Bruxelas dá 30 mil milhões extra para investimento em períodos de crise
Comissão Europeia vai anunciar fundo de estabilização macroeconómica para financiar investimentos em Estados membros com dificuldades de acesso aos mercados. Portugal já defendeu a “retoma do investimento”
Bruxelas apresenta hoje a proposta de orçamento europeu de longo prazo. O documento que alguns consideram o menos ortodoxo de sempre, com cortes em políticas históricas na construção europeia, terá porém alternativas aos modelos tradicionais – uma espécie de rebuçados e até uma sobremesa “orçamental substancial”, para investimentos em tempos de crise.
Em simultâneo com a apresentação do Quadro Financeiro Plurianual, a Comissão Europeia vai anunciar um fundo de estabilização macroeconómica destinado a financiar investimentos em Estados membros com dificuldades de acesso aos mercados. Nos corredores europeus admite-se que o modelo que vai ser hoje proposto possa ascender aos “30 mil milhões de euros”, através da alavancagem de empréstimos do Mecanismo Europeu de Estabilidade e de garantias dos Estados membros,
No acordo assinado entre o governo e o PSD, Portugal expressa o apoio a uma “linha orçamental” que a par do “apoio às reformas” preveja a “retoma do investimento”, sugerindo-se que esta “capacidade orçamental” seja financiada “através da afetação de uma parte dos lucros do BCE”.
Esta verba vem “combater uma lacuna que existia, como a que resulta do facto de, até aqui, a União Europeia só poder financiar a substituição de dívida sem qualquer possibilidade de fazer o mesmo relativamente a projetos de investimento”, comentou ao DN um alto funcionário europeu.
Outra fonte considerou que este tipo de instrumento iria “diminuir as probabilidades de contração da economia em períodos de contenção”. Para terem acesso ao financiamento deste fundo de estabilização macroeconómica, os Estados membros ficariam, porém, sujeitos a algum tipo de condicionalismo, nomeadamente “seguirem as recomendações específicas” da Comissão Europeia, tal como já acontece atual- mente no âmbito do semestre europeu.
Horizonte Europa O futuro do maior programa de ciência da UE, rebatizado Horizonte Europa, contraria aquilo que é regra neste orçamento, garantindo “muito mais dinheiro” do que o programa atual, assegurou uma fonte comunitária, escusando-se a apontar uma ordem de grandeza. O DN apurou entretanto que Bruxelas vai destinar cem mil milhões de euros para a ciência, depois de semanas de “discussões intensas”, mas que “correram bem”, de acordo com uma fonte muito próxima das negociações.
O montante fica porém aquém da intenção de Jean-Claude Juncker no debate parlamentar, após o seu discurso sobre o Estado da União, em 2017, em que admitiu a duplicação desta verba. Mas num “orçamento com cortes em todos os setores” é um “aumento brutal”, considerou uma das fontes consultadas, esperando um “impacto muito forte” a nível da investigação e da inovação europeia, pois “haverá muito mais dinheiro disponível, até por via da saída do brexit”. O Reino Unido lidera em termos absolutos o número de projetos aprovados nos primeiros três anos de vigência do Horizonte 2020.
De acordo com um esboço do documento, consultado pelo DN, este montante será suficiente para colocar a Europa a “competir com outras economias desenvolvidas e emergentes [e] garantir um futuro próspero para os seus cidadãos, preservando o seu modelo social único”.
Cortes É na Política Agrícola Comum (PAC) e na política de coesão que a grande dimensão dos cortes se vai refletir. Durante o período de discussões para a elaboração do documento, uma fonte admitiu ao DN que o futuro orçamento de longo prazo encolha 6% nas duas áreas políticas, que somam 80% das verbas europeias. Já nesta semana outra fonte garantiu que “pelo menos na coesão o corte será menos acentuado”, deixando a PAC como a maior sacrificada. Admite-se que, por exemplo, os pagamentos diretos aos agricultores possam deixar de ser pagos a 100%.
A fórmula de cálculo para a distribuição dos fundos estruturais é outra dúvida que se espera ver hoje esclarecida. De acordo com um esboço da proposta, o Fundo Social Europeu ficaria na esfera de decisão de Bruxelas, dependente do cumprimento de certas obrigações, nomeadamente o princípio do Estado de direito e de determinadas metas relativas à política de integração de migrantes e refugiados.
“Nada disto quer dizer que Portugal venha a perder fundos europeus. Tudo depende dos critérios que forem inseridos nos cálculos, de modo a maximizar o envelope para o país”, admitiu fonte do Parlamento Europeu, considerando que “é aí que devem centrar-se as preocupações do governo a partir de agora relativamente aos fundos comunitários” (ver tabela).