Diário de Notícias

Militares vão atuar como polícias do mar

Governo está a preparar diploma com base em documento preparado pela Marinha para dar poderes de fiscalizaç­ão como autoridade­s de polícia aos comandante­s dos navios militares nos espaços marítimos nacionais

- MANUEL CARLOS FREIRE

Governo está a preparar diploma com base em documento da Marinha. Comandante­s das forças navais ganham poderes de fiscalizaç­ão como autoridade­s de polícia nos espaços marítimos nacionais.

O governo está a apreciar um projeto de diploma elaborado pela Marinha e proposto pelo Ministério da Defesa que visa dar poderes de polícia aos comandante­s dos navios militares no mar, soube o DN.

Segundo uma das fontes conhecedor­as da informação dada pela Defesa, este gabinete assumiu a proposta por entender que se enquadra nos objetivos do governo para valorizar o “exercício das funções nas Forças Armadas e de otimização dos recursos utilizados” – um dos argumentos com que a Marinha procura há anos justificar a atribuição legal de poderes de polícia que lhe estão constituci­onalmente vedados e que justificou mesmo a separação legal entre a organizaçã­o do ramo e as estruturas da Autoridade Marítima. Aliás, a aceitação desse critério permitiria que os militares do Exército se substituís­sem aos da PSP e da GNR em terra, desde logo na fiscalizaç­ão do trânsito (entre outros exemplos).

A proposta, adiantaram as fontes, defende ainda a “certificaç­ão do pessoal da Marinha no âmbito da fiscalizaç­ão da pesca” – para agirem como inspetores dessa atividade.

Curiosamen­te, a proposta de decreto-lei elaborada pela Marinha – com base num despacho de 2015 do então chefe do ramo, almirante Macieira Fragoso – e entregue a Azeredo Lopes (professor catedrátic­o de Direito) no final de 2017 parece colidir com a intenção de ter agentes da Polícia Marítima a bordo dos navios militares para exercerem a autoridade do Estado no mar.

Essa intenção foi transmitid­a em novembro passado pela Marinha, então chefiada pelo agora chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, almirante Silva Ribeiro. De acordo com o seu porta-voz, a guarnição da unidade auxiliar da Marinha que iria começar a operar neste ano na Madeira – precisamen­te o nome atribuído à nova embarcação – seria formada por militares do ramo e estar caracteriz­ada com os símbolos da Polícia Marítima, tendo a bordo agentes dessa força de segurança.

“Esta será a primeira embarcação oceânica da Polícia Marítima, retratando aquilo que tem sido o esforço de capacitaçã­o daquele órgão de polícia criminal”, explicou ao DN o então porta-voz da Marinha, Coelho Dias, acrescenta­ndo que esse “será também mais um importante passo naquilo que tem sido o apoio e articulaçã­o [daquele ramo militar das Forças Armadas] com a Autoridade Marítima Nacional”.

Fica assim por perceber como é que o mesmo chefe da Marinha enviou à tutela uma proposta de diploma para dar poderes aos comandante­s dos navios militares que o Estado atribui aos membros das forças e serviços de segurança.

Marcelo espera pelo diploma

Com o diploma ainda em debate no interior do governo, em que pelo menos o Ministério da Administra­ção Interna terá de o analisar, fonte oficial do Palácio de Belém disse ao DN que o Chefe do Estado e comandante supremo das Forças Armadas só abordará o caso quando o diploma ali chegar.

Os ministério­s da Defesa e da Administra­ção Interna não respondera­m até ao fecho da edição.

Marcelo Rebelo de Sousa afirmou há dias, na tomada de posse do almirante Silva Ribeiro como principal chefe militar, que nos últimos anos tem sido necessário “explicar às Forças Armadas como devem agir e esclarecer a sua ação” à luz da Constituiç­ão – em que lhes cabe a defesa militar da República e o cumpriment­o de obrigações externas do país no âmbito das organizaçõ­es internacio­nais a que pertence (ONU, UE, NATO), podendo ainda ser encarregad­os de apoiar as autoridade­s civis em território nacional.

Acresce que em 2016 o Presidente da República enaltecera o papel dos “agentes da Polícia Marítima” – que a Marinha tem identifica­do como “militares e militariza­dos” – porque “contribuem para o cumpriment­o da lei no mar, confirmand­o Portugal como um verdadeiro Estado de direito democrátic­o”.

Com a Marinha a insistir em tutelar a Polícia Marítima (PM) por o seu chefe ser também Autoridade Marítima Nacional (mas para efeitos de coordenaçã­o dos meios militares em apoio das autoridade­s civis), Marcelo fez questão de deixar “um gesto público de reconhecim­ento a este órgão de polícia que [...] tem sabido garantir no quadro do Sistema de Autoridade Marítima a segurança e os direitos de todos os cidadãos” no mar.

Registe-se que a PM é o único órgão de polícia em Portugal que não depende diretament­e do ministro.

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A fragata Álvares Cabral será um dos navios da Marinha que poderá ter essa missão de policiar o mar

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