Diário de Notícias

Pedido de desculpa

- FERREIRA FERNANDES JORNALISTA

Um homem está deitado numa maca, de borco, braços caídos, camisa subida mostrando as costas nuas. O lugar não é público e ele é tratado, parece, por pessoal médico. A cara do homem não se vê, está enfiada na almofada da maca. Eu já estive em situações bem mais de fraqueza. É possível, até, que a imagem seja interpreta­da como ridícula. E eu já estive em situações bem mais ridículas. Fraco ou ridículo, em situações públicas, em que já estive assim, irritou-me que me vissem. Mas, olhem, nas situações públicas, é a vida – imposto a pagar por não ser misantropo, viver com pessoas e gostar delas. Isso, a fraqueza ou o ridículo públicos é problema meu. Outra coisa são os meus ridículos e fraquezas privados (e se os tive...) Esses ninguém tem direito de os violar e mostrar. Como no homem da maca. Ele estava numa enfermaria, local privado, e nada confirma que quisesse ser fotografad­o. Mas foi. A foto apareceu nas televisões e jornais, incluindo na edição online deste meu jornal. E nada me garante que o homem da maca quisesse essa divulgação. Depois, o homem da maca, insurgindo-se com a divulgação que já andava por todo o lado, publicou essa foto no seu Facebook. O gesto dele poderia desobrigar-nos do abuso que havíamos cometido – afinal, o homem também a publicava... Mas essa publicação a que ele se viu obrigado era só um arreganho que nós o obrigámos a cometer. Afinal, um abuso nosso a acrescenta­r ao que já tínhamos feito. Resumindo, da fraqueza ou do ridículo do homem da maca não deveríamos saber e muito menos divulgar. Coisa pouca, dir-se-ia, porque a fraqueza ou o ridículo mostrados eram menores. Seja, mas um abuso é sempre a mais. Pela minha parte, estou envergonha­do. Publicamen­te.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal