o nuclear iraniano em 2015 e por aquilo que Riade considerou um distanciam­ento de Barack Obama face aos interesses sauditas.

Neste ponto, a presença do príncipe herdeiro saudita nos EUA transmite também uma importante mensagem. Mostra que existe de novo uma sintonia generaliza­da entre Washington e Riade, apesar de permanecer­em alguns pontos de tensão, nomeadamen­te naquilo que durante o encontro na Casa Branca Trump classifico­u como a “tolerância zero no financiame­nto ao terrorismo” por parte dos EUA. A Arábia Saudita, direta ou indiretame­nte, apoia movimentos considerad­os terrorista­s pelos países ocidentais.

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Trump exibe cartazes com números a demonstrar a importânci­a das compras sauditas em armas para a economia dos EUA

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