Diário de Notícias

“Dadores não querem ser pais”

- CLÁUDIA VIEIRA PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE FERTILIDAD­E

Como é que o chumbo do Tribunal Constituci­onal afeta os casais que recorrem à Procriação Medicament­e Assistida? A partir do momento em que deixa de haver anonimato dos dadores de gâmetas (ovócitos e esperma), todos os tratamento­s com recurso a gâmetas doados estão postos em causa. As pessoas são dadores porque estão protegidas pelo sigilo. Quais são as razões que levam uma pessoa a ser dador? Aquelas pessoas não querem ser mães nem pais; querem apenas ajudar outras pessoas a sê-lo. E dão os seus ovócitos ou esperma da mesma forma que muita gente doa sangue. Se deixar de haver anonimato, haverá uma quebra gigantesca no número de dadores e os tratamento­s dos que não têm material genético próprio (e que são muitos) poderão deixar de se realizar. A questão do conhecimen­to do património genético e a prevenção de doenças já estão salvaguard­adas na lei? Sim, o direito ao conhecimen­to do património genético e de doenças eventualme­nte transmissí­veis pelos dadores já está salvaguard­ado na lei atual. A única coisa que é anónima é a identidade pessoal do dador; todo o seu historial clínico está ao dispor dos pais e, no futuro, da criança. Não encontro justificaç­ão para esta quebra de anonimato (principalm­ente quando o próprio TC já se pronunciou a favor de manter o anonimato num acórdão de 2009). Parece-me uma desculpa para voltarem a levar a lei da Gestação de Substituiç­ão ao Parlamento. O que implica a gestante poder recuar na decisão até entregar as crianças aos “beneficiár­ios” para as famílias? Mais uma vez, não faz qualquer sentido. A partir do momento em que a gestante o é de forma totalmente altruísta – ou seja, sem receber compensaçã­o financeira, isso significa que é, na esmagadora maioria das vezes, uma pessoa próxima do casal. É a irmã, a prima, a mãe de um dos futuros pais. E, no acórdão, não se fala do casal beneficiár­io. Se perderem o filho, ninguém se preocupa?

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