Nick Willing e os últimos quadros da mãe: “A Paula Rego agora é uma criança”
A nova exposição é um percurso desde a primeira influência sobre a pintora a um dos mais recentes quadros. Com inéditos
JOÃO CÉU E SILVA Até 30 de setembro não faltam quadros e esboços inéditos de Paula Rego na sua Casa das Histórias, em Cascais. Proibida pelo médico de viajar para inaugurar a nova exposição, Contos Tradicionais e Contos de Fadas, foi o filho e profundo conhecedor da obra da mãe que protagonizou a visita guiada na véspera da abertura hoje ao público de uma vasta exposição.
Nick Willing ziguezagueou por várias salas e reviveu para o DN alguns momentos da sua infância. Tudo começa após rever o livro com que a exposição se inicia e o devora com o olhar de memória: “São ilustrações de Gustave Doré para o Inferno de Dante. Este livro era do pai da minha mãe, que lhe lia em pequena. Metiam-lhe tanto medo!” Explica, mostrando uma das ilustrações, é este o livro “que está na origem do interesse da mãe pelos contos infantis e de fadas e do medo que eles metem”.
Enquanto recorda o significado do livro ilustrado por Doré para a obra futura de Paula Rego, um dos funcionários que ultimam os pormenores da exposição passa para a parede branca as letras pretas que justificam a presença de o Inferno ali à espera dos visitantes. Willing acrescenta que nunca mais vira o livro: “Não o via desde os anos 1970.” As memórias continuam: “Naquela época, a mãe trabalhava muito e teve vários problemas psicológicos e de dinheiro.” Vai mais fundo nas recordações: “Não tínhamos dinheiro nenhum!”
Essa situação da família não sur- ge por acaso na conversa, é que quase toda a exposição remonta a esses tempos de dificuldades e das grandes influências que irão definir a carreira da artista. Por um lado, Paula Rego obtém uma bolsa da Fundação Gulbenkian e pode trabalhar desafogadamente.Vai para Londres e nos relatórios que faz a justificar as prestações da bolsa envia páginas que são elas próprias obras de arte – que estão numa vitrina e a passar num ecrã –, em que descreve o que descobre na cidade. Documentos que ilustra com fotocópias e esboços, provando as grandes influências que Doré lhe instalara, bem como todos os contos que ouvira em pequena do pai e das criadas.
Nick Willing ziguezagueia mais um pouco e para em frente ao quadro pintado em 1970, A Madrasta. Tem um estilo pouco habitual para Paula Rego, com cores pop da época. “Espampanante”, afirma o filho da pintora, que continua a recordar: “Era uma altura muito difícil e quase nunca me deixava entrar no estúdio enquanto estava a pintar esta obra. Ela está sempre a dizer que é uma época de que não gosta. Envergonha-a quando pensa que fez alguns quadros [como este e os A nova exposição explica a influência dos contos infantis na obra da pintora, que considera que as histórias portuguesas são mais cruéis