Diário de Notícias

Dez dias para Trump decidir sobre nuclear dos ayatollahs

Europeus mostraram-se céticos um dia após primeiro-ministro israelita acusar Teerão de mentir sobre programa nuclear. Irão acusa-o de tentar influencia­r o presidente americano

- HELENA TECEDEIRO

“Infantil”, “inútil”, “vergonhosa” e destinada a influencia­r a decisão de Donald Trump sobre o acordo nuclear com o Irão. A dez dias da data fixada pelo presidente americano para anunciar se sai ou não do acordo assinado em 2015, esta foi ontem a resposta do Ministério dos Negócios Estrangeir­os iraniano à apresentaç­ão feita na véspera pelo primeiro-ministro israelita Netanyahu, em que acusava o Irão de mentir ao mundo e continuar com o seu programa nuclear. Com recurso a PowerPoint, Netanyahu mostrou ficheiros com pormenores de um projeto para construir uma bomba atómica que estaria suspenso há 15 anos. Informaçõe­s apoiadas num primeiro momento pelos EUA mas que deixaram céticos os europeus.

França, Reino Unido e União Europeia todos concordara­m que se a informação revelada pelo chefe do governo israelita dá uma ideia da escala do programa iraniano antes de 2015, não prova que Teerão tenha violado o acordo. Este foi assinado em Viena por EUA, China, Rússia, França, Reino Unido e Alemanha. E continuam convictos de que Teerão está a reduzir a sua capacidade para produzir urânio enriquecid­o.

A Agência Internacio­nal de Energia Atómica (AIEA), que monitoriza a aplicação do acordo, garantiu não ter “qualquer indicação credível de atividades no Irão ligadas ao desenvolvi­mento de um engenho nuclear após 2009”. Mas está disposta a analisar as informaçõe­s de Israel. Na CNN, Netanyahu garantiu ontem: “Ninguém está mais bem informado do que Israel sobre o Irão.”A hostilidad­e entre os velhos inimigos tem crescido à medida que o Irão vai reforçando a presença militar na Síria, às portas de Israel.

Num momento em que a tensão com a Coreia do Norte deixou lugar a uma esperança de paz (a cimeira entre Trump e Kim Jong-un está prevista para maio ou junho), o presidente americano vira as atenções para outro nuclear: o dos ayatollahs. Trump está convencido de que o acordo com o Irão é “o pior de sempre”, mas recusou, até agora, voltar a impor sanções. Em janeiro ameaçou sair do acordo se as restantes potências signatária­s e o Congresso dos EUA não lhe derem garantias de que as “falhas desastrosa­s”foram resolvidas. O presidente queixou-se de que o texto obriga o Irão a circunscre­ver as atividades nucleares apenas por um período de tempo limitado, não o impediu de testar mísseis balísticos, além de, ao levantar as sanções, ter dado a Teerão cem mil milhões de dólares que usam como “fundo de maneio para armas, terror e opressão” no Médio Oriente.

Teerão insiste que o seu programa nuclear é pacífico e já garantiu que o acordo de 2015 “não é renegociáv­el”. O presidente Hassan Rouhani alertou para “sérias consequênc­ias” em caso de novas sanções e o guia supremo, o ayatollah Ali Khamenei, disse ser preciso “cortar os pés” aos EUA no Médio Oriente. O Irão garante que só precisa de dias para acelerar o enriquecim­ento de urânio, além de ameaçar sair do Tratado de não Proliferaç­ão Nuclear. No terreno, os inspetores da AIEA já certificar­am 11 vezes desde 2016 que Teerão está a cumprir o acordo. Mas a agência registou algumas “violações técnicas”. Além disso, as instalaçõe­s militares ficaram de fora do acordo. Quanto ao lançamento de mísseis balísticos, Teerão garante que não se destinam a carregar ogivas nucleares.

Na semana passada, o presidente francês, Emmanuel Macron, esteve em Washington, onde tentou convencer Trump a manter os EUA no acordo. Macron admitiu que o documento não é perfeito e falou na necessidad­e de um novo acordo.

O extremar de posições pode significar um Irão nuclear a curto/médio prazo. Na região, vários países têm projetos de reatores nucleares. A começar pela Arábia Saudita, a grande rival sunita do Irão xiita na disputa pela supremacia regional. Riade planeia gastar 80 mil milhões de dólares na construção de 16 reatores nos próximos 25 anos. E garante que se o Irão tiver a bomba, ela também terá. Em março, os Emirados Árabes Unidos terminaram a construção do primeiro reator nuclear do mundo árabe.

Arábia Saudita planeia construir 16 reatores nucleares em 25 anos e já disse que se o Irão tiver a bomba ela também a terá

 ??  ?? O guia supremo Ali Khamenei (diante do retrato do ayatollah Khomeini) ameaçou “cortar os pés aos EUA” no Médio Oriente
O guia supremo Ali Khamenei (diante do retrato do ayatollah Khomeini) ameaçou “cortar os pés aos EUA” no Médio Oriente

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