Diário de Notícias

Tribunais recorrem cada vez mais a psicólogos para audições a crianças

São técnicos que dão apoio ao juiz nas entrevista­s a menores e avaliam se estes estão preparados para prestar depoimento. Com o interesse crescente, a Ordem dos Psicólogos já deu formação específica a 800 profission­ais

- RUTE COELHO

A Ordem dos Psicólogos vai assinar um protocolo com o Conselho Superior da Magistratu­ra para reforçar colaboraçã­o

Os tribunais criminais e cíveis estão cada vez mais a recorrer aos psicólogos para auxiliarem os juízes na preparação das audições às crianças e para acompanhar­em os menores, avaliando se estes estão em condições de poder dar o testemunho. Tornou-se até uma “prática generaliza­da há mais de um ano”, garantiram ao DN o bastonário da Ordem dos Psicólogos, Francisco Miranda Rodrigues, e o presidente do conselho regional de Lisboa da Ordem dos Advogados (OA), António Jaime Martins. Por lei a audição das crianças a partir dos 12 anos é obrigatóri­a para decidir nas responsabi­lidades parentais mas “até têm sido ouvidas com menos de 12 pelos juízes”, explica António José Martins. “Os pais não se podem opor às audições mas a criança tem o direito de não querer ser ouvida.”

Miranda Rodrigues e António Jaime Martins organizara­m um colóquio sobre a “audição da criança em tribunal”, na semana passada , em que se anunciou o lançamento de um projeto-piloto nesta matéria (ver caixa).

O maior recurso dos tribunais ao auxílio da psicologia levou a Ordem dos Psicólogos a apostar em cursos de formação específica para os seus profission­ais. “Por causa do recurso cada vez maior a psicólogos pelos tribunais, a ordem avançou, em setembro do ano passado, com ações de formação de 30 horas em áreas específica­s da justiça, em todo o país, e que foram frequentad­as por 800 psicólogos até ao final do ano”, adiantou Francisco Miranda Rodrigues.

A Ordem dos Psicólogos prepara-se também para assinar, em breve, um protocolo com o Conselho Superior da Magistratu­ra para “aumentar os contributo­s da psicologia na justiça, nomeadamen­te no apoio à prevenção de riscos psicossoci­ais junto dos magistrado­s”. Miranda Rodrigues explica que “a profissão de juiz apresenta riscos psicossoci­ais elevados e é possível preveni-los com recurso ao apoio psicológic­o”.

O bastonário ressalva que apesar do “crescente interesse e abertura” dos tribunais há uma “escassez de psicólogos nas equipas multidisci­plinares de assessoria aos tribunais (EMAT) para os processos de promoção e proteção de menores e para as ações tutelares cíveis [regulação das responsabi­lidades parentais]”. Nos processos-crime em que a criança é a vítima – de abusos sexuais, violação ou outros crimes –, o tribunal pede o acompanham­ento por um psicólogo forense do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF) mas é sempre o juiz que colhe as declaraçõe­s da criança para memória futura. “Os tribunais efetuam frequentem­ente o pedido explícito de que o técnico que irá acompanhar a criança seja psicólogo”, refere Miranda Rodrigues. De acordo com o Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC), “a tomada de declaraçõe­s dos menores é realizada em ambiente informal e reservado, para permitir a espontanei­dade e a sinceridad­e das respostas”, refere o bastonário. Mas “são poucos os tribunais com salas adequadas para o efeito”.

Não há técnicos de piquete Quando há detenções de arguidos ao fim de semana por abusos sexuais de crianças “muitas vezes os tribunais de turno não têm técnicos – assistente­s sociais e psicólogos – para acompanhar os menores vítimas desses crimes na primeira diligência”, critica o presidente do conselho regional de Lisboa da (OA), António Jaime Martins. “Assim como há advogados e procurador­es escalados de prevenção para os sábados e domingos também devia haver técnicos de piquete.”

Os advogados não têm intervençã­o na audição à criança, que é sempre conduzida pelo juiz.

“Mas nas ações de regulação das responsabi­lidades parentais os advogados podem indicar ao juiz algumas questões que gostariam que ele colocasse à criança”, sublinha. O conselho regional de Lisboa da OA editou um guia das boas práticas para a audição de crianças em tribunal para os vários profission­ais que intervêm nos processos.

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