CASO MANUEL PINHO
COMISSÃO DE INQUÉRITO VAI ESTENDER-SE DE 2003 ATÉ AO GOVERNO DE PASSOS
A comissão parlamentar de inquérito às rendas excessivas no setor da energia, proposta pelo Bloco de Esquerda, vai abranger os governos de Durão Barroso, Santana Lopes, José Sócrates e Pedro Passos Coelho. A proposta que os bloquistas apresentam hoje terá como objeto todo o período de vigência dos CMEC (custos de manutenção do equilíbrio contratual), de 2003 a 2014. Carlos Tavares, Álvaro Barreto, Manuel Pinho, Álvaro Santos Pereira e Jorge Moreira da Silva foram os ministros responsáveis pela tutela da energia neste período e serão, por isso, chamados ao Parlamento. Se a convocatória se pode estender aos chefes dos vários governo é uma questão que o BE mantém em aberto.
O objetivo, diz o deputado bloquista Jorge Costa, passa por abarcar todo o período de abrangência dos CMEC, desde que este mecanismo começou a ser preparado, em 2003, até às últimas alterações que sofreu, já em 2014. Pelo meio, estará o consulado de Manuel Pinho, o ministro da Economia de José Sócrates, que terá uma menção específica no objeto da comissão parlamentar de inquérito. “Manuel Pinho não inventou os CMEC, mas este dispositivo de extração de riqueza à população tornou-se muito mais grave” com as decisões do ex-ministro, argumenta o deputado bloquista.
Presente mas em silêncio
O objeto da comissão parlamentar de inquérito às rendas da energia será hoje conhecido e obrigará Manuel Pinho a ir ao Parlamento. Na última segunda-feira, conhecida a intenção do PSD de chamar o antigo ministro da Economia à Assembleia da República, Pinho fez saber que está disponível para dar explicações aos deputados, mas apenas depois de ser interrogado pelo Ministério Público.
Com a comissão de inquérito perde a prerrogativa de poder escolher a data – uma vez convocado pelo Parlamento, a presença é obrigatória. Mas a SIC Notícias avançava ontem que Pinho deverá manter o silêncio perante a comissão de inquérito caso não seja ouvido antes pela Justiça.
O antigo ministro da Economia foi constituído arguido no âmbito do caso EDP, que investiga os cerca de 1,2 mil milhões de euros que terão sido atribuídos à elétrica em consequência das decisões de Pinho enquanto governante. O jornal online Observador noti- ciou entretanto que Pinho terá recebido um milhão do saco azul do Grupo Espírito Santo, cerca de metade em tranches mensais transferidas através de uma sociedade offshore enquanto era ministro da Economia. Antes de chegar ao governo, em 2005, o economista trabalhava há cerca de uma década para o grupo BES – acionista de referência da EDP.
Sublinhando desconhecer a proposta em concreto do Bloco de Esquerda, o PS reserva para hoje uma posição sobre a iniciativa dos bloquistas. Mas os socialistas já manifestaram disponibilidade para aprovar a iniciativa, tal como o PCP. O CDS também já veio dizer que não inviabilizará a comissão parlamentar de inquérito.
O início dos CMEC
Os custos de manutenção do equilíbrio contratual são uma remuneração paga à EDP, uma espécie de seguro para compensar as receitas que a empresa teria com a venda de energia em condições de mercado. O custo é imputado aos contribuintes através da fatura da eletricidade.
Antes de surgirem esses CMEC foram negociados os contratos de aquisição de energia (CAE), negociados em 1995, quando a elétrica ainda era pública. Entretanto, as novas diretivas europeias de liberalização da energia vieram proibir estes contratos, que foram então substituídos pelos CMEC – o novo
Bloco mantém em aberto se chamará ao Parlamento os líderes dos governos sob escrutínio no inquérito parlamentar
regime foi definido em 2004, mas só ficou fechado e começou a ser aplicado em 2007. É precisamente esta alteração contratual, feita ao tempo de Manuel Pinho, que está agora a ser investigada por haver suspeitas de corrupção passiva e ativa e de participação económica em negócio.
“Rentabilidade excessiva”
Um dos maiores críticos dos CMEC desde 2007, Mira Amaral já classificou como “pornográfica” a rentabilidade acordada em 2007 entre Manuel Pinho e António Mexia. Ao DN, o ex-ministro diz ver com bons olhos a iniciativa parlamentar. Mas defende que se deve distinguir o aspeto criminal – que cabe à Justiça – do político.
“Os CMEC são legais, nunca questionei a sua legalidade. O que sempre me pareceu foi que a sua rentabilidade era excessiva”, argumenta, citando números da Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, que apontam que a transição dos CAE para os CMEC permitiu à EDP obter rendas adicionais de cerca de 510 milhões de euros ao longo dos últimos dez anos.