Diário de Notícias

Os Universali­stas. A arquitetur­a portuguesa tratada por tu Obras que marcaram meio século do país mostram-se na Casa da Arquitetur­a. Programa paralelo inclui debates e visitas

- ANA SOUSA DIAS OS UNIVERSALI­STAS: 50 ANOS DE ARQUITETUR­A PORTUGUESA Casa da Arquitetur­a, Matosinhos De 13 de abril a 19 de agosto Sexta-feira, das 10.00 às 24.00, entrada livre Restantes dias 8 euros (inclui caderno)

A fotografia dos arquitetos diante do Parthénon – Álvaro Siza de rabo-de-cavalo e sandálias, Alcino Soutinho de camisola de alças, Fernando Távora abrindo uma carta que se presume ser de Atenas – dá as boas-vindas à exposição Os Universali­stas, na Casa da Arquitetur­a em Matosinhos. E essa informalid­ade dá o tom do que o visitante vai poder observar a partir de amanhã: 50 anos de arquitetur­a portuguesa aberta ao mundo.

Esta é a mesma exposição que esteve patente em Paris na Cité de L’Architectu­re et du Patrimoine em 2016, organizada por alturas das comemoraçõ­es dos 50 anos da Fundação Gulbenkian. Por sugestão do presidente da fundação, Artur Santos Silva, expressada na altura da inauguraçã­o, a mostra foi trazida para Portugal para a Casa que estava então em construção e que faz agora seis meses de vida (e 21 mil visitantes), nas antigas instalaçõe­s da Real Vinícola. Acrescenta­da agora de um programa de atividades paralelas que inclui debates e vistas guiadas.

A mesma questão que se colocava então é a que surge agora: o que tem de particular a arquitetur­a portuguesa? Responde o comissário da exposição, Nuno Grande: “A relação com os lugares.” “Os arquitetos portuguese­s têm em comum a capacidade de tornar seus os lugares e incorporá-los, conseguem ser holandeses na Holanda, berlinense­s em Berlim, numa abordagem heterodoxa e descomplex­ada.”

E assim a própria exposição é heterodoxa e descomplex­ada, ao mostrar 50 obras de autores portuguese­s ao mesmo tempo que “explica” estes 50 anos de Portugal pela palavra de Eduardo Lourenço, numa longa entrevista conduzida pelo próprio comissário e em outros textos deste pensador. Maquetes, fotografia­s e esquissos são postos em relação com opiniões de críticos de arquitetur­a, portuguese­s e estrangeir­os, e com a realidade de meio século contada por cartoons de João Abel Manta e por fotografia­s do fotojornal­ista Alfredo Cunha. O filme Revolução, de Ana Hatherly, mostra em imagens e som o tempo da revolução de 1974-75.

São cinco os temas em que a exposição se constrói: o final da ditadura, o colonialis­mo, a revolução, a Europa e a globalizaç­ão. Para cada um deles o visitante encontra obras que são a tradução desse tempo, desse contexto. A começar, a sede e o museu da Fundação Gulbenkian em Lisboa, o grande edifício modernista de Ruy Jervis d’Athouguia, Alberto Pessoa e Pedro Cid que, como explica o comissário, demorou tanto tempo a construir (1959-1969) que foi amadurecen­do e se adaptou ao terreno, amável e acolhedor no seu betão tão visível.

O visitante vai talvez estranhar o facto de encontrar todos os textos em francês e inglês, tal como foram feitos para a exposição original de Paris. Em vez de traduzir o conteúdo dos painéis – o que correspond­eria a construir uma nova exposição –, o comissário e a Casa da Arquitetur­a optaram por editar um caderno com todos os textos em português, entregue na compra do bilhete de entrada (8 euros).

E é neste documento que o visitante há de levar para casa que está contada toda a história desta viagem pela arquitetur­a portuguesa dos últimos 50 anos, que termina com duas obras recentíssi­mas. Uma é o Arquipélag­o – Centro de Artes Contemporâ­neas, de Ribeira Grande, na ilha açoriana de São Miguel, de João Mendes Ribeiro, Francisco Vieira de Campos e Cris-

Exposição cruza a arquitetur­a com a história do país. Para ver em Matosinhos tina Guedes, e a outra o Centro de Criação Contemporâ­nea Olivier Debré, na cidade francesa de Tours, projeto de Manuel e Francisco Aires Mateus.

Entre a sede da Gulbenkian e estes dois centros culturais, a viagem percorre Portugal, Angola, Moçambique, e alarga-se ao Brasil e à Europa com obras que, olhadas umas ao lado das outras, reforçam a ideia de que a arquitetur­a portuguesa se pauta pela capacidade de se integrar na paisagem sem perder identidade. A acentuar este dado, o designer da exposição, José Albergaria, explica com o seu sotaque micaelense (“este é mesmo o meu sotaque original, não nasceu em Paris”, sublinha com um sorriso) : “A arquitetur­a e o cinema são as duas áreas em que os franceses respeitam os portuguese­s, sem espaço para piadas condescend­entes.” Albergaria tem em Paris o ateliê de

design Change is good, com um sócio holandês e outro francês.

Nuno Sampaio, o diretor executivo da Casa da Arquitetur­a, explica que metade das exposições a exibir aqui serão criadas por entidades exteriores, como é o caso desta. E faz notar que a mostra que se segue, a inaugurar em setembro, será sobre arquitetur­a brasileira.

Do programa de atividades paralelas organizada­s por Nuno Grande para a exposição na Casa da Arquitetur­a destacam-se desde logo a sessão da inauguraçã­o – amanhã, às 21.00, com a participaç­ão de Alexandre Alves Costa e João Rodeia, e ainda um testemunho de Eduardo Lourenço. No dia 25 de Abril, às 18.30, haverá um debate subordinad­o ao tema “De Maio de 68 a Abril de 74: os anos que agitaram a Polis”, com o deputado e dirigente estudantil da crise de 1969 Alberto Martins e os arquitetos e investigad­ores Pedro Bandeira, José António Bandeirinh­a e Sérgio Fernandez. Maio e junho terão debates com arquitetos de diferentes gerações, com o tema geral “Herdeiros ou heréticos? A relevância dos ateliês e coletivos na arquitetur­a portuguesa”. E nos dias 27 de junho e 11 de julho será dada voz a críticos estrangeir­os, sob o título simbólico “Sud Express”. Como recordou Nuno Grande, nos anos da emigração o comboio Sud Express “era o cordão umbilical que ligava Portugal ao mundo”. “Agora já não precisamos do Sud Express para chegarmos a todo o lado”, acrescenta. E haverá visitas guiadas. A primeira é já no próximo sábado, guiada por Nuno Grande (tal como a de 7 de julho). Seguem-se visitas a 2 de maio com Manuel Graça Dias e a 9 de junho com Maria José Goulão. “E talvez visitas aos próprios edifícios”, acrescenta Nuno Sampaio, que está ainda a organizar essa novidade.

São cinco os temas em que a exposição se constrói: o final da ditadura, o colonialis­mo, a revolução, a Europa e a globalizaç­ão

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