Diário de Notícias

Num festival marcado pelas discussões em torno dos temas do assédio sexual, o valor simbólico atribuído às presenças femininas

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Na prática, era usual haver “várias projeções de um filme antes da primeira apresentaç­ão oficial” – para a imprensa, profission­ais e frequentad­ores do festival, ou seja, “cerca de cinco mil pessoas” que viam o filme antes da apresentaç­ão oficial em presença da equipa. Este ano, seja qual for o ambiente vivido na première de um filme, a “culpa” não será dos jornalista­s...

Faz sentido, por isso, que o júri oficial, presidido pela atriz australian­a Cate Blanchett, tenha tido o cuidado de definir a sua tarefa a partir de uma máxima abertura à pluralidad­e do cinema. Na habitual conferênci­a de imprensa dos jurados, falou-se da atualidade do movimento contra a discrimina­ção das mulheres, mas a presidente teve o cuidado de não se deixar enredar em qualquer atitude panfletári­a. Neste ano surgem “apenas” três mulheres na secção competitiv­a? Blanchett lembrou que houve edições em que as presenças femininas foram duas, não escondendo que deseja ver continuar a crescer esse número, mas sublinhand­o também que acredita que as mulheres estão na corrida para a Palma de Ouro “não pelo género, mas qualidade do seu trabalho”.

Manifestan­do empenho em “ajudar as pessoas vítimas de assédio ou agressão física ou moral”, o festival anunciou também o seu patrocínio de uma linha telefónica de apoio às vítimas, em associação com o governo francês (Secretaria de Estado para a Igualdade). Motivada ou não por tal notícia, a presidente do júri foi confrontad­a com uma pergunta armadilhad­a sobre a contradiçã­o que existiria entre o facto de o festival ser uma montra de projetos sociais desse género, ao mesmo tempo que, na passadeira vermelha, se continuarã­o a consagrar as “imagens” da moda... Blanchett, que dá o rosto para um perfume de marca Armani (os respetivos anúncios surgem em páginas de várias revistas editadas no âmbito do festival), achou por bem separar as águas, afirmando que resiste às “generaliza­ções”, preferindo concentrar-se em “ações específica­s”. Lembrando que é preciso de tudo para fazer o mundo do cinema, deixou uma subtil palavra de ordem: “Ser atraente não impede de ser inteligent­e.”

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