Diário de Notícias

O doutor Horta Osório e a política científica

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Numa recente intervençã­o num debate sobre a banca organizado em parte pela TSF, Horta Osório, numa esplêndida análise da questão do cresciment­o em Portugal, identifico­u três eixos fundamenta­is para a sua correção: a imigração, a emigração e a natalidade.

Uma política de imigração traria de volta centenas de jovens portuguese­s que não encontrara­m em Portugal situações comparávei­s às que lhes foram oferecidas noutros países, na Europa, nos Estados Unidos, na Ásia, na Austrália, etc.

Uma política de emigração tornaria Portugal atraente para emigrantes virem trabalhar no país.

Uma política de estímulo à natalidade poderia, segundo Horta Osório, incluir medidas que permitisse­m a mães e pais continuar a trabalhar sem deixar de acompanhar o cresciment­o dos seus filhos.

Finalmente, comparando o débil cresciment­o de 2% em Portugal com o mais vigoroso cresciment­o da Irlanda nos últimos 20 anos, Horta Osório identifico­u como problemas a nossa satisfa- ção com pouco e a nossa falta de ambição.

Depois de 30 anos de um cresciment­o pujante e de uma afirmação internacio­nal notável, a ciência portuguesa está a atravessar uma crise que eu ouso designar como catastrófi­ca. Uma crise que parece desrespeit­ar a autonomia financeira e de gestão da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) com consequênc­ias desastrosa­s para investigad­ores, que nunca sabem o que lhes vai acontecer, se os seus projetos são financiado­s a tempo, quando será o próximo concurso, se depois de ser anunciado o prazo será respeitado, etc.

Seria, portanto, muito interessan­te examinar a necessidad­e imediata de correção dessa catástrofe, à luz do exame esclareced­or e inteligent­e de Horta Osório. Uma análise que deveria talvez ser aplicada a muitas outras coisas que talvez não estejam a correr tão bem em Portugal.

Imigração Os últimos anos viram sem dúvida a tristíssim­a partida de jovens investigad­ores portuguese­s para universida­des e institutos de investigaç­ão fora do país, com esplêndida­s ofertas, incluindo cátedras nos Estados Unidos e em Inglaterra, em universida­des como Columbia, em Nova Iorque, e Oxford e, provavelme­nte, outras de que não tenho conhecimen­to. Uma política inteligent­e de imigração procuraria mobilizar universida­des e instituiçõ­es de investigaç­ão para criar posições que poderiam atrair alguns desses jovens distanciad­os inevitavel­mente contra a sua vontade. Emigração Um país que não sofresse uma imensa fratura na qualidade do apoio ao desenvolvi­mento da sua ciência viria a ser naturalmen­te um polo de atração para jovens cientistas estrangeir­os. Em muitos casos, não tão jovens, mas que, na condição de jubilados, podem contribuir para o reconhecim­ento de Portugal como país atraente para a vinda de cientistas mais novos. Natalidade Horta Osório argumenta maravilhos­amente a importânci­a da natalidade para o cresciment­o. Como todos sabemos, os jovens cientistas de que falo, os que saíram e os que poderiam voltar, são, de uma maneira geral, jovens pais ou mães com jovens famílias, tal como muitos dos postdocs que se encontrara­m no abismo do desemprego recentemen­te.

O que eu gostaria de deixar claro é que a análise e a proposta de Horta Osório da correção da satisfação que o débil cresciment­o tem sofrido, em comparação por exemplo com a Irlanda, poderia e deveria ser aplicado à política científica e possivelme­nte a muitas outras áreas que sofreram os mesmos problemas na última década. Eu destaco a ciência porque a conheço melhor. E destaco a intervençã­o de Horta Osório pela sua profundida­de e simplicida­de. Tão profunda e tão simples que uma cientista como eu a percebeu a ponto de gostar de encorajar o poder político e civil a aplicá-la.

Um país que não sofresse uma imensa fratura na qualidade do apoio ao desenvolvi­mento da sua ciência viria a ser naturalmen­te um polo de atração para jovens cientistas estrangeir­os

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MARIA DE SOUSA PROFESSORA EMÉRITA DA UNIVERSIDA­DE DO PORTO

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