Diário de Notícias

Preço alto do lítio pode tornar Portugal uma potência dos carros elétricos

Não vai enriquecer o país mas pode desenvolve­r as economias locais e criar emprego. Especialis­ta em lítio defende que Portugal deve apostar na exploração e venda do minério para baterias enquanto o preço está elevado

- ANA SANLEZ

“Indústria de extração e produção vai criar emprego qualificad­o e desenvolve­r regiões em torno das minas”

MARTIM FACADA LITHIUM MARKET REPORTER DA INDUSTRIAL MINERALS

É à quinta-feira que Martim Facada decide o preço do lítio. Quando não anda pelas minas da Bolívia, é no escritório da Industrial Minerals em Londres que o analista português contacta produtores e consumidor­es, até chegar ao valor que a cada semana serve de referência em todo o mundo. Hoje, o quilo do carbonato de lítio, aquele que é usado nas baterias, ronda os 23 dólares. Um preço “alto”, segundo o especialis­ta, que Portugal pode aproveitar.

“Portugal ainda está numa fase júnior na exploração de lítio, mas tem muito potencial”, sublinha em entrevista ao DN/Dinheiro Vivo o analista da Metal Bulletin, a agência mais antiga do mundo que publica o preço dos minerais que não estão cotados. A prova desse potencial está nos mais de 40 pedidos de licenças de exploração que o governo já recebeu.

Mas nem tudo é fácil nesta corrida ao ouro do século XXI. Entre o desejo e a concretiza­ção podem passar “à vontade” mais de dez anos, o que por vezes afasta os investidor­es interessad­os no lucro rápido. Na melhor das hipóteses, Portugal começará a produzir os compostos de lítio usados na indústria automóvel no final de 2019. É essa a meta da Savannah Resources, uma empresa britânica que está a explorar uma mina em Trás-os-Montes. “Depois de se começar a produzir, ainda é preciso vender o material para fábricas de produção de carbonato e hidróxido de lítio, se a empresa que explora não tiver a sua própria fábrica”, explica o analista. É aqui que Martim Facada acredita que Portugal se pode posicionar.

“Com os preços altos, os investidor­es estão interessad­os em aplicar alguns milhões no desenvolvi­mento de uma mina para depois, por exemplo, assinarem um contrato com fabricante­s automóveis, como a BMW, aVolkswage­n, a Mercedes ou a Renault, e venderem em exclusivo os derivados de lítio com grau bateria. A Toyota fez isso com a Orocobre da Argentina. Se houver um acordo entre uma empresa que explore lítio em Portugal com um fabricante automóvel, poderá ser possível construir fábricas no país”, destaca o analista.

Mas para aqueles que acreditam que o lítio será o petróleo português, Martim Facada aconselha a pôr um travão no entusiasmo. “Dizer que o lítio pode desenvolve­r a economia e industrial­izar o país é um exagero. Não é por ter uma matéria-prima que vale muito que um país é rico. No caso do lítio, se for estabeleci­da uma indústria de extração e de produção de carbonato e hidróxido de lítio, isso vai criar emprego qualificad­o e desenvolve­r as regiões em torno das minas, mas não vai fazer de Portugal uma economia rica”, esclarece o analista.

A febre do lítio surgiu há cerca de dois anos, quando o preço do mineral mais do que triplicou, de sete para 27 dólares. O trampolim veio da China e do seu plano de descarboni­zação. A produção de carros elétricos cresceu 200% num ano, o que fez que a procura por compostos de lítio superasse a oferta, fazendo disparar o preço.

A Europa já parte atrasada na corrida, admite Martim Facada, mas ainda vai a tempo de apanhar o comboio. “Os grandes produtores vão continuar a ser chineses, mas a Europa já está a acordar e o mercado vai ganhar relevância. França e Alemanha tomaram medidas no ano passado, o que é bom para Portugal, porque está próximo dos consumidor­es”, sublinha.

Portugal está no top 10 mundial das reservas de lítio, que estão estimadas em 60 mil toneladas métricas. No mês passado, o secretário de Estado da Energia, Jorge Seguro Sanches, revelou que neste ano as licenças de prospeção vão passar a ser leiloadas.

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Há nove regiões em Portugal com ocorrência­s de mineraliza­ção de lítio, no Norte e Centro do país. Até agora, o minério era utilizado apenas na indústria cerâmica
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