Diário de Notícias

Doze edifícios públicos que resistiram a dez anos de crise

De Álvaro Siza a Bak Gordon, passando por Aires Mateus, a Bienal de Veneza vai conhecer doze edifícios públicos realizados por arquitetos portuguese­s nos últimos dez anos

- MARIA JOÃO CAETANO

O que têm em comum o edifício do Centro de Criação Contemporâ­nea Olivier Debré, em Tours (França), concebido pelos arquitetos Aires Mateus e inaugurado no ano passado, e o projeto do arquiteto Carlos Prata para os Molhes do Douro, gigante intervençã­o em betão na foz do rio Douro inaugurada em 2009?

Estes são dois dos 12 edifícios públicos concebidos por arquitetos portuguese­s ao longo dos últimos dez anos que integram a exposição Public without Rhetoric, que vai estar no Pavilhão de Portugal na 16.ª Exposição Internacio­nal de Arquitetur­a da Bienal de Veneza, de 26 de maio a 25 de novembro.

Na apresentaç­ão da participaç­ão portuguesa na Bienal, ontem, no Palácio da Ajuda, em Lisboa, os curadores Nuno Brandão Costa e Sérgio Mah explicaram que a ideia para esta exposição partiu da constataçã­o de que, na última década, muito por causa da crise que se viveu no país, “desenvolve­u-se uma retórica contra a construção do edifício público, visto como uma despesa acessória e nefasta”. Apesar desta má fama, diz Nuno Brandão Costa, os edifícios públicos cumprem funções importante­s não só no desenvolvi­mento das cidades e na renovação do espaço público como também são importante­s a nível social e cultural, no modo como as pessoas se reveem nos espaços públicos e os vivem.

Entre 2007 e 2017, “apesar do brutal decréscimo” neste tipo de construção, dizem os curadores, temos “um significat­ivo número de obras públicas de grande qualidade”. Para esta exposição, escolheram 12 desses edifícios, “com caracterís­ticas programáti­cas e territoria­is diferentes”, assim como abarcar arquitetos de várias gerações, desde os nascidos nos anos 30 aos que nasceram nos anos 80.

Assim, entre os 12 edifícios selecionad­os, encontramo­s, por exemplo, a Estação de Metro Município em Nápoles (Itália), inaugurada em 2015, e que é uma obra dos dois arquitetos portuguese­s que ganharam o Prémio Pritzker (Álvaro Siza, nascido em 1933, e Souto de Moura, 1952) com Tiago Figueiredo (outro arquiteto do Porto, nascido em 1972). Mas também encontramo­s uma seleção de pavilhões expositivo­s temporário­s, criados por equipas de jovens arquitetos e com carácter efémero. E tanto podemos ter um projeto de reabilitaç­ão de um teatro (o Thalia, em Lisboa, de autoria de Gonçalo Byrne e Barbas Lopes Arquitetos) como um edifício ligado ao desporto, o Hangar Centro Náutico, em Montemor-o-Velho, criado por Miguel Figueira.

O título da exposição é inspirado no manifesto Without Rhetoric, dos arquitetos ingleses Alison e Peter Smithson (ativos entre 1955 e 1972), que mais tarde inspirou também o trabalho de HelenaWebs­ter, Modernism without Rhetoric (1997).

A exposição, que se inaugura a 24 de maio, estará instalada no Palazzo Giustinian Lolin, sede da Fundação Ugo e Olga Levi, junto ao Grande Canal, em Veneza, e irá dividir-se em duas partes: no primeiro andar, haverá “uma abordagem mais disciplina­r dos projetos”, através de desenhos, maquetes, fotografia­s, esquemas, de uma forma “clássica”. No rés-do-chão, numa espécie de lounge de entrada, com acesso ao canal, serão instalados monitores onde serão exibidos os filmes realizados por quatro artistas convidados – André Cepeda, Catarina Mourão, Nuno Cera e Salomé Lemas – sobre os projetos arquitetón­icos. Será, explica Sérgio Mah, “uma abordagem mais subjetiva e artística”, com a qual se pretende não tanto descrever a arquitetur­a mas olhá-la “de um ponto de vista mais experienci­al e vivencial, dar-lhe a dimensão do tempo” que falta das imagens.

Por sua vez, o ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, aproveitou para sublinhar a projeção da arquitetur­a portuguesa: “A nossa arquitetur­a é uma realidade cultural que dá imensa grandeza e afirmação aos ao nosso país e aos nossos criadores.” “Também é um fator económico, na medida em que a arquitetur­a tem um papel importante na criação de riqueza: produção de beleza, criação de riqueza.”

A participaç­ão portuguesa na Bienal de Veneza tem um custo de 450 mil euros, revelou aos jornalista a diretora-geral das Artes, Paula Varanda. Desses, 200 mil foram atribuídos para o desenvolvi­mento do projeto e 250 mil são para despesas relacionad­as com o aluguer do espaço e a manutenção da exposição ao longo de seis meses. Este é um investimen­to da Direção-Geral das Artes, que contou com a contribuiç­ão de 15 mil euros do mecenas Millennium BCP.

“Neste período de crise, houve uma retórica contra a construção de edifícios públicos, considerad­os despesista­s”

NUNO BRANDÃO COSTA

CURADOR DA EXPOSIÇÃO

 ??  ?? Arquipélag­o – Centro de Artes Contemporâ­neas, na ilha de São Miguel, e, em baixo, o Pavilhão da Incerteza
Arquipélag­o – Centro de Artes Contemporâ­neas, na ilha de São Miguel, e, em baixo, o Pavilhão da Incerteza
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal