A democracia, característica política essencial do europeísmo em vigor, aparece abalada pelo facto de algumas vezes os partidos clássicos se apoderarem dos temas dos populistas
A democracia, característica política essencial do europeísmo em vigor, aparece abalada pelo facto de algumas vezes os partidos clássicos se apoderarem dos temas dos populistas, por exemplo perante o fenómeno das multidões em busca de refúgio, com uma problemática diferente dos simplesmente emigrantes do passado. Toda esta movimentação, cuja complexidade é maior do que a que exemplificadamente fica apontada, evidencia o que só pode dizer-se de maneira quase contraditória: que a ideia do pensamento único que orientou a fundação da ONU, e teve o maior reflexo na União Europeia, e nas organizações daquela derivadas ou dependentes, tentou organizar o mundialismo segundo uma convergência nuclear, mas que de facto era apenas ocidental, incapaz de harmonizar, com essa visão em retirada de proeminência colonial, as múltiplas identidades culturais, étnicas, religiosas, que pela primeira vez falaram ao mundo em completa liberdade de palavra. Aparentemente foi isto que bloqueou tais instituições que são intencionalmente de convergência na definição formal, mas não conseguiram a ação convergente, e respeitada, e liderante que as animou. O drama da Síria é certamente o exemplo mais angustiante, no centro de um desastre mais extenso dos conflitos. São menos espetaculares, mas não são menos inquietantes na cadeia de fracassos, a suspensão das negociações comerciais de Doha (2001), a inconsciência de governantes que recusaram a fidelidade ao Acordo de Paris sobre a questão climática, como fez Trump em 2017, para a Europa o brexit do Reino Unido e os nacionalismos separatistas. De facto, o pensamento único que orientou a ONU, tendo em vista a paz para os nossos dias e legado de futuro, não conseguiu até hoje impor-se como ponte entre as diferenças, a solidariedade no interesse comum unificador do mundo único. A dúvida, sem resposta que seja tranquilizante, é sobre conseguir que o projeto de convergência global, para sustentação do afirmado “mundo único”, venha a ganhar uma oportunidade de, finalmente, abrir caminho à esperança da convergência, que substitua o crescente clima de ameaças, cada uma delas uma leviandade perigosa. Para isso é útil ter presente o comentário de Daniel Innerarity, segundo o qual “a política não é mera administração, nem mera defesa, mas configuração, esboço das áreas de atuação, adivinhação de futuro. Tem relações com o inédito e o insólito, manipulações que não aparecem noutras profissões muito honradas mas alheias às inquietações provocadas pelo excesso de incerteza”. É por isso, entre mais razões, que as instituições criadas com visão globalista, como a ONU e suas dependências, precisam da autenticidade e autoridade prometidas para que a igual dignidade dos povos e culturas não seja violada, um apelo cada vez menos atendido.