Famílias de acolhimento com deduções fiscais e faltas para assistência à família
PS entregou projeto de lei que visa dar novos benefícios às famílias de acolhimento que recebem crianças e jovens em risco de forma gratuita. Socialistas dizem que é um “ato de justiça” que só peca por tardio
“É um ato de justiça que só peca por tardio.” As palavras são de Filipe Neto Brandão, vice-presidente da bancada parlamentar socialista e um dos subscritores do projeto de lei que o PS entregou ontem no Parlamento que visa dar mais direitos às famílias de acolhimento, que recebem crianças ou jovens em risco de forma gratuita.
Com o atual quadro legal o que acontece “na prática é que a família que tem esse gesto altruísta de receber uma criança ou jovem em risco acaba por custeá-lo”. O PS quer, por isso, que durante o período de acolhimento a criança seja considerada membro do agregado familiar para efeitos fiscais, permitindo assim a dedução fiscal das despesas realizadas. Por outro lado, a proposta ontem entregue pelos socialistas na Assembleia da República abre também caminho a que a pessoa singular – ou um dos elementos da família de acolhimento – tenham direito a faltas justificadas ao trabalho para assistência à criança ou ao jovem, o que atualmente não acontece. “Dificilmente se compreenderá que aquele que tenha temporariamente a seu cargo uma criança ou jovem em perigo não possa, nomeadamente em caso de assistência hospitalar ou outra ao menor, ver reconhecida uma justificação de falta”, argumenta o texto socialista. Para o PS trata-se de “iniquidades” que “podem e devem ser resolvidas”. Dois regimes paralelos O atual enquadramento legal, traduzido no Regime de Execução do Acolhimento Familiar, permite o acolhimento de crianças e jovens de forma remunerada e gratuita. No primeiro caso, os interessados têm de exercer o acolhimento familiar “a título de atividade profissional principal ou secundária”, sendo exigida a “inscrição do responsável pelo acolhimento familiar na respetiva repartição de Finanças como trabalhador independente”. Neste caso, as famílias de acolhimento têm direito a uma “retribuição mensal pelos serviços prestados”, que atualmente é de 176,89 euros (353 se a criança ou jovem for portador de deficiência). A este soma-se um “subsídio para a manutenção, por cada criança ou jovem”, de 153, 40 euros mensais. Já no caso do acolhimento considerado gratuito, as famílias recebem, como apoio financeiro da Segurança Social, este segundo subsídio de manutenção.
Menos de 190 famílias
De acordo com o texto do PS “existirão hoje, em todo o país, menos de 190 famílias a assegurar esta resposta social, tendo-se assistido, inclusive, nos últimos anos, a uma redução progressiva deste número”. Para os socialistas, a “completa ausência de previsão legal que atente à situação de todos aqueles que estariam predispostos a acolher temporariamente crianças ou jovens em perigo, de modo gratuito”, será “uma das razões para o reduzido número de famílias” aderentes.
Filipe Neto Brandão defende que o atual quadro legal, que remonta a 2008, “foi concebido como um regime de prestação de serviços”, uma situação que deve ser alterada: “Este sistema não é amigável para quem está disposto a prestar essa função relevantíssima.” O parlamentar socialista sublinha, aliás, a intenção já manifestada pelo governo nesse sentido, que diz não contender com a iniciativa socialista ontem entregue, que será “facilmente acomodável “numa futura revisão da lei. A medida, a ser aprovada no Parlamento, entrará em vigor a 1 de janeiro de 2019, com o Orçamento do Estado.
De acordo com a lei, o acolhimento familiar “consiste na atribuição da criança ou jovem a uma pessoa singular ou a uma família, habilitadas para o efeito, e visa a integração da criança ou do jovem em meio familiar e a prestação de cuidados adequados às suas necessidades e bem-estar”, bem como a educação necessária ao seu desenvolvimento integral”. A pessoa ou família de acolhimento não pode ter qualquer relação de parentesco com a criança, tendo de preencher várias condições, entre elas não ser candidato à adoção. Os candidatos têm de ter entre 25 e 65 anos, a escolaridade mínima obrigatória e uma habitação adequada e com condições de higiene.
“Na prática, a família que tem esse gesto altruísta de receber uma criança ou um jovem acaba por custeá-lo”, diz Filipe Neto Brandão