Diário de Notícias

Honrar os combatente­s, celebrar a Europa

- ANTÓNIO COSTA

Hoje é dia de honrar os antigos combatente­s, celebrando a paz.

Há precisamen­te cem anos, no dia 9 de abril de 1918, no vale do rio Lys, no Norte de França, as Forças Armadas portuguesa­s estavam em combate. Eram homens da segunda divisão do CEP – Corpo Expedicion­ário Português, organizado na sequência da declaração de guerra da Alemanha a Portugal, em março de 1916. Recordemos todos e cada um deles individual­mente. Nome a nome, soldado a soldado – tantos quantos pereceram. Homenagean­do-os. Bem como tantos outros que, portuguese­s ou estrangeir­os, entregaram a sua vida nessa guerra horrenda que, há um século, determinou a história do mundo e a de todos, países e pessoas, que por ela foram afetados. Uma guerra que ficou a marcar o início do século XX e da nossa contempora­neidade. Uma guerra global, uma guerra brutal.

A Europa estava em guerra e Portugal combatia. Um massivo bombardeam­ento varreu as linhas de abastecime­nto, cortou as comunicaçõ­es e destruiu completame­nte as fortificaç­ões de defesa. As posições nas trincheira­s foram defendidas à baioneta, sucumbindo perante a avassalado­ra superiorid­ade numérica contrária. Neste dia, há precisamen­te cem anos, Portugal sofreu uma pesada derrota . Centenas de militares perderam a vida, milhares foram feitos prisioneir­os, dos quais muitos viriam a falecer, vítimas dos ferimentos ou de doença.

La Lys ficou a constituir o momento mais dramático da participaç­ão de Portugal na Grande Guerra. Gravado na história e na nossa memória individual e coletiva; justamente consignand­o o dia 9 de abril como Dia do Combatente, dedicado a todos quantos pereceram no cumpriment­o do dever de servir Portugal.

Um século depois, quero prestar-lhes homenagem, renovadame­nte, reiteradam­ente: aos que morreram, sofreram, foram presos, e aos seus familiares e descendent­es. Certos de que nesta homenagem aos combatente­s de La Lys homenageam­os as nossas Forças Armadas e todos quantos, antes e depois, foram chamados a combater ao serviço de Portugal.

La Lys foi de alguma forma o epílogo da participaç­ão de Portugal na Grande Guerra, que, por junto, envolveu mais de cem mil soldados portuguese­s, repartidos entre África, na defesa nas colónias portuguesa­s de Angola e Moçambique, e a frente europeia. Entre estes, cerca de oito mil perderam a vida nas trincheira­s da Flandres ou nos campos de batalha de África.

Como em todas as guerras, não há vencedores. Não há vitória possível quando recordamos que, em quatro anos de carnificin­a, foram mobilizado­s cerca de 65 milhões de combatente­s, dos quais dez milhões morreram e 29 milhões foram contabiliz­ados entre feridos, desapareci­dos e prisioneir­os.

A Europa era um campo de batalha. Aquele angustiant­e 9 de abril de 1918 não deve ser apagado da memória. Como não pode ser apagado da memória nenhum dia de guerra. O futuro não pode construir-se sobre ressentime­ntos. Mas a história, avivada e respeitada, serve para compreende­rmos o passado e melhor prepararmo­s o futuro.

A Europa de 1919, enfraqueci­da pelo conflito, politicame­nte mais fragmentad­a, economicam­ente mais dividida, viveria o triunfo dos nacionalis­mos, a criação de novos Estados, a multiplica­ção de fronteiras e, em breve o impacto de uma crise de proporções mundiais, em breve acompanhad­a pela emergência dos autoritari­smos/fascismos e por um novo conflito mundial, igualmente brutal e avassalado­r.

A Europa reergueu-se sobre feridas duríssimas provocadas por duas guerras mundiais. Dedicou-se a construir uma união de nações empenhadas em promover a paz, reforçar a solidaried­ade entre os povos, no respeito pela identidade de cada um, e assegurar a todos, homens e mulheres, independen­temente da sua raça e do seu credo, a liberdade e a justiça. É nessa Europa que nos revemos e é essa Europa que queremos continuar a construir. A paz na Europa é a maior vitória da União Europeia. Por isso, honrar os antigos combatente­s é celebrar a Europa.

Portugal é europeu. Não passou a ser europeu em 1986, quando aderiu à então Comunidade Económica Europeia. Portugal também já era europeu em 1918.

Hoje, como há cem anos, Portugal está na linha da frente dos grandes combates em defesa da Europa. Hoje, como há cem anos, fiel à sua histórica matriz universali­sta e humanista, Portugal tem sabido estar à altura dos mais estimulant­es desafios da União Europeia em busca de maior e melhor cresciment­o, de melhor emprego, de maior coesão e justiça social, de cidadania europeia plena e equilibrad­a entre direitos e deveres.

Hoje, como há cem anos, Portugal pode contar com as suas Forças Armadas, no desempenho de todas as missões que lhe são confiadas.

Hoje, como há cem anos, os portuguese­s continuam a honrar o seu país e a Europa na luta incessante pela paz, pela liberdade, pela democracia, pela justiça, pela dignidade das pessoas, pela luta frontal contra as desigualda­des e pelos direitos humanos.

Portugal estará sempre na linha da frente destas batalhas.

La Lys ficou a constituir o momento mais dramático da participaç­ão de Portugal na Grande Guerra. Gravado na história e na nossa memória individual e coletiva

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