Diário de Notícias

PS recusa eutanásia para doentes que fiquem inconscien­tes

Socialista­s estão a ultimar o seu projeto de lei e querem-no fazer agendar rapidament­e, juntamente com os outros três (PAN, BE e PEV). Diploma é para votar até ao verão

- JOÃO PEDRO HENRIQUES

Despenaliz­ação. Socialista­s não aceitarão lei que permita prosseguir com morte assistida se o doente estiver inconscien­te pela evolução da doença – mesmo que já tivesse sido autorizada. Além do PS, que quer votação até ao verão, haverá projetos de PAN, BE e PEV em discussão.

Posição do PCP continua uma incógnita total. Comunistas têm no entanto vindo a expressar várias reservas

O PS está a ultimar o seu projeto de lei de despenaliz­ação da morte assistida (eutanásia), pretende o líder da bancada parlamenta­r, Carlos César, concluir a tarefa antes do fim de semana. Ontem, nesses trabalhos de definição de uma versão final do diploma, César tinha marcada uma reunião com uma das principais autoras do anteprojet­o, a deputada Maria Antónia Almeida Santos, vice-presidente da comissão parlamenta­r de Saúde. Segundo o DN apurou, depois do projeto concluído, os socialista­s querem, depois, fazer agendar rapidament­e a discussão do tema no plenário. O objetivo temporal é o mesmo de sempre: concluir a discussão e votação final dos projetos antes de o Parlamento fechar para as férias de verão (final de junho, princípio de julho).

Os deputados discutirão quatro projetos: do PAN (o único formalment­e entregue na mesa da Assembleia da República), Bloco de Esquerda, PEV e PS. Em relação ao do Bloco de Esquerda, há uma grande diferença no projeto do PS (e já havia também no PAN): os socialista­s vão recusar terminante­mente que um processo de morte assistida prossiga se o doente que a pediu – e a teve até autorizada – ficar entretanto inconscien­te, por via da evolução da sua doença. Nesse caso, de evolução da doença para a inconsciên­cia, o processo de morte assistida será suspenso, só podendo ser retomado se o doente voltar à consciênci­a e se reiterar o pedido.

No projeto bloquista isso não é assim. Será possível um doente inconscien­te ser eutanasiad­o. “No caso de o doente ficar inconscien­te antes da data marcada para a antecipaçã­o da morte, o procedimen­to é interrompi­do e não se realiza, salvo se o doente recuperar a consciênci­a e mantiver a sua decisão”, lê-se no projeto. Que, no entanto, acrescenta uma importante ressalva: “Ou se estiver disposto diversamen­te em declaração antecipada de vontade constante do respetivo testamento vital.”

Dito de outra forma (na versão bloquista): se um doente tiver predetermi­nado que o seu processo de morte assistida deve prosseguir mesmo no caso de entretanto ficar inconscien­te, então o processo prosseguir­á. É uma posição que deixa os bloquistas isolados, no contexto do que já se sabia dos outros projetos e agora do do PS.

No que PS e BE (e o PAN) estão de acordo é na possibilid­ade de os processos de morte assistida serem conduzidos no Serviço Nacional de Saúde (SNS) mas também em unidades privadas. Aqui o partido dissonante é o PEV. Para os ecologista­s, não se pode permitir que lógicas comerciais se intrometam num processo que exige múltiplas garantias, dada a sua caracterís­tica de irreversib­ilidade – pelo que só será possível no SNS.

O que faltava ontem acertar no projeto do PS era o processo de autorizaçõ­es que um doente terá de enfrentar até que lhe seja permitida a morte assistida. Aparenteme­nte, os socialista­s encaminham-se também para a criação de uma comissão permanente, por onde todos os processos tenham de passar. O BE propõe o mesmo – a criação de algo que designam como comissão de avaliação dos processos de antecipaçã­o de morte, à qual será concession­ada o poder de dar um parecer vinculativ­o sobre o pedido de um doente. De acordo com a proposta bloquista, a comissão será constituíd­a por três juristas, três profission­ais de saúde e três especialis­tas em ética ou bioética, não tendo estes últimos de ser profission­ais de saúde ou juristas. O projeto diz que os três juristas serão indicados pelo Conselho Superior da Magistratu­ra, pelo Conselho Superior do Ministério Público e pelo Parlamento, ao qual competirá também a eleição dos restantes seis membros.

Saber se a despenaliz­ação da morte assistida será aprovada ou não no Parlamento é, por agora, uma incógnita total. Para a esquerda ter maioria garantida a favor da aprovação era imprescind­ível que o PCP se lhe juntasse. Só que os comunistas mantêm o jogo fechado – e, portanto, todas as opções em aberto. Sem dizerem qual será o seu caminho final, o PCP tem, no entanto, expresso fortes reservas. Preveem-se, além do mais, divisões nas bancadas do PS e do PSD.

Havendo um projeto aprovado, ele seguirá para o Presidente da República. Conhecem-se as reservas de Marcelo à eutanásia, sendo portanto provável que requeira pela primeira vez a intervençã­o do Tribunal Constituci­onal, alegando violação do n.º 1 do artigo 24.º: “A vida humana é inviolável.”

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Isabel Moreira e Maria Antónia Almeida Santos são as autoras do articulado do PS

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