Os mercados não refletem a bomba-relógio que é a Itália para a zona euro
A dinâmica parlamentar é crucial, pois os populistas representam 60% dos deputados e senadores
AItália não é a única potencial fonte de uma futura instabilidade económica para a zona euro, mas é a mais previsível. Outros gatilhos possíveis são uma guerra comercial e uma recessão económica global ou, mais provavelmente, ambas.
Uma guerra comercial continua a ser um perigo evidente e presente. A UE garantiu um adiamento das tarifas americanas sobre o aço e o alumínio. Mas o bloco comercial europeu está perigosamente dependente da exportação de produtos industriais. E devemos ter cuidado para não interpretar erradamente o anúncio de um pequeno adiamento como um sinal do apaziguamento de Donald Trump.
O presidente dos EUA tomou a decisão tática de não combater a UE e a China ao mesmo tempo. Assim, a ameaça para a UE não desapareceu e as concessões que ele irá exigir para uma isenção permanente serão enormes.
Uma guerra comercial ou outro desastre geopolítico tornou-se mais provável. Ambos têm o potencial de acabar com a atual tendência de expansão económica global. Uma desaceleração, mesmo que não seja uma recessão, seria venenosa para a zona euro e para Itália.
A crise da zona euro deixou a Itália apenas com um caminho, e incerto, para conseguir uma base sustentável: a contenção orçamental permanente e a reforma económica (juntamente com uma oração a pedir que essa combinação de sonho da economia conservadora assegure a sustentabilidade duradoura da dívida). De volta ao mundo real, nenhum partido político italiano prometeu reformas sérias, e os dois partidos vencedores das recentes eleições gerais, o Movimento 5 Estrelas e a Liga anti-imigrantes, ameaçaram desencadear o oposto da contenção orçamental. Então, se a economia global cair, levará a Itália com ela.
Um momento crítico a ser observado é o orçamento de 2019, que deverá ser aprovado até ao próximo outono. É bem provável que Itália tenha um novo governo até lá. Mas a dinâmica política do Parlamento será mais importante. Os partidos populistas representam cerca de 60% dos deputados e senadores italianos. A sua prioridade não será se- guir as regras orçamentais da UE. Quando os governos são fracos, os parlamentos são fortes. Não parece que a maioria no Parlamento italiano vá aprovar mais um orçamento de austeridade.
Então, porque estão tão calmos os mercados financeiros? Eu acho que eles estão a cometer dois erros de cálculo. O primeiro é que Mario Draghi é um garante de estabilidade até ao seu mandato terminar em outubro do próximo ano. Eu não apostaria que o presidente do Banco Central Europeu viesse em auxílio de um Estado membro que desrespeitasse deliberadamente as regras orçamentais.
Quando ele, em 2012, assumiu o seu compromisso de fazer tudo o que fosse possível, a Itália era governada por Mario Monti, um primeiro-ministro europeísta a liderar um governo de tecnocratas. Naturalmente, o senhor Monti cumpriu as regras.
O segundo erro de cálculo é o de que o poder instituído italiano encontrará sempre maneira de manter os extremistas longe do poder. Perdi a conta ao número de vezes em que me asseguraram que as reformas eleitorais garantiriam a vitória dos partidos do centro. Os sistemas eleitorais importam, é claro, mas não podem produzir milagrosamente maiorias onde estas não existem.
Aquilo que estamos a assistir em Itália agora é a resposta previsível a duas décadas de política económica que não conseguiu gerar empregos para os jovens. Muitas das vítimas desta política são agora a espinha dorsal do apoio aos dois partidos populistas triunfantes. Nenhum país, nem mesmo um país paternalista como a Itália, pode manter um consenso pró-europeu na presença de uma calamidade económica permanente.
A menos que o 5 Estrelas ou a Liga concordem em se autodestruir, eles não podem deixar de cumprir as suas promessas eleitorais. O 5 Estrelas prometeu um rendimento básico universal; a Liga quer uma taxa de imposto fixa. Ambos pretendem reverter as reformas das pensões. Essas promessas são simplesmente inconsistentes com a adesão às regras orçamentais da UE.
Novas eleições não resolveriam o problema. Elas podem produzir o mesmo resultado ou uma parcela ainda maior dos votos para os partidos radicais. Continuará a não haver uma maioria para a reforma económica e a contenção orçamental. Por outras palavras: de todas as formações viáveis, é difícil ver uma que garanta a conformidade com as regras orçamentais da UE.
A tragédia da zona euro tem sido o facto de a Itália ser grande demais para salvar e grande de mais para falhar. A zona euro não possui instrumentos para lidar eficazmente com a crise de um grande país. As conversações franco-alemãs sobre a reforma da zona euro pertencem à categoria dos não essenciais – novas regras para o Mecanismo Europeu de Estabilidade, o guarda-chuva de resgate e os próximos passos em direção à união bancária.
Mas se Paris e Berlim levassem a sério a prevenção de crises, teriam de falar sobre um único ativo seguro como proteção para os mercados financeiros e um instrumento de financiamento para criar capacidade orçamental para as economias improdutivas da zona euro. As hipóteses políticas de tais reformas são zero.
Pois enquanto isto continuar assim, podemos definir um período de estabilidade económica como o período entre duas crises.