Diário de Notícias

O milésimo capítulo da lenda de Iker Casillas

FC Porto. Guarda-redes chega hoje aos mil jogos da carreira sénior. “Fez um trajeto magnífico e continua a ter muitíssima qualidade”, sublinha Juande Ramos, que o treinou no Real Madrid

- RUI MARQUES SIMÕES

“Vamos no autocarro para Bilbau quando [o treinador John] Toshack se aproxima do meu banco, senta-se e diz: ‘Estás tranquilo, rapaz? Amanhã vais jogar.’ Depois, levanta-se e vai-se embora. E eu penso: Madre mia!” O jovem Iker Casillas, que recordou anos mais tarde as emoções daquele fim de verão de 1999, não tinha razões para tanto nervosismo: era apenas o princípio de um percurso milenário. O guarda-redes espanhol do FC Porto faz hoje, na visita ao Belenenses (20.00, Sport TV1), o 1000.º jogo na carreira sénior. “Fez um trajeto magnífico e continua a ter muitíssima qualidade”, sublinha, ao DN, Juande Ramos, que o treinou no Real Madrid (2008-09).

O primeiro capítulo, a 12 de setembro de 1999, ficou gravado na memória de Iker Casillas: “Passei o dia com nervos a pensar ‘jogo na terceira divisão, perante 300 pessoas, e agora vou jogar na catedral de San Mamés, perante 50 mil’. Empatámos 2-2. Não gostei dos golos que sofri, mas voltei de lá contente.” Era “o dia mais importante” da sua vida desportiva, “o cumprir do sonho do menino que chegara ao Real Madrid” quase nove anos antes. O espanhol, então adolescent­e (tinha 18 anos), começava aí a lendária caminhada que hoje chega aos mil passos, em equipas principais: soma 725 jogos pelo Real Madrid, 167 pela seleção A de Espanha e 107 pelo FC Porto – com totais de 653 vitórias, 174 empates, 172 derrotas e 925 golos sofridos.

A marca é histórica: raros são os jogadores que podem gabar-se de chegar aos quatro dígitos de partidas a nível profission­al (o recorde são os 1374 encontros do inglês Peter Shilton). “Este número – mil jogos – mostra bem o que Iker conseguiu. Fez até aqui um trajeto magnífico, ao fim de muitos anos como futebolist­a profission­al. Tem muito mérito no que alcançou”, aponta Juande Ramos.

Sim, Casillas, agora com 36 anos, conquistou muito: um Mundial (2010), dois Europeus (2008 e 2012), três Ligas dos Campeões (1999-00, 2001-02 e 2013-14), duas Supertaças Europeias (2002 e 2014), uma Taça Interconti­nental (2002) e um Mundial de Clubes (2014), além de duas mãos-cheias de ligas e taças espanholas. “É um campeão, que tem algo de fora do normal. Ele, Cech e eu marcámos uma era no futebol contemporâ­neo”, elogiou, na semana passada, o italiano Gianluigi Buffon, um dos raros ícones que ombreiam com o espanhol no número de jogos (1044, já contando com o deste sábado com o Milan).

Referência no Real e na roja Ao todo, são já 19 temporadas ao mais alto nível. Após o batismo inesperado na liga espanhola, na visita ao Athletic Bilbao (devido a lesões de Illgner e Bizzarri), Iker Casillas logo agarrou o lugar na baliza do Real Madrid. Quatro dias depois, estreou-se na Liga dos Campeões (3-3 no terreno do Olympiacos) – onde hoje detém o recorde de partidas realizadas, 171. No final da época, fez o primeiro encontro pela seleção principal de Espanha (1-1 num jogo de preparação na Suécia) – da qual é agora o atleta com mais internacio­nalizações, 167.

Em ambas as casas, o rapaz de Móstoles (arredores de Madrid) impression­ou desde cedo. “Era um miúdo diferente: tinha qualidades inatas, mais desenvolvi­das do que as dos rapazes da sua idade, sempre um passo à frente dos restantes, com uma maturidade imprópria. Ao vê-lo treinar, podia imaginar-se tudo o que acabou por conquistar”, resumiu, anos mais tarde, à agência EFE, Manuel Amieiro, treinador de guarda-redes que acompanhou Iker, desde os 12 anos, no Real Madrid.

Passo a passo, San Iker tornou-se uma referência – e capitão de equipa – na roja e no Real Madrid, sobreviven­do a todos os altos e baixos da equipa madrilena neste início de século. “Foi fantástico trabalhar com ele. É um profission­al do mais alto nível, que demonstra as suas qualidades no dia-a-dia”, resume Juande Ramos, recordando a sua breve passagem pelo comando do emblema blanco. No FC Porto “no bom caminho” Após perder espaço no Real Madrid (desde a passagem de Mourinho pelo comando técnico do clube), Iker Casillas trocou o Santiago Bernabéu pelo Estádio do Dragão no verão de 2015. Estreou-se a 15 de agosto, numa vitória caseira sobre o V. Guimarães (3-0). E, apesar da perda temporária da titularida­de para José Sá, durante parte desta época, já entrou no lote restrito de dez guarda-redes com mais de cem jogos de dragão ao peito – encabeçado por Vítor Baía (566), Helton (334) e Barrigana (324).

Até aqui, têm faltado os troféus. Mas nesta época o FC Porto segue lançado na I Liga e na Taça de Portugal. “Fico feliz que ele esteja a jogar e que esteja no bom caminho para voltar a ganhar títulos”, afirma Juande Ramos.

Depois, ficaria a faltar o regresso à seleção (que não representa desde a fase de preparação do Euro 2016), quiçá para uma despedida da ribalta no Mundial 2018. “Estando a jogar, é possível”, diz Juande, “mas a decisão cabe a Julen Lopetegui” – o selecionad­or espanhol e ex-treinador do FC Porto, que ajudou a tornar o Dragão uma das últimas etapas da carreira milenária de Iker Casillas.

Manuel Amieiro, que acompanhou Iker desde os 12 anos, diz que “ao vê-lo treinar, podia imaginar-se tudo o que acabou por conquistar”

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