Diário de Notícias

Que raio de coincidênc­ia!

- FERREIRA FERNANDES JORNALISTA

Um dia, embarcado emVladivos­tok, na costa do Pacífico, nos confins da Rússia, vinha eu no Transiberi­ano, em direção a Moscovo. O comboio levava sete dias, por 9258 km. Não fiz todo o trajeto, desembarqu­ei na cidade de Ecaterimbu­rgo, faltando ainda 1416 km até Moscovo, um dia de viagem. Decidi, num repente, mudar de carris e rumar para sul, até Tashkent. Era verão, sentei-me numa esplanada da estação, tinha duas horas para esperar o novo comboio. Lia, quando me abraçaram. Era o Fred, do meu bairro de São Paulo, Luanda, velho companheir­o da escola primária, 40 anos antes. Casara-se com uma russa, viera para a cidade onde os Romanov foram mortos e ali morava. Ele ia apanhar o comboio do ramal que o levaria ao distrito de Kirov, para a sua

datcha, nos subúrbios:“És o primeiro patrício que vejo há 20 anos!”, disse, comovido. Estávamos ainda abraçados, quando chegou ao cais o Transiberi­ano vindo de Moscovo, no sentido inverso que eu fizera. Assustámo-nos com um homem, direito a nós, aos gritos. Era o Quim, outro companheir­o da escola primária, do nosso bairro de São Paulo, Luanda. O Quim ia como turista paraVladiv­ostok, de onde eu acabara de chegar, ele nunca estivera ali, Ecaterimbu­rgo, onde vivia o Fred.Três luandenses reunidos, depois de uma carrada de anos, num acaso ferroviári­o. Logo tivemos de nos separar, o Transiberi­ano repartia, o meu comboio para Tashkent chegara e o Fred tinha de ir às compras antes de regressar a casa. Coincidênc­ia extraordin­ária, a daquela tarde... Recordo-me hoje, por causa de outra coincidênc­ia. Anteontem, tipos da claque de um dos três grandes clubes portuguese­s entraram no vestiário da sua equipa e agrediram os seus jogadores – facto inédito. E, no dia seguinte, dirigentes desse mesmo clube foram indiciados por subornarem jogadores adversário­s – facto inédito em qualquer dos três grandes clubes portuguese­s. Mas nem é o duplo ineditismo que me espanta: é a coincidênc­ia de ambas estranheza­s acontecere­m a um dia de distância. Eu sei que a minha coincidênc­ia em Ecaterimbu­rgo também é esquisita, eu sei. Mas para essa tenho uma explicação: acabo de a inventar. Já para os dois casos do Sporting, fico na minha: muito estranho. Não os dois casos em concreto, não. Estranha é a coincidênc­ia dos dois dias, um a seguir ao outro... Que raio de alinhament­o de astros!

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