O espaço da tragédia
NJOÃO LOPES a sua singeleza, o título do filme de Philippe Van Leeuw envolve um calculado desafio: tem que ver com a identificação de um lugar, não a sua redução a uma matéria noticiosa (cuja eventual pertinência, como é óbvio, não está em causa). Dito de outro modo: este é um objeto construído a partir de uma metódica interrogação dos próprios meios com que trabalha. Não se trata de condensar a situação trágica da Síria num qualquer moralismo de “prós e contras”.Trata-se tão-só de perguntar como fazer cinema – ou que cinema se pode fazer – a partir de uma história situada na Síria contemporânea.
A resposta de Philippe Van Leeuw assume as suas próprias limitações estruturais. Não se trata, assim, de enunciar um projeto político para, por qualquer arte mágica, resolver os infinitos problemas direta ou indiretamente decorrentes da situação na Síria – se os políticos não conseguem (ou, pelo menos, ainda não conseguiram) definir tal projeto, por que razão um filme teria tal vocação ou poder? Trata-se, isso sim, de lidar com o contexto sírio a partir do mais primitivo valor cinematográfico. A saber: a construção de um espaço específico.
Que espaço? Pois bem, este é um filme que nos coloca no interior de uma casa ameaçada por bombardeamentos e atiradores furtivos, expondo uma vivência (aliás, uma sobrevivência) tão frágil quanto claustrofóbica. Não é uma reportagem, mas também não é um sermão. Nenhuma voz vem apaziguar a inquietação que perpassa pelos corpos, de alguma maneira contaminando todos os objetos. Em última análise, aquilo que vai adquirindo espessura e emoção é a verdade irredutível de cada pessoa. Nos tempos que correm isso tem que ver com um valor, primitivo e nobre, quase ausente do espaço audiovisual. O seu nome? Humanismo.