Palavra de escuteiro: “Não seria a mesma pessoa sem o escutismo”
No Dia Mundial do Escutismo, o secretário de Estado da Educação, João Costa, evoca o movimento em que percorreu todas as etapas. “É uma escola de autonomia”, diz
Naquele ano de 1981, João Costa era “um miúdo gordinho, sedentário, que gosta(va) de livros”. Aos 9 anos, uns amigos desafiaram os pais para que o deixassem ingressar nos escuteiros. À sua espera tinha o Agrupamento 415 de Santa Maria, na cidade onde sempre morou: Setúbal. Foi por lá que o miúdo se fez homem e seria a partir de lá que o homem haveria de se tornar secretário de Estado da Educação do atual governo. “Fiz lá a minha vida. Os meus grandes amigos até hoje são todos de lá”, conta ao DN o governante, que aos 19 anos já era dirigente, um dos mais jovens do país.
“Naquela altura havia muita falta de dirigentes, foi por isso que aconteceu tão cedo”, recorda, ele que durante 20 anos seguidos trabalhou com lobitos (os mais jovens na hierarquia). “São a minha praia. Porque são idades adoráveis, são muito espontâneos, e porque têm uma maturidade e capacidade de desenvolvimento e trabalhar em projeto que às vezes é subestimada.” Talvez João Costa se reveja nos pequenos que, como ele, chegam aos escuteiros à descoberta do mundo. É uma paixão? Será, sim, pela forma como fala do movimento escutista, do crescimento que proporciona. “Faz parte de mim. Costumo dizer que tenho uma dívida de gratidão para com o escutismo. Há muitas áreas daquilo que eu sou que desenvolvi através do escutismo; a capacidade de resolver alguns problemas, de me superar, até fisicamente.”
O percurso de dirigente atravessou quase três décadas. João Costa foi chefe daquele agrupamento durante 11 anos, ao mesmo tempo que mantinha o trabalho com os seus lobitos e se tornou formador, dirigindo diversos cursos a nível nacional. “Oficialmente ainda estou ativo, só deixei a atividade regular quando vim para o governo”, revela ao DN. O secretário de Estado da Educação licenciou-se em Linguística pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, e nessa área acabaria por concluir o doutoramento, na Ho- landa. Não se pense que esse tempo o afastou do escutismo: “Levei comigo o bichinho e envolvi-me num agrupamento por lá. Potenciei muitos agrupamentos de holandeses em Portugal e de portugueses na Holanda por conta dessa relação.” Entretanto, integrou a Junta Regional de Setúbal e foi chefe regional durante cinco anos, até ser chamado para integrar a equipa de Tiago Brandão Rodrigues no Ministério da Educação, neste XXI Governo constitucional.
João Costa está convicto de que “não seria a mesma pessoa” se não tivesse ingressado no movimento escutista. Porque “o escutismo tem essa capacidade maravilhosa de valorizar o que há de bom em todos. Todos fazem falta e todos têm qualquer coisa que pode ser potenciada. É um movimento de muitos afetos”, conclui. “As pessoas fazem amizades muitos robustas; somos todos padrinhos dos filhos uns dos outros”. Para quem fala com tamanha paixão do movimento escutista (católico), não é de estranhar que muitas vezes seja chamado a esclarecer dúvidas ou a influenciar a decisão de pais e amigos a esse respeito. João Costa tem sempre a resposta pronta:
“O escutismo é uma escola de autonomia, de desenvolvimento de capacidades que noutros meios educativos não se conseguem desenvolver tão facilmente.” Por isso atribui tanta importância ao ato de “acampar, que é fundamental. E só há escutismo com campo”, diz. E sustenta a convicção com “a capacidade de resolver problemas” que daí advém. “Se a comida se queima não há mais comida”, por exemplo.
Fala também da magia do jogo, de estar sentado à volta de uma fogueira à noite. “São experiências únicas que nos permitem aprender muito através da ação. E isso a escola não dá, a família não dá, é uma coisa que nos complementa e que é muito boa.”
Aos 45 anos, João Costa fala dessa importante conquista para o miúdo. “Mantive-me gordinho e a gostar de livros, mas deixei de ser sedentário.”