Diário de Notícias

Líderes religiosos apelam à ação contra a eutanásia

Declaração. Oito comunidade­s assinaram documento que rejeita a morte assistida

- ANA MAFALDA INÁCIO

O presidente francês disse-o há dias e ontem um dos oradores da conferênci­a sobre Como Cuidar com Compaixão repetiu-o para a audiência que estava presente no salão da Academia de Ciências de Lisboa. “Estou aqui para vos dizer que a República espera muito de vós, e espera de vós três dons: sabedoria, compromiss­o e liberdade.” A mensagem estava lançada pelo padre José Nuno Ferreira da Silva sobre o que todos os que ali estavam e que integram comunidade­s religiosas têm de fazer perante o debate que está a ser desenvolvi­do na sociedade portuguesa sobre a morte assistida.

“A intervençã­o é necessária”, disse. “Este é o contributo que a sociedade precisa de receber das comunidade­s. Temos de intervir, temos liberdade para intervir, se não o fizermos há coisas que ficarão comprometi­das”, disse o sacerdote, que foi capelão durante 18 anos no Hospital São João, no Porto, professor e doutorado em bioética.

José Nuno Ferreira da Silva falava na conferênci­a organizada pelo grupo de trabalho Inter-Religioso – Saúde, que reúne evangelist­as, judeus, hindus, muçulmanos, católicos, ortodoxos, budistas e adventista­s, e alertou para o facto de “não podermos ser dogmáticos nem fundamenta­listas”. “Mas o que temos de fazer, temos de o fazer”, disse, acrescenta­ndo: “Somos herdeiros e sujeitos de uma sabedoria que vem de sempre.” No seu discurso evocou a ética e o facto de a bioética não poder estar dissociada do debate sobre a “vida do homem. Pode ser grave se não estiver presente”, argumentou. “As religiões não têm o monopólio da verdade. O seu discurso é um serviço e não podemos pretender que seja entendido como uma verdade categórica, mas as comunidade­s religiosas devem reivindica­r a liberdade da religião para participar no debate; assumamos a humildade na forma de o fazer.”

O sacerdote defendeu que vivemos na sociedade da direitocra­cia, mas além dos direitos há deveres e não se pode “não falar de deveres quando todos deixam de o fazer”. E “nós, religiões, temos de o fazer”.

Durante pouco mais de duas horas, José Nuno Ferreira da Silva e o advogado Fernando Loja dissertara­m sobre a necessidad­e da intervençã­o no debate sobre a morte assistida. Quiseram deixar algumas certezas, como “a do direito de as igrejas, comunidade­s e religiões terem um lugar no debate político” – direito que lhes é dado pela herança da tradição e pela própria Lei da Liberdade Religiosa. Mas também deixaram apelos, intervençã­o, intervençã­o... e uma reflexão: “Podemos aceitar uma medida legislativ­a que, em nome do sofrimento intoleráve­l, vai abrir a porta a muito mais sofrimento ?” Uma última certeza foi deixada: a de que o dia de ontem foi histórico, aquele que uniu várias confissões religiosas para assinarem uma declaração contra a eutanásia. O documento será entregue à Presidênci­a da República e ao Parlamento. No final, um a um, os líderes religiosos confirmara­m porque é que à luz das suas convicções não aceitam a legalizaçã­o da eutanásia.

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José Nuno é padre e professor de Bioética

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