Retoma chega e sobra para acomodar 800 milhões
DÉFICE A receita fiscal e as contribuições para a Segurança Social deverão aumentar e os gastos com subsídio de desemprego e juros da dívida vão baixar
A retoma económica, mesmo que mais moderada, e a sua propagação à cobrança de impostos, às contribuições para a Segurança Social, aos gastos com subsídios de desemprego e juros chega e sobra para acomodar um reforço de mais 800 milhões de euros no orçamento da Saúde e mesmo assim atingir um défice de 0,7% do PIB no final deste ano, como quer Mário Centeno, o ministro das Finanças.
Governo e Bloco de Esquerda entraram em colisão por causa da Saúde, que tem um problema crónico de financiamento, com vários serviços hospitalares à beira da rutura e dívidas em atraso. Problema que Centeno diz agora estar praticamente resolvido.
A questão é que o governo negociou com os partidos da esquerda o apoio a um Orçamento com défice final de 1,1% em 2018 e agora, no Programa de Estabilidade que está a ser finalizado para enviar a Bruxelas, quer baixar a meta para 0,7%, que dá a tal diferença de 800 milhões de euros a menos no défice.
Mas a experiência de 2017 mostra que, num ambiente de retoma, pode ser bastante fácil obter folgas avultadas na receita e poupanças na despesa. No ano passado, mesmo com a reversão da sobretaxa do IRS, o governo arrecadou mais (face ao orçamentado) 292 milhões de euros em impostos diretos, mais 735 milhões em impostos indiretos (o IVA foi o grande motor desta folga) e mais 391 milhões em descontos para a Previdência. Do mesmo modo, a Segurança Social conseguiu poupar 155 milhões de euros em subsídios de desemprego. Tudo somado, deu uma folga de quase 1,6 mil milhões de euros. A fatura com os juros quase não subiu.
A margem total no défice final face ao que tinha sido orçamentado chegou a 2,2 mil milhões de euros (em contabilidade pública). Todos estes movimentos permitiram chegar ao défice mínimo de 0,9% do PIB em 2017 (sem o efeito CGD, claro), com a economia a crescer 2,7%. No Orçamento do ano passado, a meta era de 1,6%, tendo sido revista em baixa para 1,5% no Programa de Estabilidade de 2017.
Neste ano, a economia pode crescer 2,3%, mas, mesmo que o governo consiga metade da folga do ano passado, já tem cobertos os 800 milhões exigidos pela esquerda. O problema é que Centeno quer mostrar em Bruxelas números do défice mais baixos do que o previsto – os tais 0,7% do PIB; o BE defende a meta anunciada de 1,1% e usar a folga em melhor saúde e educação. LUÍS REIS RIBEIRO