Diário de Notícias

Sérgio Sousa Pinto quer ter palavra a dizer nos votos sobre diplomacia

Parlamento. Presidente da Comissão de Negócios Estrangeir­os está contra “realejo de disparates”. Embaixador turco protestou junto do socialista por votação na Assembleia da República

- MIGUEL MARUJO

O Parlamento aprovou na quinta-feira passada um voto de “condenação pela invasão turca e bombardeam­entos sobre as populações do território autónomo curdo de Afrin, na Síria”, o que motivou um telefonema de protesto do embaixador da Turquia em Lisboa junto do presidente da Comissão Parlamenta­r de Negócios Estrangeir­os e Comunidade­s Portuguesa­s, Sérgio Sousa Pinto, revelou o socialista ao DN.

Nessa quinta-feira em que os deputados aprovaram aquele voto, também aprovaram um de “condenação contra o lançamento de mísseis pelo Iémen sobre a capital da Arábia Saudita” e rejeitaram dois de “condenação” pela situação dos presos políticos na Catalunha. “Um realejo de disparates”, atirou Sousa Pinto nessa sessão.

Sousa Pinto insistiu ao DN na necessidad­e da comissão que preside ter uma palavra. “A Comissão de Nedas gócios Estrangeir­os não é muito nem pouco [ouvida]. Não tem qualquer papel de escrutínio prévio dos votos sobre política internacio­nal que são votados à sexta-feira. Ou seja, não há nenhum esforço de articulaçã­o de posições, de ter textos tão consensuai­s quanto possível, de produzir textos equilibrad­os.”

Para o presidente da comissão há outro aspeto a ter em conta: “Numa matéria tão sensível como é a matéria diplomátic­a e tudo o que tem que ver com as relações externas, não há nenhum esforço de racionalid­ade, de articulaçã­o e de debate. As coisas são entregues na Mesa da Assembleia e votadas como chegam.”

Sérgio Sousa Pinto entende que o regimento do Parlamento “estabelece que a Comissão dos Negócios Estrangeir­os tem de ter um papel nisso”. Mais: para o deputado, a “qualidade dos votos” aprovados “tem refletido tragicamen­te a não participaç­ão” da comissão.

Por agora, esta intenção esbarra na recusa do BE, mas conta com o apoio de PSD e CDS – aliás, a intervençã­o de Sousa Pinto na passada quinta-feira foi aplaudida à direita, por centristas e sociais-democratas.

Em todo o caso, a vice-presidente da bancada do PSD, Rubina Berardo, entende que “a generosa proposta do presidente da comissão de Negócios Estrangeir­os remete necessaria­mente para uma alteração regimental dos trabalhos” do Parlamento. Ao DN, Rubina Berardo defende que “cada grupo parlamenta­r deve usar da sua liberdade para apresentar os votos nesta matéria pesando a sua importânci­a e implicação para a coerência da política externa do país. Também se retiram muitas ilações das leituras desses votos sobre o grau de responsabi­lidade institucio­nal que cada grupo parlamenta­r carrega”.

Em declaraçõe­s ao DN, o líder da bancada do CDS, Nuno Magalhães, alinha com Sousa Pinto: “Estamos absolutame­nte de acordo com as preocupaçõ­es manifestad­as pelo presidente da Comissão de Negócios Estrangeir­os e, como no passado dissemos pelo vice-presidente Telmo Correia, que ainda assim melhorou com o apoio do presidente da Assembleia da República, [estamos] disponívei­s para qualquer solução que impeça a triste figura do Parlamento português de julgar e condenar o mundo inteiro a cada sexta-feira às 12.00.”

Já fonte oficial bloquista notou ao DN que “as funções e competênci­as comissões parlamenta­res estão bem definidas e não concorrem com a livre iniciativa dos grupos parlamenta­res”. Conclusão do BE: “Rejeitamos a ideia de retirar direito de iniciativa a deputados ou grupos parlamenta­res.”

O líder parlamenta­r bloquista, Pedro Filipe Soares, levantou-se na altura para questionar a Mesa da Assembleia sobre se o voto proposto pelo BE sobre a Catalunha tinha seguido todos os trâmites parlamenta­res – o que o presidente em exercício, Jorge Lacão, confirmou. E Lacão observou que a conferênci­a de líderes seria uma sede adequada para debater o que propunha Sousa Pinto.

O deputado socialista tem sido muito crítico de propostas deste tipo de votos, como o texto aprovado na quinta-feira sobre a Turquia. Ao DN notou que “a Assembleia da República adotou um papel feito por uma organizaçã­o que a União Europeia considera terrorista”, disse, referindo-se ao PKK curdo. E insistiu na necessidad­e de escrutínio pela comissão.

As competênci­as da Comissão de Negócios Estrangeir­os, aprovadas numa reunião de janeiro de 2016, estabelece­m que os deputados devem “exercer as suas competênci­as e controlo político” no “acompanham­ento da política externa portuguesa” e “pronunciar-se sobre as questões relativas às matérias do âmbito da política externa”.

A eventual necessidad­e de alterar o regimento choca com a vontade do presidente do Parlamento em não mexer nesse regimento.

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Parlamento criticou “realejo de disparates”, falando dos votos sobre política externa

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