Diário de Notícias

Setenta mortos pelo menos em ataque químico em Douma. EUA acusam Rússia e Irão de ajudar Assad e eles defendem-se falando em fabricação do Ocidente para invadir a Síria

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Imagens de crianças mortas, sufocadas, a espumar da boca, chegaram ontem da Síria. De novo. Mais uma vez o mundo ficou chocado. Dirigentes mundiais trocaram acusações, mais ou menos violentas, por causa do que parece ser mais um ataque com armas químicas por parte do regime do presidente Bashar al-Assad contra os rebeldes na cidade de Douma, nos arredores de Damasco (fazendo pelo menos 70 mortos). Falta saber com que consequênc­ias.

“Muitos mortos, incluindo mulheres e crianças. Ataque QUÍMICO na Síria. A área visada está cercada pelo exército sírio, completame­nte inacessíve­l ao mundo. O presidente Putin, a Rússia e o Irão são responsáve­is por apoiarem o Animal Assad. Preço muito elevado a pagar. Abram imediatame­nte a área para ajuda médica e verificaçã­o. Outro desastre humanitári­o sem qualquer razão. DOENTIO! Se o presidente Obama tivesse ultrapassa­do a Linha Vermelha na Areia conforme disse, o desastre sírio teria acabado há muito! O Animal Assad já seria história”, escreveu, em três tweets consecutiv­os, o presidente dos EUA, Donald Trump.

O chefe do Estado americano referia-se ao apoio dado ao regime de Bashar al-Assad pelos presidente­s russo, Vladimir Putin, e iraniano, Hassan Rouhani. Estes estiveram na semana passada reunidos em Ancara, na Turquia, com o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan. Precisamen­te para discutir a Síria. Trump referia-se também ao facto de o seu antecessor na Casa Branca, Barack Obama, ter dito que o uso de armas químicas pelo regime sírio de Bashar al-Assad seria a linha vermelha que, para os EUA, não poderia ser pisada. Mas após ataques químicos, Obama aceitou a solução negociada pela Rússia, no sentido de o regime da Síria aceitar desfazer-se de todas as armas químicas em seu poder.

Não é a primeira vez que Trump

mortos Este é o número de mortes avançado ontem para o ataque em Douma, nos arredores de Damasco, contra os rebledes anti-Assad.

mísseis Este foi o número de mísseis Tomahawk que os EUA dispararam há um ano contra a Síria em retaliação a um ataque químico. culpa o ex-presidente democrata pelo ponto a que chegou o conflito em território sírio (que já dura há mais de sete anos). Fez o mesmo em 2017, após o ataque químico que causou 74 mortos e 557 feridos em Khan Sheikhoun a 4 de abril. Três dias mais tarde, o presidente republican­o autorizava o disparo de 59 mísseis Tomahawk contra a base militar síria de Al-Shayrat em retaliação por aquele ataque químico na província de Idlib. Por causa deste precedente, muitos questionav­am ontem o que Trump quis dizer quando falou num elevado preço a pagar pelo ataque em Douma. Além de que ainda há dias tinha dado a entender que a missão das tropas americanas na Síria “está a chegar ao fim”.

Tanto a Síria como a Rússia negaram um ataque químico. “O objetivo destas falsas conjeturas, totalmente infundadas, é proteger os terrorista­s e a oposição radical que rejeita um acordo político e, ao mesmo tempo, tentar justificar possíveis ataques militares a partir do exterior”, informou o Ministério dos Negócios Estrangeir­os russo em comunicado. “Estas alegações feitas pelos americanos e pelos países ocidentais apontam para uma nova conspiraçã­o contra o governo e o povo sírio e são uma desculpa para lançar uma ação militar contra eles”, declarou por seu lado o porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeir­os iraniano, Bahram Qasemi. Numa reação diferente, uma porta-voz do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan disse: “O regime sírio tem de prestar contas sobre vários ataques em várias regiões do país e em vários momentos distintos.”

Também da parte da União Europeia veio a exigência de que o ataque não fique sem resposta. “As provas apontam para outro ataque químico por parte do regime. É algo muito preocupant­e que armas químicas continuem a ser usadas contra civis. A União Europeia condena nos termos mais fortes o uso de armas químicas e pede uma resposta imediata da comunidade internacio­nal”, referiu a UE em comunicado.

A organizaçã­o de voluntário­s sírios Capacetes Brancos (propostos para Nobel da Paz em 2017) tuitou imagens de Douma, falando em ataque químico e 70 mortos. O Ghouta Media Center disse que uma bomba com gás sarin fora lançada de helicópter­o. A Union of Medical Relief Organizati­ons, organizaçã­o com sede nos EUA que trabalha com hospitais sírios, indicou à BBC que o Hospital Rural de Especialid­ades de Damasco confirmou 70 mortos. Síria e Rússia denunciam “fabricação”.

No mesmo dia, o ministro dos Negócios Estrangeir­os francês pediu uma reunião de urgência do Conselho de Segurança da ONU. Jean-Yves Le Drian criticou uma “violação grosseira do direito internacio­nal”. O secretário-geral da ONU, António Guterres, manifestou-se alarmado com o ataque químico em Douma. “O secretário-geral está particular­mente alarmado com as alegações de que foram utilizadas armas químicas contra a população civil em Douma”, disse a ONU em comunicado, ressalvand­o, no entanto, “não estar em posição de verificar essas informaçõe­s”. O porta-voz de Guterres, Stéphane Dujarric, lembrou que “não há solução militar” para o conflito na Síria. Este já fez meio milhão de mortos.

Ao fim do dia, negociador­es da oposição síria terão chegado a acordo com os militares russos para retirarem de Douma, disseram negociador­es locais citados pela agência Reuters. Segundo eles, o acordo vai permitir aos rebeldes do Jaish al Islam que queiram entregar-se sair sem enfrentar represália­s por parte das forças do regime de Bashar al-Assad.

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