“Tu estavas bem era na JSD.” E Margarida foi ver o que era e avançou
Filha de um jornalista e de uma educadora de infância, a nova presidente da JSD marcou a sessão do 25 de Abril. Quem conhece Margarida Balseiro Lopes já estava à espera. O pai diz “que estas coisas podem ser efémeras”, mas acredita que será diferente
Fernando Lopes assistiu pela televisão às comemorações do 25 de Abril, como sempre, a partir da Marinha Grande. E então houve um momento que lhe fez encher o peito: aquele em que a filha subiu à tribuna para discursar, em nome do PSD, de cravo vermelho sobre a camisola bege. Discreta, como sempre, a jovem deputada e recém-eleita presidente da JSD, protagonizou o discurso do dia, suscitando até aplausos da bancada do PS.
O pai, jornalista aposentado, não embandeirou em arco com o momento. Porque tem “experiência de vida e sabe que estas coisas podem lá ser efémeras”, embora lá dentro algo lhe diga que esta não é uma nuvem passageira. “Ela foi-se construindo e sabendo construir-se”, conta ao DN dois dias depois da consagração de Margarida Balseiro Lopes aos olhos do país, quando falou sem ameias da corrupção, tema tabu até então no rol de discursos em dia festivo. “Foi um orgulho, sim”, acaba por admitir o pai, que se habituou a vê-la interessar-se pelos temas sociais e políticos desde pequena. Aos 12 anos, Margarida reativou a Associação de Estudantes da escola preparatória. E aos 16, acabou por repetir a proeza na secundária Calazans Duarte, na mesma Marinha Grande.
Foi aí que um dia se travou de razões com a colega Diana Gregório (membro da juventude comunista), nas aulas de Francês. “A professora Dina dava-nos muito espaço para discutirmos, quando andávamos no 10.º ano”, conta ao DN a amiga Joana Bonifácio, que a acompanha desde esse tempo. Lembra-se bem de ver “a Guida entrar para a nossa turma, quando mudou para Humanidades”.
Eram dez raparigas e dois rapazes, e logo a colega nova se fez notar. Numa das discussões, a comunista disse-lhe: “Tu estavas bem era na JSD!” Margarida entrou em casa nesse dia a pedir ao pai que lhe explicasse as diferenças entre os vários partidos políticos. “Mandei-a ler, como sempre. Que fosse à procura das referências”, conta Fernando Lopes. E isso não era de todo um grande desafio para a menina que lia desde muito nova, pois cresceu nos corredores do Jornal da Marinha Grande, de olhos postos no trabalho do pai e da mãe, Lúcia, educadora de infância.
Acabou por rever-se na social-democracia e fez-se militante da JSD. Numa terra tradicionalmente dividida entre comunistas e socialistas, Margarida entrou cedo na cena política. Hoje é a única eleita na Assembleia Municipal. E foi lá, por volta dos 20 anos, que outro 25 de Abril a marcou: aquele em que o partido a escolheu (também) para discursar, logo a seguir ao irmão
Ricardo, que falava em nome do PS, do qual é dirigente. Nessa altura Margarida já era estudante de Direito na Universidade de Lisboa. António Leitão Amaro recorda-se dela sentada numa das primeiras filas, perto de outro líder atual: Francisco Rodrigues dos Santos, da Juventude Popular.
Já a conhecia da JSD (o deputado deixara a liderança pouco antes), mas desse tempo em que era também professor de Direito Ambiental guarda sobretudo a imagem da aluna “aplicada, inteligente, com capacidade de iniciativa, e simultaneamente a rapariga doce, sempre disponível para os outros”. Esse conjunto de características fez-se notar no caminho político que ambos foram percorrendo. De tal modo que, quando ela chegou ao Parlamento, eleita por Leiria nas legislativas de 2015, chamou-a para trabalhar na Comissão do Orçamento e Finanças. “Fico muito feliz por ver o país a reconhecê-la. É das pessoas mais talentosas na política. E com a capacidade de mudar a imagem junto daqueles que olham para os políticos de forma desconfiada”, adianta o deputado.
Nessa bancada, há outro companheiro, Pedro Pimpão, que a conhece bem e a recorda adolescente a reativar a comissão concelhia da JSD na Marinha Grande. Quando chegou à liderança da jota em Leiria, ele vindo de outro concelho do mesmo distrito em que a juventude laranja domina – como é Pombal – não teve dúvidas de que era ela quem iria buscar para secretária-geral. “O que me impressiona nela é que nunca perdeu o pé. Nunca se dedicou exclusivamente à política, empenhou-se muito profissionalmente, depois de acabar o curso.”
Na bancada do PSD, todos sabem desde sempre que Margarida é muito fiel aos seus princípios, sem qualquer pejo de votar contra a corrente, como já aconteceu. De resto, cultiva amizades da esquerda à direita. “A Margarida é uma amiga, sobretudo”, conta André Caldas, chefe de gabinete do ministro Mário Centeno. Conheceram-se no curso de Direito, quando o socialista já era licenciado em Medicina Dentária, que deixou de exercer. Caldas recorda-lhe o grande envolvimento na vida académica e na sociedade. A ele, o discurso da sessão do 25 de Abril também não surpreendeu. “É uma mulher de valores, de causas, de liberdade e de tolerância.”
Quando era menina, delirava com a decoração de cravos vermelhos da Câmara da Marinha Grande, com a festa que sempre foi o 25 de Abril na cidade. E isso casava bem com a música de intervenção que lhe marcou a infância, nas viagens de carro. Quem a ouvir na próxima semana no programa de Maria Flor Pedroso (na Antena 1), não há de surpreender-se com a escolha da música: “Porque”, poema de Sophia de Melo Breyner cantado por Francisco Fanhais, um dos seus favoritos. Eclética o bastante na música, a jovem de 28 anos tanto ouve Red Hot Chilli Peppers como Carminho ou Maria Bethânia.
Nos poucos tempos livres (os amigos não têm memória de a ver sem agenda, desde os tempos de escola) gosta de ler e viajar. Os que lhe são próximos garantem que nunca se deixou deslumbrar pela política. Experiente nestas andanças, o pai sabe que tudo isto pode despertar invejas e gerar anticorpos. “Tenho a certeza que ela vai saber gerir isso, e nós cá estaremos para a ajudar.” Na quarta, Fernando Lopes quis ir ao Parlamento, mas Margarida pediu aos pais que não fossem, por defesa das emoções. E assim não viu o pai chorar, em frente à TV.
Na quarta, Fernando Lopes quis ir ao Parlamento, mas Margarida pediu aos pais que não fossem. E o pai chorou em frente à TV