Carlos Secretário, Luís Filipe e Guilherme Aguiar consideram que o técnico portista é um treinador à imagem do que era como jogador e destacam-lhe a ambição e a emotividade
DAVID PEREIRA Garra é a melhor palavra que caracterizava Sérgio Conceição enquanto jogador e que o continua a acompanhar como treinador, porque incute essa característica nas suas equipas e vive os jogos de forma muito emotiva.
A personalidade que o atual treinador portista exibe não é algo que tenha sobressaído agora. Já se revelava nos primeiros tempos de futebolista. “Ele era muito emotivo, detestava perder. Sempre foi muito ambicioso, com aquele feitio de querer mais e melhor. Queria jogar sempre, e ficava chateado quando não jogava. Era muito explosivo, embora agora tenha de ser mais contido, porque está no banco e é o líder da equipa”, considerou ao DN o antigo lateral-direito Carlos Secretário, que partilhou o balneário com Conceição em 1997-98 e 2003-04 no FC Porto e entre 1999 e 2001 na seleção nacional.
Para o antigo defesa e agora treinador, “garra é mesmo uma das palavras mais adequadas” para descrever o atual técnico portista. “Pelo que ele demonstrava como jogador e agora como treinador. É ambicioso e consegue passar essa garra para os jogadores. Nota-se perfeitamente na forma de jogar da equipa”, acrescentou Secretário, 47 anos, que em janeiro deixou o comando do Cesarense, do Campeonato de Portugal.
A mesma visão é partilhada por Luís Filipe, que integrava o primeiro plantel que Sérgio Conceição orientou, o do Olhanense, em 2011-12. “Ele tem aquele carisma... Já era assim como jogador, muito profissional e sério, que deixava tudo em campo. Como treinador, é amigo dos jogadores mas exige o máximo, e isso torna a equipa mais forte, porque os jogadores vão atrás dessa mentalidade”, analisou ao DN o antigo lateral extremo.
O ex-futebolista de Sp. Braga, Sporting e Benfica, entre outros, acredita que o treinador portista é hoje “o mesmo” que há seis anos orientava os algarvios. “A personalidade é algo que nunca muda. Ele é o mesmo e acho que será sempre assim, independentemente do clube que representa”, acrescentou. Acabou treino aos 10 minutos Luís Filipe recorda, dos tempos em que trabalhou com Sérgio Conceição, um treinador que queria “exigência nos treinos”. “Num dia, 10 minutos depois de começar o treino, terminou-o porque não gostava do que se estava a fazer. Era um exercício de passe e deslocamento, e acho que houve alguma preguiça e falta de foco dos jogadores. O que ele queria era que estivéssemos focados, porque quando o treino acabasse, teríamos tempo para brincar. Ainda o tentámos demover, mas ele deu mesmo o treino por terminado”, lembrou o ex-futebolista, de 38 anos.
No entanto, se a vincada personalidade do treinador dos dragões é realçada por quem trabalhou com ele, também sobressai e agrada aos sócios e simpatizantes do clube. O conhecido adepto e antigo dirigente portista Guilherme Aguiar diz que “garra, tenacidade, convicção e emotividade” são as palavras que melhor definem Sérgio Conceição. “É um bocadinho ao contrário do treinador do Benfica, que é um homem de calma e ponderação e que tem uma postura muito soft. Vão defrontar-se dois treinadores completamente diferentes em termos comportamentais e emocionais”, frisou o também comentador televisivo.
Guilherme Aguiar recorda-se bem dos primeiros anos da carreira de futebolista de Conceição, e lembra que, “como jogador, já era extraordinariamente aguerrido, com muita força íntima de jogar e nunca dava uma bola como perdida. “Não é de agora, e ele já é treinador há uns tempos, e sempre tem sido frontal e direto, embora por vezes um bocado exagerado”, apontou.
Na retina do adepto portista, continuam “os três golos à Alemanha”, no Euro 2000. “Mostrou uma garra tremenda e deu tudo num jogo que não contava para nada”, salientou, em alusão a um encontro para o qual Portugal partiu já apurado para os quartos-de-final e os germânicos tinham poucas hipóteses de qualificação.
Agora, essa agressividade é transposta para toda a equipa do FC Porto, que para muitos voltou esta temporada a... jogar à FC Porto. “É um bocado isso. A maneira de ser da equipa do FC Porto é de grande coesão e força de vontade. Pegou numa equipa desacreditada, com jogadores que não era previsível que integrassem o plantel, e que estão a revitalizar as carreiras. Para ele, a equipa é um todo, e por isso no final do jogo reúne a equipa toda”, afirmou, em alusão à roda que o treinador portista forma com os seus jogadores e elementos da equipa técnica após os encontros, ainda em pleno relvado. Motivação para o clássico Será que a garra que Sérgio Conceição incute a partir do banco pode ser importante num clássico? Luís Filipe acredita que essa característica ganha mais relevância frente a adversários mais frágeis. “Este tipo de treinador num clube como o FC Porto, ajuda sobretudo em jogos em que não há tanta motivação. Para um clássico não é preciso dizer grande coisa. Com os mais pequenos é mais importante, porque a disponibilidade dos jogadores pode não ser a mesma. Em termos psicológicos, num clássico há pouco a acrescentar”, afirmou o último futebolista campeão por Sporting e Benfica, que disputou cinco clássicos por leões e águias.
Secretário também desvaloriza a possível influência das características do treinador portista num encontro desta envergadura. “Acho que cada treinador tem o seu tipo de liderança. O Sérgio tem a sua e o Rui Vitória também. Pode ser um jogo fundamental. As equipas estudam-se umas às outras, e a estratégia de liderança pode ser diferente. Nestes jogos, a motivação dos jogadores está no máximo, e ele pode utilizar outras estratégias para ter os jogadores mais concentrados. Ele é um treinador habituado a estes jogos como jogador”, frisou o antigo lateral direito, que coincidiu em campo com Conceição em 35 jogos oficiais, 22 no FC Porto e 13 na seleção.
Sérgio Conceição pode atingir este domingo (18.00), no Estádio da Luz, a 100.ª vitória na carreira de treinador, naquele que será o seu 223.º encontro, num saldo que também contempla 60 empates e 63 derrotas.