É preciso pôr a ANA na ordem
Afirmou o primeiro-ministro, António Costa – na entrevista que o DN publicou neste domingo – que “a ANA agora tem de responder depressa e bem” ao compromisso de construir um novo aeroporto na área metropolitana de Lisboa, uma vez que os níveis de procura contratados para tal “já estão claramente esgotados”.
Tem razão o primeiro-ministro quanto ao futuro. Mas faltou a António Costa uma palavra sobre o presente: hoje, na generalidade dos aeroportos portugueses – e muito em particular no aeroporto de Lisboa – há atrasos enormes no controlo de passageiros que são causados por a ANA não ter feito os investimentos a que está obrigada pelo contrato de concessão de 50 anos que assinou com o governo de Pedro Passos Coelho.
Um exemplo: no dia 6 de maio chegaram ao Aeroporto Humberto Delgado, entre as 08.00 e as 13.00, 5942 passageiros. Como o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) teve sempre a funcionar as 16 boxes de controlo disponíveis (mais o RAPID), entre as 08.00 e as 10.00 foi possível controlar 1695 passageiros (provenientes de nove voos) sem acumular grandes filas. No entanto, como entre as 10.00 e as 13.00 chegaram 21 voos transportando 4247 passageiros, foi impossível fazer os controlos sem acumular longos tempos de espera.
Ou seja, agora que o SEF está a conseguir resolver a falta de inspetores, é a ausência de investimento da ANA no aeroporto que está a provocar os enormes tempos de espera que muitos estrangeiros têm de suportar para entrar em Portugal. Isto apesar de a ANA, desde 2012, ter triplicado o seu cash flow operacional, o qual se situou em 500 milhões de euros em 2017 (dados revelados pelo Expresso no último sábado). A verdade é que, apesar dos lucros fabulosos, apesar de ter cada vez mais passageiros e de cobrar taxas mais altas às companhias aéreas, a ANA não investiu um único cêntimo em novas zonas de controlo de passageiros ou em novas boxes para os inspetores do SEF poderem fazer o seu trabalho.
Foi por isso que, depois de o DN noticiar, no dia 26 de abril, que uma vez mais as filas no aeroporto de Lisboa voltavam a ultrapassar as duas horas, a ANA dirigiu ao SEF, ao Ministério da Administração Interna e ao Ministério do Planeamento e Infraestruturas a seguinte mensagem por e-mail: “Tendo surgido notícias na comunicação social sobre tempos de processamento no controlo de fronteiras, as quais apresentam dados sensíveis claramente extraídos da informação operacional que vem sendo disponibilizada pela ANA, vamos interromper o seu envio.”
O Grupo Vinci, em vez de fazer um mea culpa e anunciar investimentos imprescindíveis para resolver a situação, informou o governo de Portugal de que ia deixar de enviar informação, como se estivesse a falar para funcionários de uma colónia. Quem julga a ANA que é?
Há limites para a forma como uma empresa estrangeira se comporta num Estado soberano. A informação sobre os tempos de espera não é um favor que o grupo Vinci faz ao governo e ao SEF. É uma obrigação que o Grupo Vinci tem para com o Estado português, no âmbito da sua concessão.
Portugal não é uma República das Bananas onde uma empresa pode suspender o envio de informação a que estava obrigada apenas para esconder a sua responsabilidade em atrasos que prejudicam o país, devido à falta de investimento que era sua obrigação ter feito nos aeroportos.
Com toda a rentabilidade que há nos aeroportos portugueses, a ANA tem a obrigação de promover obras que permitam segmentar os passageiros por origem e controlar com mais rapidez – embora com toda a exigência e rigor, porque os riscos são muitos – a entrada de pessoas no território nacional.
Dirijo, por isso, um apelo ao primeiro-ministro: Dr. António Costa, é preciso pôr a ANA na ordem. As obrigações do Grupo Vinci não se limitam ao futuro aeroporto; têm que ver com investimento no atual aeroporto de Lisboa e também com a sua obrigação de respeitar o Estado português e todos os deveres que tem para com ele.
Agora que o SEF está a conseguir resolver a falta de inspetores, é a ausência de investimento da ANA no aeroporto que está a provocar os enormes tempos de espera