Estrasburgo vota novas regras para investimento chinês em maio
Europa debate limites à entrada de capital chinês em setores críticos, como a energia. Portugal é um dos países que estão contra
O Parlamento Europeu (PE) vota a 17 de maio novas regras para escrutínio ao investimento direto externo que visam conter a entrada de capital chinês em setores considerados críticos, como energia, transportes, comunicações e tecnologia – nas áreas de inteligência artificial e cibersegurança. O governo português está entre aqueles que manifestaram inicialmente oposição à iniciativa da Comissão Europeia e há a possibilidade de o Parlamento português não chegar a discutir o tema.
Após mais de três décadas de reformas económicas, o investimento chinês no exterior conheceu uma aceleração no período posterior à crise financeira mundial de 2008. Nos EUA, representava no final de 2017 um stock pouco abaixo dos 150 mil milhões de dólares, mas na Europa poderá já ter superado os 300 mil milhões de dólares, segundo cálculos da Bloomberg publicados esta semana. Nos negócios realizados, destacam-se a compra de participações em empresas de transmissão e distribuição de eletricidade, bancos e seguradoras (Portugal), de portos e aeroportos (Grécia), de gás natural (França), mas também de robótica (Alemanha).
Estes são ainda setores que na China estão fechados às empresas europeias, sem que a UE tenha conseguido até hoje negociar condições de reciprocidade num acordo bilateral de investimento. “Presentemente, as medidas defensivas de escrutínio ao investimento – que, já agora, não são completamente rejeitadas pela China, que percebe que tem de conhecer quais os seus limites – são a prioridade”, defende François Godement, do think-tank Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR), uma das entidades consultadas no processo legislativo europeu. “Se um tratado bilateral de investimento vier a acontecer, será maravilhoso. Mas, até aqui, a China não responde. Em vez disso, tem proposto um acordo de livre comércio, algo que é muito lato, mas também muito mais difícil.”
As negociações para um acordo China-UE foram iniciadas há oito anos e encontram-se suspensas.
O primeiro-ministro português, António Costa, manifestou, em junho de 2017, numa reunião do Conselho da UE a discordância de Portugal a um travão à entrada de capital chinês na Europa. O Parlamento português tem, no quadro do processo legislativo europeu, a oportunidade de se pronunciar. Até aqui, e a três semanas da votação pelo Parlamento Europeu, não o fez.
A proposta chegou à Comissão de Assuntos Europeus da Assembleia da República (AR) no início de outubro passado, tendo então sido sinalizada junto da Comissão de Economia, Inovação e Obras Públicas para que esta a avaliasse também no âmbito das suas atribuições. Segundo informação da AR, até à última terça-feira não tinha sido agendada a discussão da iniciativa em qualquer das comissões.
Sem prazo para emissão de um parecer, a iniciativa poderá ainda ser analisada, mas também poderá nunca o ser. Em última análise, a opinião dos deputados portugueses pode acabar por ser considerada irrelevante em função de um progresso rápido das votações no PE e Conselho da UE. As duas instituições têm codecisão na iniciativa, que poderá ficar por uma primeira leitura.
No quadro dos 28 Estados membros atuais, apenas os parlamentos de França, Itália e República Checa se pronunciaram. Croácia, Estónia, Finlândia, Alemanha, Polónia, Eslováquia e Holanda iniciaram o processo, mas ainda não entregaram pareceres em Estrasburgo. A iniciativa conta, pelo menos, com o apoio de nove países da UE. A nova regulamentação foi formalmente apresentada pelo presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, em setembro, numa iniciativa suscitada pela Alemanha, França e Itália. O trio europeu pretendia que Bruxelas passasse a ter meios de veto a investimentos de empresas estatais chinesas não governados por princípios de mercado.
A versão que vai ser votada pelos deputados europeus está já mitigada. Não vão ser as instituições europeias, regra geral, a escrutinar os negócios, mas antes os governos nacionais, de acordo com as respetivas regras para avaliação de investimento direto externo e sob uma grelha comum que pretende garantir transparência, bem como a possibilidade de a Comissão Europeia pôr um travão a negócios que possam “afetar projetos e programas de interesse da União com base em considerações de segurança ou de ordem pública”.