Centeno quer ficar na história
Mário Centeno quer ficar na história graças às metas que vier a alcançar em termos de défice em 2018, e não só. Os objetivos são já de 0,7% em vez de 1% neste ano, de apenas 0,2% em 2019 e ainda antecipa um excedente de 0,7% para o ano de 2020.
Empoderado pela função de governante mas também pelo cargo que desempenha no Eurogrupo, onde ocupa a cadeira de presidente, Mário Centeno não está disposto a ceder uma vírgula, ou melhor uma décima, nos objetivos que tem definidos.
Goste a geringonça ou não, Centeno está determinado. É essa a marca que quer deixar e com a qual pretende fazer história no seio da União Europeia.
Tudo estaria bem não fosse a contestação à esquerda, que pede reforço dos serviços públicos em vez de um défice magro, e não fosse a Fitch a “cortar o barato” (como dizem os brasileiros) ao senhor ministro. É que a agência de rating veio alertar, há menos de 24 horas, que receia “um novo stress no setor financeiro” e que poderá ter efeitos sobre o défice e sobre a dívida.
Um dos maiores riscos da economia portuguesa prende-se, ainda hoje, com os bancos e o sistema financeiro em geral, declara a mesma agência de rating.
Os riscos relacionados com os bancos têm diminuído, mas “o rácio elevado de NPL (créditos improdutivos, onde se inclui o malparado) continua a ser um risco e um constrangimento potencial ao crescimento de médio prazo”, aponta a organização no mesmo estudo, divulgado ontem.
Um dos próximos testes em que Portugal terá de passar com distinção acontece já no dia 1 de junho. Nessa data, a Fitch fará uma nova avaliação ao rating português.
Está à vista que a organização tem reparado nas fragilidades do país e isso deve deixar-nos alerta, sobretudo a quem tem o poder governativo. A Fitch está preocupada com o facto de a dívida externa líquida nacional valer quase 90% do produto interno bruto (PIB), um nível que considera “elevado” quando comparado com os outros países que também partilham o rating BBB.
Se por um lado o crescimento da economia é positivo e bem apreciado pelas instituições internacionais como esta, por outro lado a fragilidade do sistema financeiro e a gravidade do malparado poderão vir “a cortar o barato” do executivo. Como cidadã portuguesa, espero bem que assim não seja. Não posso, no entanto, deixar de olhar para a realidade e de ouvir os ecos económicos que vêm de fora. Vale a pena recordar que a Comissão Europeia já alertou para o facto de os bancos nacionais serem dos menos lucrativos da Europa e, mais grave ainda, dos menos capitalizados.
Por todas estas razões e avisos, o cenário da Fitch é mais conservador do que o do executivo e a agência aponta para um défice de 1,3% do PIB neste ano em vez de 0,7% e para um peso da dívida na ordem dos 123% em vez dos 122,2% previstos pelo governo.
Ficar na história não se avizinha uma tarefa nada fácil.
Não podemos deixar de ouvir os ecos internacionais de preocupação com o sistema financeiro nacional