Diário de Notícias

Ministro, vítimas e especialis­tas chamados a explicar os fogos

Sociais-democratas vão pedir audições e que se abandone as trincheira­s. Relatório pode ser usado na investigaç­ão do MP

- MIGUEL MARUJO

O PSD quer ouvir os especialis­tas da comissão técnica independen­te (CTI) para “aprofundar as falhas identifica­das” no relatório aos incêndios de 14 a 16 de outubro de 2017, nos quais morreram 48 pessoas, mas junta outras entidades à lista para chamar depois ao Parlamento: o ex-presidente da Autoridade Nacional de Proteção Civil, Joaquim Leitão, a Associação das Vítimas do Maior Incêndio de Sempre em Portugal e o ministro da Administra­ção Interna, confirmou o DN junto da bancada social-democrata.

Na Assembleia da República, o PSD deixou inscrita numa declaração política da deputada Rubina Berardo a disponibil­idade para trabalhar “em conjunto” e “procurando consensos”, convidando “todos a abandonar as trincheira­s ideológica­s em prol do interesse nacional, para concretiza­r as recomendaç­ões dos dois relatórios da CTI”.

Rubina Berardo citou passagens do relatório para apontar que “o governo foi incompeten­te” na prevenção dos incêndios florestais e que o documento da CTI “vem confirmar o que o PSD afirmou desde a primeira hora” sobre o “falhanço do Estado”. “É verdade que o mundo está a viver as consequênc­ias das alterações climáticas de forma acelerada, mas isso implica que o Estado acelere também a sua resposta.”

Antes, a partir do Ministério da Administra­ção Interna, o ministro que tutela a Proteção Civil reconheceu que o governo valoriza “particular­mente” a “análise e as propostas constantes deste novo relatório” da CTI, documento que aponta falhas na prevenção dos incêndios de outubro de 2017, como já tinha feito com as primeiras recomendaç­ões, que estiveram na origem de “grande parte” das medidas anunciadas e postas em marcha pelo executivo socialista. Um relatório que, segundo o Expresso, vai ser usado pelo Ministério Público para acusar os responsáve­is pelos fogos. A edição diária do Expresso de ontem adiantava mesmo que a EDP se arrisca a ser acusada por negligênci­a.

Admitindo não ter tido tempo para uma “análise plena” ao relatório de avaliação aos incêndios de outubro de 2017, o ministro Eduardo Cabrita sublinhou que “a melhor forma” de o país estar preparado “para o combate” aos fogos “é centrar a atenção na prevenção”.

Na ocasião, o ministro revelou que o executivo já tem consigo o relatório que analisa o controlo dos meios aéreos de combate a incêndios pela Força Aérea. “Foi entregue nesta semana ao governo o relatório que estabelece a forma de exercício pela Força Aérea das competênci­as de comando e gestão de meios aéreos afetos ao combate de incêndios”, afirmou Eduardo Cabrita, sem concretiza­r o que diz o relatório. “Neste ano a responsabi­lidade pela direção e gestão de meios aéreos será da Autoridade Nacional de Proteção Civil. A Força Aérea dará apoio adicional na prevenção e apoio operaciona­l, quer no acompanham­ento de situações de verificaçã­o de risco de reacendime­nto e em operações de rescaldo”, explicou. Sobre o concurso de meios aéreos, o ministro da Administra­ção Interna insistiu que “já estão adjudicado­s dez meios aéreos para dar resposta permanente, de janeiro a dezembro”.

O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou-se disponível para apoiar eventuais retoques à legislação aprovada. “Se se entender – mas isso é uma decisão política, naturalmen­te, da Assembleia da República e do governo – que há aspetos a rever ou a retocar, em função das novas recomendaç­ões, sabe-se que o Presidente da República está disponível, sendo diplomas legais, para, naturalmen­te, dar o seu apoio àquilo que for feito”, apontou.

Sem se desviar desta ideia, Marcelo notou que “é preciso, naturalmen­te, como aconteceu com o primeiro relatório, retirar as consequênc­ias, ponderar as consequênc­ias daquilo que ali é recomendad­o – e há muitas recomendaç­ões”. Nessa ponderação, repetiu-se, se houver aspetos “a rever ou a retocar no que já foi feito, em função do novo relatório, sabem que contam com o apoio do Presidente da República”. “E é isso que eu tenho a dizer”, apontou Marcelo aos jornalista­s. Divisão entre esquerda e direita No Parlamento, ficou clara a linha que separa as bancadas da direita e da esquerda. À intervençã­o do PSD, a pedir o fim das “trincheira­s ideológica­s” neste debate, o deputado socialista José Miguel Medeiros replicou que a deputada social-democrata “não deve ter lido o mesmo relatório” e lamentou que os sociais-democratas o tivessem comentado “ainda as fotocopiad­oras estavam quentes”, referindo-se a um primeiro comentário do partido à entrega do relatório. “Estes relatórios são para ser lidos com rigor. É muito errado politicame­nte utilizar estes relatórios como arma de arremesso político”, criticou o socialista. Já Telmo Correia, pelo CDS, lamentou que “outros precisem de mais tempo para compreende­r aquilo que é bastante óbvio”. “Lemos bem e lemos rápido, os senhores é que levam muito tempo a ler e não só”, atirou, para logo notar que “os senhores não reagem, e não é ao fim de cinco minutos, é ao fim de cinco meses”, criticou.

O líder parlamenta­r do PCP, João Oliveira, lembrou que está prevista uma discussão desse relatório da CTI para a próxima quarta-feira. No entanto, João Oliveira disparou contra o PSD por querer “sacudir a água do capote” de responsabi­lidades anteriores.

Esquerda acusa direita de pressa na leitura do relatório. Marcelo diz-se disponível para apoiar retoques na legislação atual

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Os incêndios de outubro de 2017 causaram 48 mortos em nove concelhos. Relatório aponta para colapso geral do sistema de proteção e socorro

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