Diário de Notícias

Lula acusa juiz Moro de ter “mente doentia”. Esquerda já tem candidatos

Ex-presidente diz que o coordenado­r da Lava-Jato é obcecado pela mentira. No primeiro dia na cadeia viu o jogo do seu clube

- JOÃO ALMEIDA MOREIRA, São Paulo

“Moro tem uma mente doentia, é uma alucinação, uma doença, uma obsessão pela mentira que não tem limite”, disse Lula da Silva em vídeo publicado ontem à tarde nas redes sociais, mas gravado horas antes de se entregar à polícia na noite de sábado. Na entrevista dada a frei Betto, padre franciscan­o muito próximo do antigo presidente desde os tempos do sindicalis­mo em São Bernardo do Campo, o político diz que se sente muito menos nervoso hoje do que quando foi detido há 38 anos ainda no período da ditadura militar. “A minha prisão é o sonho de consumo dele”, conclui.

Sergio Moro, que condenou Lula a nove anos e meio de prisão, pena agravada em segunda instância para 12 anos e um mês, por posse de um apartament­o triplex oferecido por uma construtor­a beneficiad­a no escândalo do petrolão, não comentou as declaraçõe­s tornadas públicas no primeiro dia de cumpriment­o de pena do antigo presidente. Lula passou a noite numa cela no quarto andar do edifício da superinten­dência da polícia federal, que ele próprio inaugurou como presidente em 2007, com direito a casa de banho privativa, cama de solteiro, mesa, cadeira e duas janelas com vista para o interior do prédio.

Dormiu mal, segundo relatos de agentes, e almoçou, por volta das 11.00, um prato de carne, com arroz, feijão, massa e salada. À partida, Lula não teria acesso a televisão mas logo ao primeiro dia de prisão foi aberta uma exceção para que ele, corintiano fanático, pudesse assistir ao Palmeiras-Corinthian­s, da segunda mão da final do campeonato estadual paulista. A paixão de Lula pelo popular Timão é tanta que chegou a estar em cima da mesa nas negociaçõe­s com a polícia federal a sua rendição só após a final. E o Corinthian­s sagrou-se campeão.

A chegada de Lula à prisão em Curitiba na madrugada de domingo não foi pacífica: à entrada do edifício da polícia estavam claques pró e contra o líder do PT que se envolveram em confrontos de que resultaram nove feridos. A polícia, para os conter, usou fumos, aumentando a agitação. Ao longo da tarde de ontem, os agentes fecharam quatro ruas em redor do local para conter a violência. A única movimentaç­ão registada nas imediações foi a de refeições e café entregues na receção do prédio. As manifestaç­ões de apoiantes de Lula mais próximas eram a mais de 700 metros da cela. Mas 40 autocarros com membros de movimentos sindicais e sociais ligados ao PT são esperados nas próximas horas para iniciar uma vigília.

Ainda no sábado à noite, nas instalaçõe­s da polícia de São Paulo, onde o detido realizou exames de rotina, tinha havido registo de incidentes: ao mesmo tempo que jovens de camisa encarnada, a cor do PT, choravam comovidos, outros abriam garrafas de espumante, em celebração, gerando tumultos. O primeiro desacato da véspera da detenção, porém, verificou-se entre militantes do PT na sede do sindicato, à saída do antigo presidente do local: enquanto uns queriam apenas despedir-se de Lula, outros bloquearam a sua saída gerando um impasse de duas horas. Fundado em São Paulo e com sede em Brasília, o PT vai nos próximos meses mudar-se para Curitiba, para estar simbolicam­ente mais perto do seu líder espiritual. Por decisão da presidente do partido, a senadora Gleisi Hofmann, a próxima reunião partidária já vai ser na capital do Paraná. A imprensa brasileira, por outro lado, especula sobre o vazio de poder no PT – ou excesso de candidatos a ocupá-lo – com a detenção de Lula.

Ainda na sequência dos episódios do dia da detenção, a associação brasileira de procurador­es considerou “delirantes” as acusações de Lula, em discurso no palanque em frente ao Sindicato dos Metalúrgic­os do ABC, contra a justiça do Paraná. Pelo contrário, Dilma Rousseff, elogiada por Lula nesse discurso pelo seu trabalho enquanto ministra do seu governo, emitiu nota a considerar o companheir­o de partido “um preso político”.

Preso político ou não, em tese, Lula pode concorrer às eleições: embora considerad­o “ficha suja”, isto é, condenado em segunda instância e por isso inelegível à luz da lei eleitoral, só a partir do dia 15 de agosto a sua candidatur­a será apreciada. Caso seja recusada, Lula pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal. Se não houver decisão antes da data da eleição, será candidato.

À partida, Lula não teria acesso a televisão, mas foi aberta uma exceção para que pudesse ver o Corinthian­s a sagrar-se campeão contra o Palmeiras

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Apoiantes e críticos de Lula em frente à prisão em Curitiba, na noite em que o ex-presidente foi preso
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