Considero o número dois da hierarquia norte-coreana, Kim Yong-nam, um interlocutor válido. Conheci-o bem quando fui embaixador na Coreia do Norte, num período em que as relações entre os nossos países eram de muita cordialidade
É interessante constatar que dois ou três dias depois da visita de Kim Jong-un a Pequim, é anunciada a data da cimeira intercoreana para 27 de abril.
Como referimos, enquanto a primeira cimeira intercoreana se realizou num contexto em que as regras do jogo pareciam mais conformes a uma estratégia mais ou menos clara, atualmente assistimos a uma velocidade enorme de declarações e visitas, algumas inesperadas – como a recente e misteriosa visita de Mike Pompeo a Pyongyang e declarações do presidente americano dificilmente compreensíveis.
Toda esta visita foi envolvida em grande mistério, até na forma em que foi primeiramente anunciada a “título de anonimato”, pois quem fez a declaração pública afirmou não estar autorizado a fazê-la. Estamos, assim, perante toda uma prática diplomática que mais se assemelha a um espetáculo do que a uma negociação.
Afigura-se-nos, porém, que as posições da Coreia do Sul têm um conteúdo mais sereno, consistente, que nos permite antever com prudência, mas com algum otimismo, o encontro de Panmunjom, onde parece haver da parte de ambas as Coreias o desejo de preparar finalmente um Tratado de Paz, que viria pôr fim à situação decorrente do armistício, que mantém as duas Coreias num estado de guerra.
É evidente que um tratado de paz teria de implicar os Estados Unidos e não poderia ser negociado ou assinado somente pelas duas Coreias.
Usando há dias uma linguagem litúrgica e pouco frequente em relações internacionais, Trump afirmou “They have my blessing to discuss the end to the war”.
Segundo o The Washington Post, ainda na sexta-feira passada, no Comité Central, Kim Jong-un haveria afirmado ter-se entrado numa nova etapa histórica e que suspenderia todos os ensaios balísticos intercontinentais.
Com prudência, e se o presidente Trump não mudar repentinamente de orientação, talvez possamos concluir que estamos novamente num caminho de possível abertura e paz, como aconteceu durante o programa KEDO. Assim, talvez venha a ter lugar a cimeira ao mais alto nível que se espera para maio ou junho com o sucesso que o povo coreano, os países da região e o mundo desejam.