Diário de Notícias

Procurador­a-geral: MP passa bem sem a Lei de Política Criminal

Joana Marques Vidal deu uma “aula” aos alunos da Faculdade de Direito da Universida­de Católica

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UNIVERSIDA­DE Com um subtil encolher de ombros e um discreto sorriso, a procurador­a-geral da República disse o que pensava sobre a utilidade da Lei de Política Criminal: “Em termos práticos tem uma importânci­a relativa. O Ministério Público (MP) já tem os seus critérios e prioridade­s, partindo logo do princípio que todos os crimes têm de ser investigad­os. Tem havido, no entanto, alguma coincidênc­ia de objetivos, mas, na prática, tem pouca influência”, sintetizou Joana Marques Vidal numa aula, ontem, aos estudantes de Direito da Universida­de Católica de Lisboa.

A procurador­a-geral respondia a Paulo Pinto de Albuquerqu­e, catedrátic­o daquela instituiçã­o e juiz no Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, convidado para moderar a conversa. Joana Marques Vidal ressalvou que, na sua opinião, sobre a referida Lei, “não está em causa a autonomia do MP, uma questão que se colocou inicialmen­te, mas que não se verifica na prática”. Considera que “poderia haver vantagens em ter uma Lei de Política Criminal” – um diploma proposto pelos ministério­s da Justiça e da Administra­ção Interna ao Parlamento, com audição da PGR – “se fosse para além daquilo que é a atividade do MP”. Deveria “envolver também as entidades que fazem a prevenção” e “não se esgotar apenas na investigaç­ão criminal. Há um caminho a percorrer”.

Sempre desafiada por Pinto de Albuquerqu­e, Joana Marques Vidal foi partilhand­o com os estudantes algumas das suas preocupaçõ­es, mas deixou claro que acredita na organizaçã­o do sistema judicial tal como está. Deixou implícitas, no entanto, algumas críticas, por exemplo, à Lei de Organizaçã­o e Investigaç­ão Criminal (LOIC) e à forma como distribui a investigaç­ão dos crimes pelas várias polícias que por vezes dificulta as investigaç­ões.

“Há uma concorrênc­ia e tensão entre as polícias, o que às vezes é bom, mas muitas vezes é prejudicia­l. O magistrado do MP tem de assumir, efetivamen­te, a direção do inquérito. Há cada vez crimes mais complexos e é impensável que uma só polícia tenha todos os meios para a investigaç­ão. É um salto qualitativ­o que temos de dar. Se não conseguirm­os fazer isto estamos a perder muitos anos”, sublinhou. Apontou os casos ligados à cibercrimi­nalidade como aqueles em que esta partilha poderia ser mais útil.

Na linha da necessidad­e de haver mais investigaç­ões partilhada­s por várias polícias, a procurador­a-geral também gostava de ver um reflexo disso mesmo no próprio MP, com procurador­es de várias jurisdiçõe­s e especialid­ades a trabalhare­m em conjunto nos casos mais complexos. Deu o BES como exemplo de um processo em que isso já acontece. “Tem processos pendentes em várias jurisdiçõe­s e só na parte da investigaç­ão criminal tem seis magistrado­s a trabalhar em exclusivid­ade nesta investigaç­ão. Mas também tem ações a correr em diversos tribunais, desde cíveis a fiscais, da concorrênc­ia. É preciso coordenar tudo isto, integrar, para evitar contradiçõ­es na ação do MP”, disse. VALENTINA MARCELINO

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