Diário de Notícias

GREVE NÚMERO DE JOVENS MÉDICOS SINDICALIZ­ADOS DISPARA EM DOIS ANOS

Aumento de novos associados de sindicatos médicos acompanhou o da contestaçã­o desde 2016. O primeiro dia de greve encerrou blocos operatório­s e cancelou consultas

- PEDRO VILELA MARQUES

O número de jovens médicos a aderir aos sindicatos disparou nos últimos anos. Dados adiantados ao DN pelas estruturas que convocaram a greve de três dias que arrancou ontem mostram que o número de novos associados acompanhou o aumento da contestaçã­o desde 2016. Em alguns casos, como na região centro, mais de 90% das novas adesões foram de internos ou recém-especialis­tas, que no ano passado se viram envolvidos num polémico atraso para lançamento de vagas para o SNS e que protestam contra a falta de condições de trabalho.

Mais de uma centena de médicos manifestar­am-se ontem em frente ao Ministério da Saúde, em Lisboa, no primeiro dia de uma greve que encerrou blocos operatório­s e obrigou a cancelar centenas de cirurgias e consultas dos principais hospitais do país (ver textos ao lado). Perante o impacto do protesto, o DN foi avaliar o peso dos principais sindicatos que o promoveram, que, no seu conjunto, agregam 17 mil dos cerca de 50 mil médicos do país – 30 mil dos quais a trabalhar no setor público. E percebeu que só no último ano ganharam perto de mil associados, distribuíd­os de forma equilibrad­a entre o Sindicato Independen­te dos Médicos (SIM) e as três estruturas que compõem a Federação Nacional dos Médicos (Fnam).

Só o SIM, que totaliza seis mil sócios, conquistou 490 em 2017, um terço dos quais internos. “Tudo fruto da forma como encaramos o setor, com base na negociação e acordos”, justifica o seu secretário-geral, Jorge Roque da Cunha , que não deixa de lançar uma farpa ao ministro: “Só não conseguimo­s assinar acordos com o governo.”

Do lado da Fnam, o sindicato mais representa­tivo, o do Sul, tem cerca de sete mil associados e nos últimos anos assistiu à chegada de muitos médicos mais jovens, preocupado­s com os problemas no local de trabalho, conta Guida Ponte, dirigente do SMZS. “O grande problema é a nível dos serviços de urgências, devido ao isolamento, por estarem a trabalhar sozinhos, sem supervisão de médicos mais velhos, o que tem que ver com o abandono de especialis­tas do Serviço Nacional de Saúde.”

Razões secundadas por Rosa Ribeiro, do Sindicato dos Médicos do Norte, que tem dois mil sócios ativos e ganhou 150 no ano passado. “No balanço que fizemos no final do ano passado percebemos que tivemos mais novos associados e em especial de gente mais nova, motivados pela precarieda­de e necessidad­e de ajuda. Percebem que as carreiras não funcionam, que investiram na formação e agora não têm vaga na profissão, não têm trabalho e são ultrapassa­dos por profission­ais de empresas de trabalho temporário, e os que já são médicos, que estão no ano comum, correm o risco de não ter vaga para aceder a uma especialid­ade.” Também na zona centro o sindicato teve qualquer coisa como 150 novos sócios desde 2016 – 31 já neste ano –, a esmagadora maioria (90%) médicos que acabaram a especialid­ade, no máximo, há três anos, indica ao DN o seu presidente, Noel Carrilho.

Recorde-se que, além de criticarem a falta de acompanham­ento dos internos, os sindicatos contestam o atraso na abertura de concursos para os recém-especialis­tas. Os jovens médicos que terminaram a especialid­ade em abril do ano passado só tiveram vagas atribuídas neste ano e ainda não foram anunciados lugares para os que a terminaram no mês passado.

“Berto ciao”: críticas ao ministro O primeiro dia de greve dos médicos atingiu 90% dos blocos cirúrgicos de todo o país, enquanto nas consultas externas a adesão foi de 75%. Números que, para o secretário-geral do Sindicato Independen­te dos Médicos, demonstram “o grande descontent­amento que existe entre os médicos”. Jorge Roque da Cunha acusa o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, de mentir, ao “comparar médicos recém-licenciado­s com especialis­tas e dizer que há mais médicos”. Críticas apoiadas pelo presidente da Federação Nacional dos Médicos, ao sublinhar que o Serviço Nacional de Saúde tem “cada vez menos médicos e cada vez mais idosos”, acusando o ministro da Saúde de fazer “uma gestão desastrosa dos recursos humanos”.

À tarde, já em frente à sede do ministério, João Proença justificou a manifestaç­ão que ali juntou cerca de cem médicos com o descontent­amento dos profission­ais pela “destruição por dentro dos cuidados de saúde”. Declaraçõe­s ao som ambiente de “Berto ciao, Berto ciao, Berto ciao, ciao, ciao” – versão de Bella Ciao, a agora muito mediatizad­a canção que se tornou símbolo da resistênci­a italiana contra Mussolini na Segunda Guerra Mundial –, slogan apoiado pelo presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, Rui Nogueira, que considerou que está na altura de substituir um “esgotado” Adalberto Campos Fernandes e de encontrar um novo ministro que defenda o SNS.

Os sindicatos querem uma revisão das carreiras, a diminuição do horário de trabalho em urgência e das listas de utentes dos médicos de família até 1500 utentes.

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