O efeito borboleta de ajudar estudantes de países em conflito Marcelo Rebelo de Sousa condecorou Sampaio pelo trabalho que este fez para trazer estudantes sírios a Portugal
Plataforma criada por Jorge Sampaio, que trouxe mais de cem alunos sírios a Portugal, quer globalizar o conceito. Marcelo condecorou o antigo Presidente da República
Mariam Eissa, 29 anos, já terminou o mestrado em Engenharia Civil, na Universidade do Minho, e está a fazer uma pós-graduação em Arquitetura. Chegou em 2014, através da Global Platform for Syrian Students (GP4SYS), lançada pelo ex-Presidente Jorge Sampaio, na primeira geração de um projeto que já abrange uma centena de estudantes, 44 dos quais com mestrados concluídos, e que pretende agora influenciar o mundo.
Muçulmana, Mariam, cujo nome significa “Maria Jesus” em português –- “Cristo é muito importante para nós” – conta não ter sentido dificuldades de adaptação ao país. “Venho de uma pequena cidade nos subúrbios de Damasco e gosto muito de Guimarães. As pessoas são muito simpáticas. Mesmo sendo muçulmana, e usando um lenço tradicional, nunca me senti tratada de forma diferente.” No futuro, diz, “o plano é voltar para a Síria e incorporar” o que aprendeu . Mas, com a guerra ainda em curso, “esse plano está um pouco em suspenso. Enquanto estiver aqui, espero poder trabalhar em investigação nas universidades”, explica.
Mais tarde, perante uma plateia composta por chefes de Estado, príncipes e princesas, o presidente da Liga Árabe, dirigentes de grandes fundações, esta aluna há de contar que ultimamente se tem interessado pela teoria do caos, em particular pelo efeito que o bater das asas de uma borboleta pode ter do outro lado do planeta. “Talvez seja como a decisão que foi tomada há quatro anos, numa sala como esta, de trazer estudantes sírios. Influenciou as vidas desses alunos, as vidas das suas famílias e de muitos à volta destas.”
É também este o sentimento de Rand Askar, 25 anos, que terminou há duas semanas o curso de Arquitetura, também em Guimarães, e está agora “à procura de oportunidades para fazer investigação na área da reconstrução pós-guerra”. No seu caso, admite esta aluna, a adaptação não foi tão simples. “São culturas muito diferentes. Tivemos algumas dificuldades de integração no início”, reconhece. Mas o facto de, ao fim de três anos, se exprimir num português quase perfeito, e de também ter em Portugal a irmã a estudar, mostra que a transição foi bem-sucedida. “Hoje sinto-me bem aqui.” Um prémio e várias promessas A analogia da borboleta terá agradado particularmente a Sampaio que, com a conferência de ontem, na Gulbenkian, pretendia sobretu- do dar asas à ideia que lançou há quatro anos. Nomeadamente através do Rapid Response Mechanism for Higher Education in Emergencies (RRM), uma “iniciativa global” que pretende multiplicar projetos como o da GP4SYS, através de ideias simples como “uma vaga por instituição do ensino superior” ou um “mecanismo de solidariedade entre estudantes” em que cada um dos 230 milhões de alunos do superior do mundo é desafiado a ajudar o programa com um euro. Hoje, entre 22,5 milhões de deslocados que poderiam estar a frequentar o superior, só 1% tem essa hipótese.
Menos importante para o antigo Presidente seria o reconhecimento do seu trabalho nestes anos. Mas o atual chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa, que fechou a conferência, fez questão de lho dar, através da Grande Ordem do Infante D. Henrique. O que Sampaio fez, justificou, “foi o começo de um longo percurso”. Já do governo, de António Costa aos ministros do Superior e dos Negócios Estrangeiros, veio a promessa de “todo o apoio” na divulgação internacional.