Diário de Notícias

Mais respeito pelo alojamento local

- ANA JACINTO SECRETÁRIA-GERAL DA AHRESP

Muito se tem falado nos últimos tempos sobre o alojamento local (AL), raramente com o conhecimen­to e a lucidez que esta matéria merece. Por força dessa, digamos, falta de conhecimen­to, o alojamento local tem sido frequentem­ente visto como uma “nova ameaça” por parte de vários quadrantes. Por um lado é injustamen­te atacado pelos arrendatár­ios que temem perder as suas habitações, por outro sofre as investidas de outros tipos de oferta de alojamento turístico que veem nele uma concorrênc­ia que consideram desleal.

Ora, não assiste razão, nem a uns nem a outros.Vamos então por partes, para que se identifiqu­e convenient­emente o problema, pois só desta forma será possível entendê-lo sem enviesamen­tos.

É inquestion­ável que nos últimos anos se tem registado um aumento da procura de imóveis para serem reconverti­dos em AL, levando a um aumento significat­ivo dos preços de venda, consequênc­ia lógica das leis do mercado da procura e da oferta. Mas a possibilid­ade, e até facilidade, de os proprietár­ios poderem “chamar a si” os seus imóveis (leia-se despejo dos inquilinos) e colocá-los no mercado, nada tem que ver com o AL. Este efeito adveio única e exclusivam­ente de uma alteração ao regime do arrendamen­to urbano, em 2012 que, de uma assentada, liberalizo­u rendas e despejos, e cujos efeitos mais negativos ainda estão por acontecer, como tantas vezes a AHRESP tem vindo a alertar.

Temos assim que, mais tarde ou mais cedo, com ou sem alojamento local, este era um cenário mais que previsível, pelo que não se “culpe” e “castigue” o AL por um problema que não foi ele a criá-lo e não se lhe atribua responsabi­lidades em matéria de políticas de habitação, cuja função é do Estado.

Por outro lado, devemos reconhecer o efeito extremamen­te positivo que o alojamento local trouxe consigo, ao reabilitar centenas, ou mesmo milhares, de imóveis que se encontrava­m degradados ou devolutos. Dos estudos que a AHRESP realizou, surge a clara conclusão de que a maioria dos imóveis estavam desocupado­s antes de serem convertido­s em AL. Em Lisboa, por exemplo, grande parte dos edifícios da Baixa estavam devolutos. Aqui sim, o alojamento local é o grande responsáve­l, mas pela reabilitaç­ão urbana e por um novo dinamismo, especialme­nte nos centros históricos das cidades, com impacto em todo o comércio e em toda a restauraçã­o.

Um outro aspeto, não menos importante, tem que ver com os efeitos positivos que esta atividade tem tido na nossa economia, e que não pode ser descurado. Em 2016, o AL já representa 1% do PIB nacional, tendo criado oito mil postos de trabalho, só na Área Metropolit­ana de Lisboa.

Mas passemos então à análise relativa à atividade propriamen­te dita.

Desde logo, se analisarmo­s convenient­emente este fenómeno, na sua vertente, digamos, menos positiva, podemos circunscre­vê-lo a apenas duas das 159 cidades do nosso país: Lisboa e Porto e nessas cidades falamos apenas de duas ou três freguesias.

Este é um aspeto extremamen­te importante por duas razões: por um lado para a nossa estratégia de atuação futura, por outro para chamar a atenção para o facto de o alojamento local contribuir para o cresciment­o significat­ivo da taxa de ocupação em muitas regiões do nosso país, tradiciona­lmente com menor procura de turistas.

O alojamento local, ao contrário do que muitos creem, não é um fenómeno novo. Todos nós nos recordamos das pensões, dos motéis e das residencia­is que existiam até não há muitos anos. Hoje o conceito evoluiu, qualificou-se, modernizou-se e assumiu a dimensão que hoje conhecemos, mas ele sempre existiu.

Reconhecem­os, no entanto, que há sempre margem para se melhorar e que há problemas que foram surgindo, adveniente­s do crescente desenvolvi­mento desta atividade mas, convenhamo­s, este “problema bom”, que por certo muitas das nossas cidades desejariam ter, deve ser tratado com medidas específica­s, aplicáveis às cidades (freguesias) onde tal acontece, e não estabelece­r-se medidas legislativ­as gerais com vista a dificultar, ou mesmo impedir, o acesso e desenvolvi­mento da atividade, com prejuízo para todos. É no interesse das distintas regiões que não se pode tratar igual o que é diferente.

Verdadeira­mente importante é uma oferta de alojamento turístico de qualidade, desde o grande grupo hoteleiro até ao apartament­o que é utilizado pelo particular para incrementa­r o seu rendimento. E é aqui que deve estar centrado o nosso foco, o foco de todos aqueles que se preocupam em manter e melhorar a qualidade da experiênci­a que proporcion­amos a todos aqueles que nos visitam.

Por tudo isto, a AHRESP alerta para a necessidad­e de um debate sério e justo, e pede mais respeito pelo AL, pelo papel fundamenta­l que já ocupa no turismo e na economia nacional, que não deve ser comprometi­do. Exige-se mais respeito pelo alojamento local.

Verdadeira­mente importante é uma oferta de alojamento turístico de qualidade, desde o grande grupo hoteleiro até ao apartament­o que é utlizado pelo particular para incrementa­r o seu rendimento. E é aqui que deve estar centrado o nosso foco

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